Parte dois.
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10 anos atrás.
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Eduardo.
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Mecanicamente me arrumo.
Primeiro, visto a calça social preta, fecho-a e passo o cinto. Depois, visto a camisa social branca, fecho botão por botão, e ajeito o colarinho. Olho para o espelho, percebendo os olhos arregalados, a boca pálida, e a falta de total de brilho em minha expressão. Me sinto vazio, uma casca oca, apenas existindo para os outros, nunca por mim.
Só noto que minhas mãos estão trêmulas quando passo a gravata ao redor do pescoço, fantasiando por um segundo me enforcar com ela. Logo empurro o pensamento para longe, olhando para Lucas através do espelho. Meu filho de quatro anos dorme em nossa cama, todo encolhido com o rostinho enfiado no travesseiro. Apesar do apartamento ter dois quartos, nós dormimos juntos todas as noites. É o único momento que temos juntos, afinal.
Dou o nó na gravata e coloco o paletó. É um dia importante, o dia que vai definir minha vida para sempre. Hoje escolho perder cada um dos meus princípios, mas tento não deixar isso me afetar. Estou cansado de trabalhar do começo do dia até o final dele, estou cansado de me debruçar sobre contas e nunca conseguir pagar todas. Estou cansado de passar horas e horas numa fila de hospital porque não tenho dinheiro para pagar um plano de saúde para meu filho asmático. Estou cansado de ter que recorrer a Eloy, aos meus pais e às vezes até à minha chefe.
Caminho até a cama e checo a temperatura de Lucas, depois, pego o oxímetro na mesa de cabeceira e o encaixo em seu dedo, medindo sua saturação. Está dois pontos abaixo do normal, o que não é motivo para pânico, mas fico apavorado mesmo assim. Preciso lembrar Eloy do que fazer caso ele piore.
Guardo o oxímetro e organizo os medicamentos e as bombinhas que ele precisa usar todos os dias.
— Papai? — Lucas chama atrás de mim e me viro rapidamente. Não tinha percebido que ele estava acordado. Seus olhinhos, azuis como os meus, correm interessados por minhas roupas. — Você está bonito. Onde vai?
— Vou trabalhar numa coisa diferente hoje. Tia Eloy vai ficar com você. — Digo me aproximando. Geralmente seus elogios me deixam meio bobo, como se eu fosse adolescente e uma garota me dissesse coisas legais. Lucas é a pessoa que mais amo no mundo, meu mini humano favorito, e toda vez que ele acha algo positivo em mim, meu coração agradece, mas não dessa vez. Estou arrumado para coisas ruins, não sou digno de seu elogio. — Se tudo der certo, passaremos mais tempo juntos.
Tento ao máximo ficar com ele todos os segundos possíveis do dia, mas é difícil. Trabalho em dois empregos e enfiei que quero um mestrado logo depois de sair da faculdade, o que está custando minhas madrugadas. Lucas pisca seus olhos e um sorriso surge em seus lábios. Amo como ele se parece comigo, e não com a mãe. Ter uma cópia de Lilian em casa apenas aumentaria minha raiva e céus, eu já tenho raiva demais dentro de mim.
— Seu trabalho novo te dará mais tempo livre? — Ele pergunta esperançoso. Odeio sua esperança. Um filho não deveria esperar mais presença do pai, ele deveria ter essa presença sem esforço.
— Sim, mas tudo precisa dar certo primeiro. — Quase peço a ele para não criar expectativas, mas por seu sorriso, elas já estão com ele. Beijo sua testa quando ouço a porta ser aberta, com certeza Eloy entrando com sua chave reserva. Outra pessoa que tem uma chave é Lilian, mas ela não vai voltar, não importa o quanto eu queira que volte. Às vezes digo que é apenas por Lucas, mas no fundo, sinto sua falta. No fundo, dói. Dói muito. — Continue deitado, tia Eloy logo virá.
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MONSTRO. | Professor × Aluna.
RomanceMONSTRO - Você Me Destruiu. O destino é imprevisível, a força que rege o mundo. No entanto, com Helena Campos, o destino foi mais que cruel. A faculdade de Direito é o lar de seus sacrifícios, onde tem que lutar para se manter, mas se tornou seu lu...