Isadora lia um de seus livros em braille enquanto eu e nossa mãe arrumávamos a cozinha.
— Obrigada, meu bem. — ela pôs a mão em meu rosto carinhosamente. — Tô gostando de ver.
— ...Gostando de ver o quê? — ri um pouco sem graça, não esquecendo que a outra escutava tudo.
— Você tá mais feliz. Não precisei te dar bronca até agora. — Ivana deu as costas e foi até a pia.
Olhei de relance pra minha irmã e ela permanecia imóvel, aparentemente concentrada no que fazia.
Passou um tempo e eu fui pro quarto atender uma ligação do Gabriel. Me encontrar com ele às escondidas tem sido tão arriscado quanto empolgante. Porque mesmo cega, Isadora consegue perceber coisas improváveis.
Pelo menos até então ela não parece desconfiar. A gente mal tá se falando desde que eu não sou mais responsável em ficar cuidando dela.
— Oi. — disse ao apoiar o celular na orelha.
— Oi, Rosa. — ele respondeu de uma forma encantadora. Sorri imediatamente. — Tenho uma surpresa.
— Outra? — brinquei.
— É. — o garoto gargalhou. — Acha que pode vir depois das oito?
— Eu vou tentar. Preciso decidir se vou sair escondida ou não.
— Como assim?
— Minha mãe tá mais tranquila, agora. Talvez se eu disser que vou pra casa de uma amiga, ela não fique tão aborrecida. — explico, ele não diz nada. — Você não gosta disso, né?
— Faça como achar melhor, Rosa. Tudo são etapas. Nada precisa ser resolvido com pressa. Eu gosto de você. — Gabriel deu ênfase na última frase, e eu suspirei.
— Tá bom. — percebi a chegada de alguém e minha postura mudou automaticamente. — A gente se fala, então. Beijo.
— Beijo, linda. — quando ele se despediu também, eu desliguei a chamada e olhei pra Isadora.
Ela caminhou até a escrivaninha devagar e sem falar nada. Aproveitei seu silêncio pra me retirar o mais rápido possível. Não tô preocupada com o que ela possa aprontar.
Afinal, o que mais ela pode destruir? Minha cama?
Depois que meu pai chegou e nós nos juntamos pra jantar, eu me preparei mentalmente.
— Eu vou sair daqui à pouco. — soltei de uma vez.
— Onde vai? — André perguntou.
— Uma amiga antiga da escola me chamou pra dar uma volta. — inventei.
— Que bom, amor. Que horas você volta? — minha mãe bebericou o suco.
— Não sei. Mas já sou maior de idade, então...
— É maior de idade, mas ainda depende da gente. — meu pai rebateu. — Volte no máximo à uma da manhã. Se for se atrasar, avise pelo menos.
Fiquei surpresa com a resposta dele.
— Certo. — assenti, extasiada por dentro.
— Era com essa amiga que você tava falando no telefone? — Isadora abriu a boca, justamente quando eu pensei que isso não aconteceria.
— Sim.
Ela ficou quieta em seguida, apenas mexeu as sobrancelhas fazendo pouco caso.
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coração inválido [mount]
Fanfictiononde rosalinda gosta de escrever e gabriel gosta de viver.