À medida que sua consciência se tornava mais presente, Clara falava e comia melhor. Também entendia quem era Metin, Cem e Kenan, sem as fantasias da bela percepção visual que o príncipe provocava e da ideia de que morrera e estava no céu com um anjo.
Entendera que ele era uma pessoa importante de onde viera e que alguém do mesmo local levara seus parentes cativos; era de um povo inimigo do seu, mas que a salvara da morte certa, presa em um local em que seus vizinhos consideravam vazio após o saque dos otomanos.
Ele era gentil e atencioso com ela, enquanto os outros se mostravam distantes. Por isso, era ele a quem sempre chamava quando precisava de algo, o que parecia desagradar ao médico, principalmente.
Metin procurava lhe explicar tudo o que estava ocorrendo, assim como fez com o que ocorreu, sem lhe fazer perguntas. Ela estava curiosa em conhecer aquele lugar chamado Istambul no qual estaria como convidada e com liberdade para voltar para sua própria terra e casa quando quisesse.
Nunca havia sido livre. Talvez, quando criança, na companhia de seus pais, mas não tinha muitas recordações desse tempo. Após a morte deles, só se sentia livre lendo ou à noite, olhando o céu estrelado e se imaginando voando para lugares que apenas conseguia pressentir que existissem.
Pensava muito, mas não tinha muita força para fazer as perguntas que queria. Ouvia mais e observava tudo ao seu redor.
Não se importava que Metin a ajudasse, mas não queria o auxílio dos outros homens, apesar de não se sentir ameaçada por eles. Não com o príncipe ali.
- Mais uma caravana da Capadócia, meu senhor - Kenan avisou ao filho do sultão, voltando para junto do grupo, uma vez que ia na frente para verificar se havia algum perigo.
- Vá de encontro a eles e verifique se farão acampamento aqui para pernoitar. - Orientou Metin que percebendo que Clara empalidecia muito quando não faziam paradas frequentes, diminuia ao máximo o ritmo da viagem. - Caso sim, pergunte se podemos lhes fazer companhia.
Cem e Kenan entreolharam-se. O filho do sultão não precisava consultar ninguém sobre se podia ou não podia fazer algo. Mas, mesmo assim, Metin fazia questão de nunca impôr-se a quem quer que fosse.
A caravana aceitou, com muita alegria e orgulho, a companhia do príncipe e de seus companheiros e companheira de viagem. Assim, naquela noite, inclusive Clara, com a ajuda e cuidados de Metin, sentou-se próxima à fogueira para ouvir o que o príncipe traduzia da conversa.
- Eles estão falando sobre a produção de tecidos de sua terra, na Capadócia. - Iniciou Metin - são as mulheres as responsáveis por todo esse trabalho, mas o dinheiro das vendas fica com seus maridos.
Clara notou uma certa contrariedade no jovem ao dizer aquilo.
- Enquanto elas passam do amanhecer ao anoitecer tingindo, tecendo, lavando e preparando as peças para serem vendidas em vários lugares, as tarefas dos homens são menos pesadas do que parecem.
Ela tinha tantas coisas para falar, mas sentia um cansaço profundo e assim, passou suas mãos pálidas e geladas em um dos tapetes Kilim que, como explicara o príncipe, significa "dupla face".
- Esse pequeno tapete - disse-lhe Metin, olhando com amor para as mãos da jovem que acariciava uma peça ideal para o fiel se ajoelhar em suas orações - é tecido com lã e o acabamento é feito sem nós.
- Você já teceu algum tapete? - perguntou com alguma dificuldade Clara.
- Alguns. No acampamento que passei boa parte de minha infância e adolescência, não queriam que eu o fizesse, porque diziam ser trabalho de mulher. Para mim não há trabalhos de mulheres ou homens. Somente há coisas que devemos aprender e saber fazer.
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O SULTÃO E A PRISIONEIRA
ChickLitO sultão e a prisioneira é uma história romântica, porque narra o relacionamento ideal e, por isso, fictício, entre um homem e uma mulher. O protagonista é o avesso do homem que encontramos no presente e, a história, como uma ficção, apenas utiliza...