Extra - Um gato

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  Ensino médio, para muitos uma das melhores épocas de suas vidas, para outros o inferno em terra. E Calisto era um desses "outros" que só se fodiam todos os dias naquele maldito lugar.

  Mais uma manhã incrivelmente sem graça, Calisto praticamente se arrastava para o colégio enquanto sua mente estava na puta que pariu. Ao virar uma esquina viu na distância alguns alunos de sua sala que não eram exatamente seus amigos, na verdade eles o odiavam, mas não fazia mal já que ele também os odiava.
  Apressou o passo e passou pelo grupo fazendo pouco caso da existência deles, chegou na escola e tentou ir direto para sua sala mas foi forçado a parar quando sentiu alguém puxando sua mochila.

– Bom dia ruivinho.

– Dia, Morato. – Respondeu entediado, sem nem sequer se virar para olhar o outro

– Acordou de mau humor?

– Queria nem ter acordado.

– O que aconteceu? – Morato largou a mochila do outro, passando o braço por seu pescoço e voltando a andar guiando Calisto na direção oposta a qual ele estava indo originalmente

– A vida, cara, a vida. A gente tá indo pra onde?

– Quadra.

– Sabe que hoje tem prova, né?

– Não vamos demorar, só vou te mostrar uma coisa.

– Podemos ir depois, não confio em você. – Tirou o braço do outro de seu pescoço e saiu o puxando de volta para a sala

– E se ele não estiver lá quando a prova terminar?

– "Ele"? Quem? – Parou de andar novamente

– Vai descobrir se vier comigo.

– E a prova? Sabe que vamos ficar sem nota.

– A gente recupera no segundo bimestre.

– Ham.. foda-se, não estudei mesmo.

  Então os dois saíram andando para a quadra, a qual tinha apenas uma grade que em teoria era para os alunos não saírem, mas não servia para nada na realidade. Subiram pela grade, pularam e continuaram caminhando normalmente até um beco que ficava bem próximo dali.

– Eai? – Calisto perguntou olhando o beco

– Na caixa.

  Calisto entrou no lugar e chegou perto de uma caixa um pouco molhada que tinha ali, empurrou ela levemente com o pé e escutou um miado vindo de dentro dela. Se abaixou e abriu a caixa, revelando um gato filhote, parecia estar com frio.

– Tira o moletom. – Morato obedeceu, tirou o moletom e entregou para o ruivo que usou o casaco para enrolar o gatinho e o pegou no colo – O que a gente faz com ele?

– Não posso ficar com ele, então..

– Se eu ficar com ele, você vai me ajudar a cuidar.

– Pode ser, tipo nosso filho.

– Morato..

– Tô falando sério.

– Essa é a única coisa que você não consegue fazer.

– Realmente, então eu prometo, sabe que eu sempre cumpro as promessas que faço pra você. – Piscou um dos olhos para o ruivo

– Por que você é assim?

  Morato apenas deu de ombros e saiu andando, Calisto deu um sorrisinho e o acompanhou. Foram para a casa do ruivo que ficava grande parte do tempo sozinho, morava apenas com seu pai e o mesmo estava sempre viajando.
  Entraram colocaram o gato no chão e ficaram agachados encarando o animal.

– Tá.. o que a gente faz agora?

– Dá comida.

– Parece que só tem uns dias.. vai comprar comida pra ele.

– Hm? Ele não pode comer qualquer coisa?

– Óbvio que não, é um filhote.

– Tsc, quanto trabalho. – E mesmo assim Morato obedeceu, se levantou e foi resmungando até sair da casa

  Calisto se sentou no chão e pôs o gato em seu colo, vendo o mesmo se acomodar e finalmente parar de miar, começou a acariciar o animal enquanto conversava com ele.

– Você não deve ter um nome, certo? Como eu deveria te chamar?

  Ficou encarando o animalzinho, tentando pensar em algum nome. Era um gatinho totalmente preto, tinha que ser um nome que no mínimo combinasse com ele.

– Nero? Não, muito clichê.. café? O Morato ia falar que sou viciado em café, então não.. Abel? Leon? Apolo? Loki? – Parou e ficou em silêncio por alguns segundos – Tá legal, eu sou péssimo com nomes.

  O gatinho miou, e por alguma razão Calisto entendeu aquilo como um "concordo" da parte do felino.

– Mas o Morato consegue ser pior.. acho que posso te chamar de Morato, você gosta desse nome? – Mais uma vez o gato miou – Que bom, agora seu nome é Morato.

  Continuou acariciando a barriga do gatinho, por alguns minutos seus pensamentos tinham parado, estava focado somente no momento.

– Cara, além de um tipo de ração específica, também tem remédios, jeito único de dar banho, é uma responsabilidade do caralho. – Ouviu Morato reclamando enquanto se aproximava com várias sacolas, nem sequer tinha escutado a porta abrir

– Sim, e agora não tem volta, então aprenda a lidar com isso. – Se levantou e entregou o gato para Morato e pegando as sacolas e indo em direção a cozinha

– Claro, claro.. já deu um nome pra ele?

– Morato.

– Hm?

– O nome dele é Morato.

– ..então você tá me chamando de gato? Já que ele tem o meu nome.. – Abriu um sorriso cínico

– Não, tô te chamando de animal. – Calisto devolveu o sorriso, vendo Morato fechar a expressão

– Sem graça.

Interferência - SDOLOnde histórias criam vida. Descubra agora