parte 1.

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"Querido diário, olá de novo. E desculpa, de novo. Se você fosse uma pessoa, na certa estaria de saco cheio de receber minhas reclamações de merda todo santo dia. Ainda bem que não é, porque eu não pretendo parar.

Pelo menos, não enquanto eu viver. Mas relaxa, que provavelmente não será muito.

Suas folhas e a caneta ocupam meu dia mais do que qualquer coisa, e eu te agradeço por isso. Nunca ninguém teve essa paciência comigo. Mas...é melhor eu não pensar muito nas circunstâncias, porque mais triste do que um trauma como esse, é só o fato de considerar um caderno como meu melhor amigo.

Bom, vou contar o que fiz desde que acordei. Assim que abri os olhos e me deparei que estava de volta no quarto, desejei retornar ao meu sonho. Engraçado, assim como na ficção, os sonhos me trazem uma vontade insana de continuar. Não importa o quanto eu corra, caia e me machuque, eu nunca desisto.

Não conta pra ninguém, mas eu já quis ser assim. Na verdade, eu já fui, anos atrás. Mas eu era só uma pirralha, né? O que eu sabia da vida, afina-

— Rosa! — ouvi o grito da minha mãe e a caneta caiu da minha mão.

— O que é?! — perguntei após dar um suspiro aborrecido.

— Venha me ajudar à por a mesa do almoço! — Ivana exclamou novamente e eu fiz uma careta.

Larguei minhas coisas na cama e fui até a cozinha. Nosso apartamento é grande, mas não à ponto de separar a mesa da cozinha em cômodos diferentes. Meu pai e Isadora estão sentados, conversando.

Isadora é minha irmã mais velha. A gente não se dá bem. Tem motivos? Talvez.

Ivana me deu a louça como se fosse a coisa mais importante do mundo, e eu à espalhei pela mesa. Em seguida os garfos e facas, e logo depois os copos. Resumindo, mamãe me deu a tarefa toda.

— Mais alguma coisa? — perguntei, vendo ela colocar uma tampa na panela.

— Sente-se pra comer. — ela falou sem me olhar.

— Eu não tô com fome.

— Rosalinda, coma conosco pelo menos uma vez. — Ivana me olhou finalmente. Ela se aproximou e me abraçou, como retribuição eu apenas dei tapinhas leves em seu braço. — E ajude sua irmã.

— Ela consegue comer sozinha. — bufei.

— Rosalinda...

— Tá bom.

Sentamos à mesa e eu coloquei o guardanapo dentro da blusa de Isadora. Entre suas coxas estava a sua bengala, diminuída, claro.

— Tá com pressa? — ela questionou e eu soube que era comigo.

Deve ter percebido os sons rápidos do meu garfo batendo no prato.

— Não. — menti.

— Por que perguntei? Óbvio que ia negar. — ela deu um sorriso irônico.

— Por que tá com pressa, Rosa? — meu pai disse.

— Eu não t-

— Ela quer continuar no mundo faz de conta dela. — Isadora riu.

— Cala essa boca, Isadora. — rebati.

— Não tô entendendo, gente... — André, meu pai, murmurou.

— Melhor não entender mesmo, pai. É muito complexo explicar a realidade. Descrevi certo, Rosa? — Isadora seguiu com as provocações. — Foi assim que você anotou no seu caderninho?

— Meus parabéns, falou igualzinho. — não me contive e joguei o mesmo joguinho estúpido. — Quase como se tivesse conseguido enxergar as palavras exatas.

— Rosa, não fale assim. — minha mãe me repreendeu.

— Por que? O que ela disse tá tudo bem? Olha... — desisti de tentar me defender e me levantei bruscamente.

Volto pro meu quarto e pego o diário e a caneta. Ao passar pelos "cômodos compartilhados", todos notam minha saída.

— Rosalinda, aonde vai desse jeito? — Ivana perguntou, não fazendo ideia.

Não me conhecendo nem um pouco.

— Me jogar do prédio. — respondo seriamente antes de fechar a porta, porém mesmo com ela fechada, pude ouvir minha irmã comentando algo do tipo: "Ela adora fazer drama pra não contar a verdade."

Enfim tiro a mão da maçaneta e vou em direção ao elevador. Quando a porta se abre eu me adianto à entrar e acabo esbarrando em um cara.

Sua mochila enorme acaba caindo no chão e eu o ajudo à pega-la, antes que...não sei.

primeiro capítulo!!
sim, o cara do elevador é o mount
espero que gostem e lembrem-se: comentários deixam os autores felizes 🤌

coração inválido [mount]Onde histórias criam vida. Descubra agora