Capitulo 24

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— Como pôde ver, sou uma mulher vivida, passei por coisas bem complicadas na minha vida e quando vi, estava nas mãos deles. Não posso dizer mais que isso.
— Entendo, tem filhos?
— Apenas uma. Se aguentei tudo isso até agora é por ela. Se não eu já teria denunciado eles, mesmo que isso custasse a minha vida. Vivo pela minha filha.
— Eles? Eu sei que o Lúcifer é um tirano ditador, mas a Morgana é muito gente boa, não gosta dela?
Bety ficou com os olhos distantes enquanto levava sem perceber as mãos ao peito. Ela estava pensando algo importante, algo que ele parecia tentar evitar pensar.

— Não estou falando do Patrão e nem da senhora Morgana.
O que??? Se não era deles que ela estava falando  então era de quem?
— Está falando de quem? — perguntei enquanto abria uma gaveta qualquer, apenas para disfarçar a minha curiosidade.
— Kaila, vamos descer para o seu café da manhã, vou cuidar muito bem de você hoje já que seu treinamento começa amanhã — ela ignorou completamente a minha pergunta.
— Tudo bem, se não quer falar eu vou entender. A propósito, eu subi para o nível dois, agora posso destrancar uma das portas.
— Parabéns, em breve vai aprender tudo sobre essas coisas de alta classe social, vai poder ir a shoppings, cinemas e tudo mais.
— Só se você vier comigo.
Ela pareceu surpresa com aquilo.
— Eu?

— Sim, você. Já se esqueceu que é a minha guardiã aqui dentro? Onde eu for, você vai. E o diabo que se veja comigo caso ele não goste da ideia. Vamos gastar a grana dele comendo e comprando tudo que...
Parei de falar ao notar pelo espelho que Bety havia virado o rosto repentinamente, agora ela encarava a cama. Por alguns segundos podia jurar que seus olhos estavam lacrimejando.
Será que eu disse algo errado? Ou foi pelo fato de que eu havia feito perguntas demais sobre o seu passado?
— Obrigada.
— Não precisa chorar — andei até ela e a abracei por trás — não sei pelas coisas que você passou, mas pode ter certeza de que comigo aqui tudo vai ser diferente. Eu não te vejo como uma funcionária e sim como uma amiga, senti que você era boa deste o momento em que te vi.

— Nem sei se sou uma boa funcionaria, deixei sua calcinha sumir, lembra?
— Ela não sumiu, o tirano pegou ela. Aposto que ele usou — acabamos caindo na risada e minutos depois estávamos indo rumo a sala de estar principal. Horrania já estava ali e com ela Lúcifer, ambos apalpavam a barriga peluda de um cachorro marrom.
— Obrigada tio Lúcifer — ela estava agradecendo, então quer dizer que o diabo trouxe aquele cachorro para a menina. Quem diria.
— Não precisa agradecer — ele respondeu — mas se ele sujar, quebrar, morder ou latir, eu mesmo irei te transformar em ração para ele — ameaçando uma criança, bem típico de alguém como ele.
— Não vai nada, você não tem coragem de ferir nem uma mosca tio Lúcifer.

— Não me desafia não — ele mexeu nos cabelos da menina, bagunçando tudo mas parou rápido ao notar a minha presença — falando em animais, olha quem chegou — e lá vamos nós outra vez.
— Bom dia tia Kaila — Horrania me deu um de seus sorrisos infantis confortantes.
— Bom Dia Horrania. Qual o nome do seu cachorro? — decidi que iria ignorar o tinhoso.
— Eu ainda não escolhi, acabei de ganhar ele.
— É bem bonito.
— Vamos chama-lo de cão do inferno —  sugeriu o diabo como se esse fosse um ótimo nome para um cachorro de uma criança.
— Ah claro, vamos desenhar pentagramas no pelo dele também — o encarei debochadamente.

— Não vejo problema algum.
— Vou chamar ele de Pacto — disse Horrania atraindo nossa atenção.
— Eu adorei — o diabo comemorou.
— Tem certeza disso, Horrania? Sabe o que esse nome significa?
— Não, mas achei bonito — novamente repito, crianças são mesmo inocentes e muito influenciáveis.
Fui obrigada a tomar café no mesmo ambiente que aquele homem, sempre que estávamos juntos o lugar parecia ser pequeno demais. Eram farpas, brigas e frases irônicas a todo momento. Ele não perdia a chance de me alfinetar e como não sou flor que se cheira, eu respondia a altura. A única pessoa feliz naquele café da manhã era Horrania, que rolava no carpete junto ao cachorro que era quase do seu tamanho.

Quando tudo acabou, cada um seguiu para uma direção e agora era hora de explorar o novo local no mapa. Peguei o tablet e comecei a andar e andar. Sempre de olho em minha localização, indo de porta em porta ate que uma delas se abriu, então era ali. A empurrei, revelando uma pequena biblioteca cujo as estantes de livros iam até o teto. Mais a frente haviam duas grandes janelas fechadas, fui até elas e abri, trazendo toda a luz do dia para aquele lugar incrível. Sempre gostei de livros e aquilo iria servir como um ótimo passatempo.

Poltronas confortáveis estavam espalhadas pelo lugar, dando ao leitor um ótimo assento para leitura. Andei entre as torres de livros, deslizando os dedos e lendo os nomes até encontrar um que me chamou a atenção pelo nome. “A Garota Em Coma” Isso até parece uma referencia a mim, desde que me lembro estive vivendo em coma, dentro de pesadelo após pesadelo. Mas agora era hora de acordar para um novo mundo e isso me deixava ansiosa e com medo ao mesmo tempo. Me sentei em uma das poltronas, abri o livro e comecei a ler. Mas para o meu azar, minutos depois o diabo também entrou na biblioteca com aquele sorrisinho idiota dele.

— Eu não acredito — ele deslizou os dedos sobre a madeira de uma das estantes enquanto vinha em minha direção — Você sabe mesmo ler?
— Não posso ter nem um minuto de sossego? — continuei a ler, ignorando-o, ou pelo menos fingindo ignorar.
— Você quer sossego? — ele se posicionou atrás da minha poltrona e colocou suas mãos sobre os meus ombros. Tentei me levantar mas ele não deixou — Oras, já quer ir?
— Quero privacidade.
— Não parecia querer isso hoje cedo, quando estava bisbilhotando a conversa dos outros.
— Já disse que não estava bisbilhotando nada. Agora tire suas mãos cascudas dos meus ombros.
— Relaxe — ele sussurrou no meu ouvido esquerdo e acabei ficando arrepiada. Não por estar sentindo algo, não mesmo, mas por que foi sem prévio aviso.

— Diz logo o que você quer e pare de atrapalhar a minha leitura.
— Você sabe o que eu quero, Kaila — Pulei rápido da poltrona ao senti-lo mordendo a minha orelha.
— Que porra você está fazendo?
— O que eu estou fazendo? Me diga você — a voz dele está diferente, não está irônico, soa como a rugido de uma fera após encurralar uma presa.
Ele andou até mim, mas não vou recuar seja lá qual for a brincadeira idiota dessa vez. Eu disse que não iria me intimidar e agora tenho que cumprir com minha palavra.
— Não tem mais nada pra você fazer?
— Nada é mais interessante do que te ver com essa carinha de medo — ele continuou se aproximando e sem perceber acabei dando passos para trás.  Não quero que ele chegue mais perto do que devia, mas ele não está parando... e por que diabos está me olhando assim??? Porra, sinto minhas costas encostando em uma superfície sólida, estou entre ele e uma estante.

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