Meu Diabo Favorito

Capitulo 46

— Devem ter secado com a luz do sol que entrou pela janela — é melhor tentar encerrar esse assunto o mais rápido possível.
— O tio Lúcifer estava sem blusa, ele também se molhou na chuva? — ela faz perguntas demais.
— Sim — respondi, isso deve bastar.
— Acho que entendi tudo então — ela continuou — vocês se molharam na chuva e por isso tiveram que dormir sem roupas. E como estava frio ontem a noite, dormiram abraçadinhos, pelo menos foi assim que encontrei vocês hoje cedo. Estou certa?
— Quase isso. Mas está certa. Contou o que viu pra mais alguém?
— Só pro meu cachorro...— ela encarou Pacto deitado no chão.
— Menos mal — fiquei aliviada.
—... e pro meu pai, pros funcionários, pra Bety e até para os quadros.

Eu não acredito que essa pestinha sem alma no corpo tenha feito isso. O pior é que ela está falando com tanta alegria, como se sair fofocando essas coisas fosse algo super natural e lucrativo.
— Por que você fez isso???
— Calma tia Kaila — ela me deu uma olhada fria de gelar a espinha — eu estou apenas tirando uma com a sua cara. Eu nunca iria sair por aí espalhando que a senhora fez sexo com o tio Lúcifer — a garota infernal esbanjou um sorrisinho diabólico. Então por trás daquele rosto fofo havia mesmo uma pequena serpente traiçoeira assim como Lúcifer. Agora percebo o motivo de ambos se darem tão bem.

— Que papo é esse? — perguntei, fingindo não saber do que ela estava falando — Onde ouviu essa palavra?
— Sexo? Tia Kaila, eu morei nas ruas como a senhora. Não pense que eu não sei o que estavam fazendo só por que sou uma criança. Mas eu não contei a ninguém, ainda...
— O que quer dizer com “ainda”? — o que essa menina está tramando agora. Já não basta saber mais do que devia, as vezes esqueço de que as crianças da atualidade chegam a ser mais astutas que os próprias adultos.
— É bem simples, eu quero sair um pouco. Ficar aqui todo dia está acabando com a minha beleza. Então quero que você e o tio Lúcifer me levem ao parque de diversões e me comprem pelúcias novos. Um passeio a três. Façam isso e eu não vou contar a ninguém, neguem o meu pedido e o caos será instalado pelos quatro cantos desta mansão.
Eu não acredito nisso, a garota está me chantageando. Que tipo de mini capeta o Lúcifer está criando?

— Você não pode sair por aí chantageando as pessoas, Horrania.
— Lógico que posso, bem aventurado são aqueles que usam as vantagens ao seu favor. Foi isso que o tio Lúcifer me disse. Agora vá dizer a ele as minhas exigências. E você Pacto? — ela pulou do sofá e andou até o cachorro, em seguida começou a passar a mão em sua barriga peluda — vai querer exigir algo? Nós dois temos uma arma muito forte em mãos agora.

Não sei se isso me faz rir ou me deixa assustada, só sei que vou deixar essa bomba com Lúcifer. Eu não vou ser chantageada pela mini cópia do diabo, não vou mesmo. E tudo por culpa do imbecil que não trancou as portas do próprio quarto, irresponsável como sempre. Depois das chantagens tudo voltou ao normal, Horrania e eu ficamos algum tempo sentadas conversando normalmente até que deu a hora de ir ao encontro de Cho e das gêmeas. Estas estavam me esperando no mesmo local da aula anterior. Tudo consistiu em repassar o que havíamos aprendido, a andar de salto, ao equilíbrio corporal, postura e modos de caminhar. Andávamos em fileiras e por algumas vezes éramos obrigadas a carregar um objeto pesado com a mão estendida para que nossas posturas ficassem cada vez mais parecidas com a de uma dama.

— Nada mal, nada mal, nada mal — Cho parecia bem mais animada que antes. Parece que estávamos enfim agradando aos seus olhos e após seguir suas ordens por quase um dia inteiro. Dominamos a postura, ou pelo menos tivemos um progresso muito bom. Cho nos disse que nossas próximas aulas iriam ser focadas em como se comportar a mesa, mas que futuramente iríamos repassar a postura. Também disse para que nós três continuassem a treinar sozinhas pois a prática leva a perfeição.
Sinto que estou andando mais ereta agora e sempre de nariz empinado, parece que quando se aprende a dominar a postura fica impossível voltar a ser o que era antes.

Me sinto até mais alta e fiquei passando na frente de todos os espelhos da mansão apenas para me ver caminhar, era algo bem diferente de antes, apesar de eu ainda ser eu. Ao anoitecer me encontrei com Bety em um dos corredores do primeiro andar e  a primeira coisa que fiz foi abraça-la enquanto lhe contava sobre minha nova conquista.
— Sempre soube que você era uma garota excepcional — ela sorriu me abraçando de volta — linda, inteligente — ela me apertou mais do que devia, sinto que vou quebrar se ela não parar — aprende rápido, é teimosa, desobediente...

— Vai me esmagar assim — acabei rindo. Ela parece mais feliz do que eu mesma. Isso sim que eu chamo de uma grande amizade. Será que a minha presença a faz lembrar da própria filha e por isso ela me trata tão bem assim? Tenho certeza de que deve ser isso.
— Como foi dormir no quarto dele? Ele não tentou fazer nada com você, tentou? — agora a Bety entrou num assunto delicado e pra piorar eu acabei rindo muito após ela fazer essa pergunta.
— Foi tudo muito normal — respondi tentando não parecer suspeita.
— Eu não acredito nisso, Kaila. Vocês dois transaram???

Aquilo não foi bem uma pergunta, foi uma acusação descarada. Pelo visto não consigo esconder nada dela, é como se ela fosse capaz de ler a minha mente. O jeito vai ser confirmar e deixar com que a vergonha tome conta de toda a minha alta.
— Sim... mas não foi minha culpa — como assim não foi minha culpa? Fui eu quem se jogou no colo do diabo após ser dominada por um maldito fogo descomunal.
— Meu Deus, Kaila. Pensei que vocês sentiam algo um pelo outro em segredo em meio a todas as brigas, mas isso é uma surpresa e tanto.
— Eu não sinto nada por ele — cruzei os braços e desviei o olhar — pra ser sincera eu o odeio, nada mais.
— Claro, grande maneira de demonstrar isso. Mas enfim, não vou julgar, já fiz muita coisa nessa vida. Oh se fiz.
— Betyyy — a cutuquei — pare de falar essas coisas em voz alta — ela riu da minha cara.