parte 3

581 49 5
                                    

ponto de vista: vivi

Acordei me dando conta de que não fechei as cortinas. A luz do sol me incomoda nesse horário. Pego meu celular e vejo que são quase dez da manhã. Geralmente levanto mais tarde, porém vai saber a hora que a tal garota vai chegar.

Preciso me preparar.

Ao atravessar o corredor e ver a maioria das portas fechadas, comemoro internamente. Provavelmente uma parte da galera ainda dorme, o que me dá tempo pra usar o banheiro à vontade.

Escovo meus dentes e lavo o rosto com o sabonete antiacne que a Laura passa nos filhos. Interessante, porque os dois não tem nem dez anos ainda.

Quando terminei, desci as escadas e peguei duas maçãs na cozinha. Sentei em frente à televisão e comi entretida, enquanto assistia As Branquelas na Netflix. Um filme que me faz querer ser mais feliz, de um jeito curioso.

— Já acordou? — Manu passa por mim e bagunça meu cabelo.

— Já, né? — respondo de forma óbvia. — Ei, que horas a menina nova chega?

— Tá ansiosa pra conhecer sua colega de quarto? — ela debocha, sentando na poltrona ao lado.

— Não, é por causa do colchão mesmo. A propósito, quem escreveu aquele recado que tava na minha escrivaninha?

— A Júlia. Esqueceu que ela "representa" a dona da casa quando se trata dessas coisas? — ela fez aspas com os dedos.

— Estranho, ela mal para aqui.

— Pois é, só aparece quando é pra resolver algo importante.

— E tinha que sobrar pra mim. — reviro os olhos, dando uma última mordida na maçã.

Ao terminar, jogo os restos fora e volto pra sala. Manu e eu ficamos assistindo o filme, até que ela acabou cochilando ali mesmo.

[...]

Eu quase esqueci que tinha que trabalhar. Vesti meu uniforme e saí meio incomodada. Pelo jeito vou perder bastante coisa, mas principalmente a recepção. Hoje Valentina veio, mas me olhou com uma cara estranha assim que chegou.

Me coloquei atrás do balcão e ela ficou checando o dinheiro nas gavetas.

— Tá tudo bem? — perguntei, como quem não queria nada.

— Sim. — ela respondeu como se eu tivesse feito uma pergunta mega pessoal e desconfortável.

— Então tá. — dei de ombros e ela virou pra mim bruscamente. — Que foi?

— O seu Ronaldo me deu a maior bronca. Deve ter sido porque alguém fez fofoca pra ele, né? — ela botou as garras pra fora e me olhou com raiva.

— Oi? Valentina, ele é nosso chefe. Óbvio que uma hora ia perceber as suas faltas.

— Até parece. Ele mal desce aqui.

— Mas sabe perfeitamente das vezes que eu fechei a floricultura sozinha. Não é difícil deduzir.

— Tá bom. Tudo bem. Tanto faz.

— Eu, hein... — murmuro, com certo medo dela voar em cima de mim.

O dia foi entediante, como na maioria das vezes. Já que a turista da Valentina veio, não poderei sair mais cedo. Bufei ao pensar nisso, mas pelo menos uma cliente elogiou minhas tatuagens da mão. Ela até queria saber quem foi o tatuador, acabei dando o contato pra ela e a moça saiu sorridente.

— Tá com a chave? — minha colega perguntou antes da gente fechar os portões.

— Tô. — afirmei balançando o objeto nos dedos.

Depois de trancarmos tudo, ela saiu sem nem dizer "tchau". Resmunguei e dei as costas. Ao passar pela confeitaria, quase entrei pra comprar um doce, mas aí lembrei que tinha algo, ou melhor, alguém me esperando em casa.

borboletas [gabi cattuzzo]Onde histórias criam vida. Descubra agora