Eu percebi que tinha alguma espécie de defeito no cérebro quando notei que a maioria das pessoas não tinham uma chavinha para desligar suas emoções; para ficarem completamente vazias e frias. Com algum esforço, eu empurrava tudo para dentro de uma caixa fechada no fundo da minha mente e me desligava do mundo, agora isso acontece involuntariamente. Quando passo pelos portões da única penitenciária da cidade, não como advogado, mas como detento, minhas emoções se foram. Os polícias me guiam, mas não é pela porta da frente, destinada aos visitantes. Sou levado por uma entrada adjacente, e depois, por um corredor cinzento com luzes piscantes.
Sou colocado de frente para uma mesa de ferro, onde um homem de idade se senta, os cabelos brancos penteados para trás, o rosto enrugado tomado por uma expressão de tédio.
— Senta. — Ele ordena sem sequer olhar para mim e apenas obedeço, completamente no automático, arrastando a cadeira metálica com um rangido que ecoa. Me sento mantendo as mãos algemadas sobre o colo, observando os papéis sobre a mesa. — Nome.
— Eduardo Henrique Antunes Montserrat Kaldor.
Sem olhar para mim, ele procura em seus papéis minha ficha e quando acha, arqueia as sobrancelhas.
— O doutor ficará em cela separada. — Ele está falando com os policiais, não comigo. Por incrível que pareça, não há nenhum sarcasmo ao me chamar de
doutor. — Cela 19, bloco B, está vaga.
Os guardas assentem, mas ninguém faz qualquer movimento em minha direção.
— Por enquanto será lhe fornecido os insumos básicos do Estado, mas quando sua família ajeitar as visitas, você terá o que eles trazerem.
— Certo.
— Júlio, tire as algemas para o detento preencher a ficha.
Quando Júlio cumpre a ordem, eu aperto meus pulsos para me livrar do incomodo que as algemas causam e então, pego a caneta que o homem oferece. A ficha é simples, mas cheia de perguntas, desde doenças até alergias alimentares. Eu apenas marco o alcoolismo.
— Posso ficar com minha blusa de frio? — Pergunto, minha voz rouca pelo desuso.
— Pode. — O homem grisalho dá de ombros. — Mas imagino que não vá precisar dela. Estamos no verão.
— Obrigado.
— De pé. — O homem grisalho ordena e eu o faço, imaginando que as algemas irão voltar, mas ele só para na minha frente. — Mãos ao lado do corpo.
Quando eu obedeço, ele enfia as mãos nos bolsos da minha bermuda e depois nos bolsos do moletom. Sinto quando ele acha o papel que Helena deixou, o único motivo para eu querer ficar com o moletom, e então o tira para fora. Observo conforme o homem grisalho abre o papel e lê. Penso que ele irá joga-lo fora, mas apenas me entrega outra vez e eu o enfio no bolso o mais rápido que consigo, antes que ele mude de ideia.
— Leve-o até a cela.
Sem revista íntima, sem troca de roupas no vestiário compartilhado, sem nenhum tipo de humilhação. Que porra?
Júlio não coloca a algema outra vez, apenas segura meu braço e me guia através de outro corredor, até uma porta adjacente, larga e alta, que ele abre e me puxa para dentro. Apesar de lidar com criminosos por uma boa parte da minha vida, nunca estive no interior da penitenciária, sempre levado diretamente até uma sala de visitas quando eu não conseguia impedir o cliente de ser preso.
— Estrela! — Júlio grita quando entramos em um corredor cheio de celas. Há uma comoção grande, gritos de felicidade e comemoração. Eu não entendo nada. — Seu uniforme está na cama, você não pode usar suas roupas fora da cela, então, sempre o vista para sair.
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MONSTRO. | Professor × Aluna.
Roman d'amourMONSTRO - Você Me Destruiu. O destino é imprevisível, a força que rege o mundo. No entanto, com Helena Campos, o destino foi mais que cruel. A faculdade de Direito é o lar de seus sacrifícios, onde tem que lutar para se manter, mas se tornou seu lu...