Acordei cedo, como de costume, tomei meu banho, vesti meu jeans, e uma blusa com babado verde água, que salientava meus seios fartos. Prendi meus cabelos num rabo de cavalo e desci. Apenas Lua e Vênus me aguardavam, afinal mamãe e Sophia saíam mais cedo, para o colégio. Minha mãe era professora de português no mesmo colégio de Sophia – e meu antigo colégio. Eu não era muito a vontade com aquilo, na minha época, quero dizer, porque meus colegas viviam pegando no meu pé. E eu ia parar na diretoria com certa frequência, pois eu não levava desaforo pra casa e não levo, até hoje. Algumas coisas nunca mudam.
Mas nunca era eu quem provocava, afinal sempre fui uma boa aluna, apenas irritada com injustiças. Quem é que gosta de ser humilhada em público? Porque alguns dos meus colegas diziam, em alto e bom som, que eu tirava a nota boa porque olhava as respostas em casa, na pasta de minha mãe. Sendo que eu nunca faria uma coisa dessas. Eu era realmente boa em português e literatura. Menos matemática, odiava aquilo. Quando não era aquela difamação absurda, eles me apelidavam carinhosamente de baleia de quatro olhos. Tudo porque sempre fui uma garota cheinha. Como eu amava aquela turma. Eram poucos os que eu gostava, incluindo Melissa, lógico.
Enfim, enquanto pegava um iogurte para meu intervalo à tarde, coloquei mais ração para minhas duas companheiras de cozinha. Em seguida que elas comeram, retirei as tigelas, Lua foi deitar no seu canto, na almofadinha, e Vênus despencou, literalmente, na almofada bem maior, na nossa sala de televisão. E eu saí apressada.
O ônibus não estava lotado como de costume, então consegui um bom lugar atrás de dois rapazes. Coloquei meu fone de ouvido em uma das orelhas e olhei pela janela vendo o ônibus fazer a rota de sempre.
- Sim, cara, ela nem notou. E nem vai notar.
Como eu não tinha nada para fazer, comecei a prestar atenção, sem querer, na conversa dos dois caras à minha frente. Não que eu quisesse, mas eles estavam falando alto, sem a menor política do silêncio dentro do busão.
Tá bom, eu também havia ficado curiosa com o assunto.
- É que mulher é trouxa mesmo, cara. – respondeu o orelhudo.
- Pode crer. Eu posso trair ela quanto eu quiser que ela ainda vai chegar e me dar o carinho que eu mereço. – e os dois começaram a rir.
Eu encarei os dois por trás, com perplexidade. Não, devia ser uma pegadinha, eles não seriam ignorantes de falar coisas assim, nesse nível. Não podia. Devia ser coisa da minha cabeça, óbvio. Suspirei e voltei a mirar a paisagem. Contudo, uma luzinha vermelha começou a brotar em meus pensamentos, e eu não conseguia parar de pensar naquele diálogo. Para, Sarah, eles não podem ser tão escrotos assim. Isso já era demais. Sarah, você está tão arredia com o sexo masculino que já está criando polêmica, eu disse, para mim mesma, rindo por dentro.
- A Leda nem percebe, porque depois de transar sem parar, ela adormece. Eu aproveito e saio com a Nicole e pego ela também. A máquina aqui não para. – o ruivo gargalhou. – E, muitas vezes, é a Nicole que vem até minha casa hahahaha. Uma vez tivemos que transar quietinhos no banheiro pra a Leda não acordar hahahaha. Eu sou o cara.
- Mulher é tudo iludida mesmo, cara hahahahaha – completou o orelhudo. – Tem que só usar.
Calma, Sarah, você não tem nada a ver com isso. Se concentra na mú-si-ca! Não faz barraco no ônibus, de novo. Você é superior, é melhor que eles. Não faz merda, Sarah. Fui tentando me tranquilizar, porém, enquanto eles continuavam a baixaria, meu sangue foi fervendo. E fervendo. E fervendo. Só acho que, como uma mulher não percebe isso? Não, não, não, você não é a namorada de nenhum deles, graças a Deus. Você não é e não conhece essas tais de Leda e nem essa Nicole, eu dizia, para mim mesma, tentando não ouvir aquelas ofensas ao meu sexo. Mas já fui. Já fui trouxa. Já fui essa tal de Leda. Oh, Meu Deus, eu já fui uma Leda! Você não é mais ingênua assim. É uma mulher forte, que cresceu com todas essas histórias que passou. Novamente tentei me tranquilizar, e focar na música. Nos pássaros. Na rua. Emqualquercoisa!
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Um Brinde a Amizade
Chick-LitVocês conhecem a rua Onze? Não? Sarah, Melissa e Alice conhecem muito bem. Três garotas com histórias diferentes, porém com uma ligação sem igual. Sarah, a revisora, quer terminar a sua faculdade, se dedicar ao seu trabalho na Krathus e seu lema é n...