- Bom dia, Leni! – entrei na Krathus com um sorriso gigantesco nos lábios. Cumprimentando todos que passavam. – Oi, Suzanna! Como está o filhote?
Eu precisava me apressar e avisar a Adrian que Sarah havia passado por algumas coisas que impossibilitavam que ela comparecesse naquele momento. Precisava contar a verdade, se quisesse que minha amiga mantivesse o seu emprego.
Toc, toc, toc.
Bati na sala de Adrian.
- Entra, Alice. – ouvi a voz abafada de dentro da sala.
- Bom dia, Adrian. – sorri, elegantemente, pensando que algo havia mudado entre nós.
Mas como alegria de rico também durava pouco...
- Hoje vem uma moça fazer a entrevista para o cargo de Lúcia. Quero que me avise imediatamente, tudo bem?
- Claro. Hum...
- O que foi?
- Eu... er...
- Fala, Alice! Eu preciso organizar toda a editora ainda. – vociferou ele, amargo.
Algumas mulheres se encolheriam quando um homem agia de forma austera com ela, mas eu não era dessas. Nenhum pouquinho. Pelo contrário, eu me exaltava mais ainda. Ele não estava no seu direito.
- Olha, primeiramente eu pensei ter sonhado que havia te acudido no bar ontem a noite, mas aí meu mordomo me garantiu que eu não estava sonhando e que você saiu mesmo correndo da minha casa. O mínimo que você poderia fazer era agradecer. – e larguei a pilha de papéis que eu segurava na mão na frente dele, com toda a minha força.
Com certeza chamei sua atenção. Porque ele arregalou os olhos, me analisou por inteiro, foi para trás e cruzou os braços. Não consegui identificar a sua expressão, se apavorado, se impressionado ou se achasse que eu era uma psicótica. Talvez um pouco das três. Mas pelo menos eu retirei aquilo que estava engasgado há um tempo. Um belo e sonoro ei, me note! E foi exatamente isso que ele fez, depois de uns minutos intermináveis, ele abriu aqueles lábios finos, que eu tanto queria ter experimentado, e disse:
- Não sabia que você é rica.
Foi só isso que ele disse. Mesmo depois de toda aquela minha explosão. Aquilo era frustrante! Muito, muito frustrante. Não era nem um pedido de desculpas e nem uma demissão, se quer. Eu esperava, pelo menos, um obrigada, agora vá. Seria mais digno e mais reconfortante do que aquilo de não sabia que você é rica.
Resolvi responder na mesma moeda.
- Não, não sou rica. Meus pais que são. – respondi, elegantemente, sem perder a pose de durona. – Não vejo a hora de me mudar de lá. – falei aquela última frase mais para mim mesma, baixinho, enquanto me afastava de sua mesa, de costas para ele.
Porém ele ouviu. Ele sempre ouvia.
- Não gosta ou não quer mais morar com os pais? – perguntou, sem cerimônia.
- Você não estava com pressa, há um minuto atrás?
Rebati. Não ia ficar falando da minha vida pessoal, sendo que ele não me disse nem um mísero, obrigada. Eu sabia muito bem devolver com a mesma moeda e ser fria quando necessário. Aprendi aquele truque muito bem com os meus pais. Claro, era um ensinamento horrível a ser passado a um filho, mas acontecia que era a base que eu tinha. Todo meu lado positivo e minhas qualidades foram derivadas das minhas babás, do nosso mordomo, de Floral, minha empregada favorita e de Brenda.
Por esse motivo, eu respondi daquele jeito. Mas como eu era uma simples secretária, voltei a sua mesa, peguei as folhas que eu havia despencado em sua mesa, me virei e saí da sala até a copiadora. Tudo sem nem mesmo olhá-lo. Porém eu podia sentir todo o peso de seu olhar em cima de mim. Antes que eu terminasse de fechar sua porta, ouvi sua risada descrente. Pelo jeito, ele não havia ficado puto com toda a minha displicência e sim achado graça. Qual era a graça, afinal?
Eu saí pisando fundo, e dei uma batida um pouco mais forte, em sua porta, ao sair. Também não podia exagerar, ele era meu chefe, e se eu perdesse aquele emprego não saberia o que fazer.
Ok, eu poderia arranjar um emprego na minha área, contabilidade. Afinal eu era incrível na matemática e teria um salário maior. Poderia até alcançar os meus pais e sua fortuna, me tornar que nem eles. Mas eu os detestava, e não queria me parecer com eles nunca. Eu não queria parecer com eles e nem queria aquele dinheiro deles. Queria vencer com minhas próprias pernas e mostrar a eles que eu tinha valor. Bem, atualmente como secretária executiva eu não estava cumprindo aquela minha exigência, de me tornar uma mestre da contabilidade. Porém, talvez com o tempo.
Enquanto meus sonhos não eram realidade, fui até a copiadora, largar aqueles papéis. Foi quando recebi uma mensagem de Sarah.
Ali, vc pode avisar o Adrian que estou fazendo um exame aqui no Nick? – S.
Ah, merda! Eu havia me esquecido de avisar Adrian sobre ela! Fiquei tão irritada com o comportamento dele que me esqueci completamente disso, e agora ela seria penalizada se, caso, ele passasse por sua mesa e não a visse.
O que eu podia responder pra ela? Afinal, ela não podia ficar nervosa. Sarah nervosa era um problemão. Ela era bem capaz de vir correndo, com o pé machucado, só para não perder o emprego que dependia para aumentar a renda de sua família. Porque ela ajudava tia Celine, sua mãe, a pagar as contas.
Eu era uma jumenta, mesmo!
Não se preocupe, está tudo sob controle. E... como passou a noite, heeeein? ;D – A.
Trocar o foco, isso mesmo. Eu resolveria aquele pequeno deslize numa boa e sua cabecinha ficaria pensando em algo melhor. No caso de Sarah, ela estaria arquitetando uma resposta mal criada e indecente para me dar.
Vai se catar... pra não ser mais grossa e vc se ofender e "esquecer" de avisar Adrian. – S.
HAHAHAHAHA! Sarah e sua enorme sutileza e honestidade. Algo que éramos muito parecidas. Mas, com certeza, ela era mais. Eu ainda tinha certo filtro, dependendo da ocasião, e se eu for ganhar com aquilo. Se não valesse a pena, eu ficava quieta.
Ainda rindo da maneira da minha amiga, fui até a sala de Adrian. Novamente.
- Alice, tem notícias de Sarah? – perguntou ele, quando eu entrei, sem bater.
Ué, eu ainda estava zangada com ele.
- Sim, vim justamente falar sobre isso. Se lembra do assalto ao banco daquele dia?
- O que vocês presenciaram? Sim, lembro. – retorceu o cenho.
- Ontem, depois do expediente, um dos caras a pegou. Mas deu tudo certo – acrescentei em seguida. – Um amigo nosso ajudou e houve polícia e tudo. Não aconteceu nada de mais com ela, só torceu o tornozelo quando caiu no chão. E por isso ela não virá essa manhã. Está fazendo exames.
- Meu Deus! Ela deve estar bem assustada.
- Está. Mas ela é assim, não vai mostrar como verdadeiramente está, principalmente no trabalho. Ela é profissional. Na verdade ela queria ter vindo pra cá, mas o fisioterapeuta exigiu um exame.
- Claro. Claro. Se ela precisar de alguma coisa, basta pedir. – remendou. – Aliás, se ela precisar de uns dias também. Enfim.
Adrian tinha dificuldade de ser amigável, profissionalmente.
- Falarei a ela. Mas se bem a conheço, ela estará aqui à tarde. – e fui me retirando, mas me detive pelo som da sua voz.
- Alice?
- Sim?
- Obrigado.
- De nada. Te aviso quando ela chegar.
- Não. Eu... hum, disse obrigado por ontem. Te devo uma. É sério. – e abaixou a cabeça para a pilha de coisas a sua frente. Sinal de que era minha hora de sair.
Finalmente Adrian havia me dito o que eu queria ouvir. Um legítimo obrigada. Aquilo me bastou, por enquanto.
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Um Brinde a Amizade
Chick-LitVocês conhecem a rua Onze? Não? Sarah, Melissa e Alice conhecem muito bem. Três garotas com histórias diferentes, porém com uma ligação sem igual. Sarah, a revisora, quer terminar a sua faculdade, se dedicar ao seu trabalho na Krathus e seu lema é n...