Três semanas.
Faltam três semanas.
Contei cada dia esperando a tão sonhada chance de liberdade, mas agora, os dias parecem passar devagar. Lilian não virá hoje. Ela aceitou o pedido de namoro do cara legal e decidiu que trair ele não era algo que ela queria. Eu aceitei sua decisão, claro, mesmo que as duas horas mensais de sexo já estivessem fazendo falta. Um ano, dois meses e sete dias. Foi o que perdi nesse lugar, foi o tempo que perdi da minha vida, da vida do meu filho. Ela não apareceu nenhuma vez, não enviou um bilhete. Sumiu. Sumiu completamente. Nem mesmo ensinar aos meus colegas é o suficiente para me afastar do mar de desespero que me encontro. As paredes me sufocam e eu já não consigo me concentrar em nada. Choro o tempo todo, ficando recluso nessa cela vazia, saindo apenas quando realmente preciso comer. Emanuel e Ricardo sentam comigo ao invés de irem para o banho de sol, ficam em silêncio conforme eu encaro o nada e os peço para ler alguma coisa, qualquer coisa. Nem mesmo o orgulho que sinto ao ouvi-los lendo me impede de chorar quando eles saem.
Me perdi mesmo quando me machuquei com um lápis bem apontado e percebi que aquela dor física me deixou menos ansioso. Foi o começo de vários furos que inflingi a mim mesmo. Nessa noite, nem mesmo afundar o lápis em meu braço me faz sentir menos desespero.
É a quarta crise de ansiedade na semana e dessa vez, Júlio não está aqui, o que é estranho. Talvez seja seu dia de folga. No entanto, o guarda que ficou em seu lugar abre a porta da cela e me deixa sair. Eloy deve estar pagando horrores para que eu tenha essas regalias; de jeito nenhum esses guardas fariam isso por amor ao próximo.
— Você tem dez minutos. — Ele repete as mesmas palavras de Júlio, mas ao contrário dele, não fica comigo.
Eu me sento no meio do pátio vazio, a cabeça apoiada nos joelhos conforme luto por ar e quase perco a batalha contra a ânsia de vômito. Sinto uma sensação de pânico crescente, um mal pressentimento que gela meus ossos. Nem mesmo a ferida aberta em meu braço me faz respirar melhor.
Preciso respirar.
Três semanas.
Em três semanas posso sair daqui ou ser preso por anos. Posso perder vários aniversários de Lucas, posso perder o início de sua vida adulta, suas conquistas... Sua formatura. Céus. Eu não sei o que farei se for obrigado a não ver meu filho se formar.
Estou cuidando dele. Bom, estou tentando. Ele é difícil, muito parecido com você. Mas juro, Kaldor, estou fazendo o meu máximo para que ele fique bem.
Eu praticamente consigo ver a letra de Samuel no papel que está na minha cela. Nesses últimos meses, ele sempre esteve comigo por cartas, me manteve atualizado sobre Lucas sem fingimentos, sem a pretensão de não me preocupar, como Eloy e Lilian fizeram. Ele falou sobre as crises de ansiedade de Lucas, sobre como ele estava com saudade, sobre como ele ficava depois de cada visita e por isso não vem muito, preferindo me mandar cartas. Samuel foi o amigo mais surpreendente que consegui e mesmo agora, bem longe, eu o considero como um filho. Espero que ele continue na família.
Ouço passos atrás de mim e me viro rapidamente, mas não rápido o bastante. Algo pesado encontra minhas costas e eu caio para frente, o ar me faltando quando a dor me corta. Antes que eu possa reagir, alguém está sobre mim, punhos me atingindo no rosto, no estômago, nas costas. São mais de um, mais de um agressor, percebo. Ninguém tem tantos punhos assim. Os socos são fortes e certeiros, cheios de raiva, ressentimento. Percebo que não é uma coincidência Júlio não estar aqui, que o guarda substituto me deixe sair e que essas pessoas me encontrem. Está tudo interligado.
Um chute atinge minhas costas, outro a lateral do meu corpo, provavelmente quebrando minhas costelas ou lacerando algum órgão. Acho que grito.
— EI! — Uma voz grita ao longe e tudo que consigo fazer é arquejar por ar, sentindo o gosto de sangue na boca. Não consigo abrir os olhos. Os agressores se afastam e passos rápidos se aproximam. Gritos. Alguém está gritando muito. — Kaldor!
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MONSTRO. | Professor × Aluna.
RomanceMONSTRO - Você Me Destruiu. O destino é imprevisível, a força que rege o mundo. No entanto, com Helena Campos, o destino foi mais que cruel. A faculdade de Direito é o lar de seus sacrifícios, onde tem que lutar para se manter, mas se tornou seu lu...