CAPÍTULO 15

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                 MELINDA OLIVEIRA

Eu nunca fui beijada assim antes, não com tanto desejo e fome. Não quero comparar, mas Ricardo mal me beijava e, quando o fazia, não havia língua. Não era tão erótico e excitante como agora, não a ponto de me fazer querer esfregar as pernas em busca de algo que eu nem sabia o que era.
No início, os toques de Anthony não eram eróticos, mas aos poucos percebi que não era mais possível ser apenas amiga dele, não quando me sentia tão atraída por ele. E depois do beijo, o desejo não cessou. Vi que, mesmo relutante e sem querer tocar meu corpo, ele buscou me ensinar a buscar meu próprio prazer. Sei que é errado, que sou uma mulher casada. Mas não há um pingo de arrependimento circulando em mim. Pelo menos até pensar que ele também tem alguém.
Porque se ele também tiver alguém, ele será igual a Ricardo, e eu serei ainda pior do que já sou.
Lágrimas escorrem dos meus olhos, e ele percebe.
— Eu não tenho ninguém, Melinda.
— Não?
— Não. Estou sozinho há vários meses. Eu disse que iria resolver isso, e estava falando sobre usar minhas mãos.
— Jura?
— Sim.
— Desculpe por ter agido assim. Mas depois de Ricardo, é difícil acreditar nas pessoas.
— Eu entendo. Mas antes de tirar qualquer conclusão, me pergunte, está bem?
— Sim. — Falo, encostando minha cabeça em seu peito, sentindo-me aliviada por ele não ter ninguém esperando por ele em casa. Quem sou eu para exigir algo dele? Estou sendo uma traidora como Ricardo. E essa constatação tem um gosto amargo em minha boca, mas afasto-a para o fundo da minha mente. Se vou pensar nisso, que seja mais tarde, quando estiver sozinha. Agora, tudo que eu quero é me aconchegar nos braços de Anthony e ficar aqui, aninhada a ele. Acho que acabei pegando no sono, pois sinto as mãos dele passando por meu rosto e ele me dá um beijo suave na bochecha.
— Linda, já passa das 3 da manhã. Acho que você deve voltar para casa.
— Nossa, perdi a noção do tempo. Eu amei o nosso momento hoje... e obrigada por... por... — Ele coloca o dedo em meus lábios e me dá um último selinho.
— Cuide-se, Linda. E agora quero mensagens suas três vezes por dia, não apenas duas como costumávamos fazer, está bem?
— Tudo bem. — Eu falo.
— Precisamos criar um código ou algo assim para você me avisar se estiver em perigo, para que eu possa ir até você. Certo?
— Certo. Podemos pensar nisso juntos depois.
— Combinado. — Ele diz, me dando um último selinho e um abraço apertado.
— Cuide-se, Linda. Não deixe ele fazer algo que você não queira. Me ligue, okay?
— Tudo bem, senhor preocupado. — Eu falo sorrindo.
— Agora vá, Linda. — Ele diz, me olhando de forma insegura.
— O que foi?
— Eu não confio nos seus pais. Se eles apoiam o que aquele homem faz com você, é porque são iguais a ele. Desculpe, sei que são seus pais, mas é o que eu acho.
— Eu sei disso, às vezes também fico revoltada.
— Promete me manter informado?
— Sim.
— Tudo bem então. Vá, e quando estiver segura no seu quarto, me mande uma mensagem para que eu vá embora, okay?
— Está bem.
— Vou ficar esperando aqui. — E assim eu deixo o carro dele, com uma parte de mim ficando ali com ele.
Quando chego em meu quarto são e salva, mando uma mensagem para ele. Assim que vejo seu carro desaparecer na estrada ao longe, tranco meu quarto e deito em minha cama, adormecendo logo em seguida, suspirando de contentamento.
Sem saber que minha felicidade duraria muito pouco.

                DIA SEGUINTE

Acordei com alguém batendo na porta do meu quarto. Levo um tempo para me situar.
— Abra a porta, Melinda. Já passa das 8:00 da manhã e estão ficando preocupados com você. — Ouço a voz da dona Rosa.
Levanto-me e visto um roupão por cima da minha camisola, em seguida, abro a porta.
— Desculpe-me, dona Rosa, acho que dormi demais. — Ela entra no meu quarto e me puxa.
— Seu marido está furioso, Melinda. Sua expressão de medo me deixa assustada.
— Por... por quê?
— Ele ligou as câmeras e não teve acesso à do seu quarto. E pense num homem furioso. — Eu me sento e passo as mãos pelos cabelos. Rosa percebe meu estado e senta-se ao meu lado.
— Você quebrou a câmera, Melinda?
— Não exatamente, Rosa. Eu meio que puxei um fiozinho e a desliguei.
— E você sabe ligá-la novamente?
— Não sei se consigo, Rosa.
— Pois trate de tentar, porque do jeito que o senhor Ricardo está, ele pode aparecer aqui por causa dessa câmera, e não queremos isso, não é mesmo? — Eu nego com a cabeça.
— Pois então. Vou voltar para a cozinha e deixar você tentando encontrar uma forma de arrumar essa câmera.
— Certo, Rosa. — Quando ela sai, eu tranco minha porta e pego meu celular.
Há três chamadas perdidas de Anthony. Eu retorno a ligação, e ele atende no segundo toque.
— Bom dia, Anthony.
— Bom dia, Melinda. Já estava ficando preocupado com seu sumiço. Está tudo bem por aí?
— Mais ou menos.
— O que houve? Precisa de mim?
— Eu puxei um fio que tinha da câmera do meu quarto, para ter mais privacidade.
— Certo. E o que aconteceu?
— Ricardo resolveu ligar as câmeras, já que meus pais tiveram que fazer uma pequena viagem para o Espírito Santo.
— E por que você não encaixa o fio novamente?
— Mas isso é um abuso, Anthony! Como vou falar com você? — Pergunto indignada.
— Existem câmeras no banheiro?
— Não que eu saiba.
— Eu quero que você vá ao banheiro e faça uma verificação minuciosa, procurando por qualquer possível ponto para uma câmera. — Ele me instrui.
— Não entendo onde você quer chegar com essas suas conjecturas.
— Acompanhe meu raciocínio, Linda. Caso haja alguma câmera em algum ponto do banheiro, você pode tentar fazer algo para destruí-la. E quando precisar falar comigo, você pode me ligar de lá. Ou, se não, em algum dos quartos de hóspedes. Não creio que ele seja pervertido a ponto de colocar câmeras em um quarto de visitas.
— Ah! Agora entendi. Obrigado por pensar por nós dois, Anthony. — Suspiro aliviada por ele estar disposto a resolver pelo menos uma parte dos meus problemas.
— Sempre. Dormiu depois que chegou em casa? — A pergunta é feita quase num sussurro, como se fosse um segredo compartilhado apenas entre nós dois. Nosso pecado.
— Sim. Dormi tão relaxadamente que acordei agora com a Rosa me chamando.
— Fico feliz em saber que dormiu bem, Linda.
— E você... você dormiu? — Pergunto em sussurro, sentindo minhas mãos tremerem de ansiedade e algo como um desejo de vê-lo.
— Eu até tentei dormir, Linda. Mas pensar no que aconteceu entre nós dois no meu carro não me deixou dormir. — Ele confessa baixinho e solta um suspiro longo.
— Você se arrependeu, Anthony? Se arrependeu dos nossos beijos? — Pergunto, mesmo temendo sua resposta.
— Nem por um momento, Melinda. Nem por um segundo sequer eu me arrependi. Mesmo sendo extremamente errado, indo contra tudo que acredito e sigo, não consigo me arrepender. Acho que nem se eu quisesse, poderia. — Ele fala, e eu solto o ar que estava segurando, me sentindo calma e com o coração batendo um pouco mais forte.
— Também não me arrependo, Anthony. Foi a primeira vez em anos, ou talvez em toda a minha vida, que fui feliz, que me senti livre. Me senti eu mesma em seus braços. Amei cada minuto que passei com você, mesmo que seja visto como errado aos olhos das pessoas. — Desabafo.
— Queria tanto ter te conhecido uns três anos atrás. — Falo, me deitando na cama e olhando para o teto, pensando no homem que aos poucos está ganhando não só minha confiança, mas também meu coração, algo que achei que não restava mais nada.
— Eu espero que juntos consigamos encontrar uma maneira de tirá-la dessa prisão, Melinda. Mas até lá, não deixe que ele perceba que você... que você tenha alguém que te ajude. Tenha um cuidado redobrado em tudo o que fizer, para não se expor. Todo cuidado é pouco com uma pessoa como Ricardo. Homens como ele nunca jogam limpo.
— Você tem razão, Anthony.
— Não digo por mal, mas sim porque estou a 40 minutos de distância, e quando alguém está no seu pior, segundos podem ser... — Ele não termina a frase, mas o que dá a entender me deixa aterrorizada.
— Mas estou sempre aqui para você. Nunca vou soltar sua mão, e juntos vamos encontrar um meio para você sair desse suplício.
— Obrigada, Anthony. — Ele está mais sério do que antes, mais fechado de uma forma mais formal, e tenho medo de que, lá no fundo, ele tenha se arrependido e não tenha dito para não me deixar mal.
— Vou desligar para que você resolva a questão da câmera. Ligue-a, mas só depois da vistoria no banheiro. E só lá você fala comigo, ok?
— Sim.
— Tenha um belo dia, Melinda. Esperarei notícias suas ao meio-dia.
— Certo, tchau Anthony.

Desligamos, e eu corro para o banheiro, verificando cada cantinho, mas não encontro nenhum ponto ou câmera. Respiro aliviada.

EU: Não encontrei nada no banheiro.

Envio a mensagem para Anthony. Volto para o quarto e, respirando fundo, subo na minha poltrona e conecto novamente o fio que liga a câmera. Vejo a luz verde se acender e sei que ele está vendo tudo agora. Estou em um ponto cego, tento não chamar atenção, desço lentamente da poltrona e saio do quarto. A câmera está direcionada para o banheiro e para a minha cama. Sim, ele é pervertido.

Chego na cozinha e vejo dona Rosa preparando o almoço.
— Quer ajuda, Dona Rosa?
— Não, Melinda, ainda tenho tempo para o almoço. Você não vai tomar seu café?
— Vou sim. — Me sento na cadeira da ilha e me sirvo com café e uma torrada que Rosa preparou.
Quando sabemos que a câmera está ligada, agimos como robôs. Eu termino o café, lavo minha caneca e começo a tirar a poeira dos móveis da sala, depois passo o pano, e assim passo toda a manhã.

Almoço depois do meio-dia. Já havia enviado uma mensagem para Anthony, e agora que tirei alguns minutos para mim, sigo para a biblioteca, sento na poltrona e fico ali encolhida, pensando na merda que é viver nessa prisão. O telefone da biblioteca toca. Não me animo a atender, mas minutos depois ouço os passos de Rosa. Ela bate na porta da biblioteca e entra.
— Seu marido está ligando e gostaria de falar com você.
— Entendi, Rosa. Vou atendê-lo. — Ela balança a cabeça e sai da biblioteca. Eu pego o telefone e ouço sua voz.
— Está me evitando, esposa?
— Não, Ricardo.
— Então, por que não atendeu?
— Estava ocupada.
— Entendo, ocupada sentada na poltrona da biblioteca olhando para o nada.
— Me desculpe.
— Certo. Essa manhã fui surpreendido com a câmera do seu quarto desligada. Pode me explicar o porquê?
— Quando fui limpar a poeira e teias de aranha, posso ter esbarrado no conector.
— Você está me dizendo que foi acidental?
— Totalmente.
— E você espera que eu acredite nisso?
— Espero sim.
— Não sou ingênuo, Melinda. Se eu pelo menos descobrir que está aprontando... — eu fico quieta, ameaças e ameaças, e só o que ele tem para oferecer.
— Não estou.
— Seus pais tiveram um imprevisto, e o retorno deles foi adiado por alguns dias. Diante disso, as câmeras continuaram ligadas até o retorno deles ou o meu. Preciso proteger você. — Me pergunto quem me protege dele.
— Quando eles vão voltar?
— Não disseram. — Eu penso se foi ele que mandou eles irem embora.
— Tenho que desligar, tenho muito trabalho. E espero que me atenda da próxima vez.
— Sim. — Ele desligou, e eu fico desolada. Estar aqui sozinha e sendo vigiada como um rato de laboratório me deixa doente.

O dia passou lentamente, foi triste e deprimente. Quando chegou a noite, apenas mandei uma mensagem de boa noite para Anthony, não estava no meu melhor para uma ligação. Quando me deitei cedo, fiquei rolando na cama e nada de pegar no sono. Horas depois, resolvo ir à cozinha tomar um copo de leite para ver se o sono voltava. Ficar em uma casa tão grande sozinha é assustador e deprimente. Às vezes, penso que ele faz de propósito, gosta de me ver triste, acuada, gosta do meu sofrimento.
Depois de arrumar o leite, entro em um dos quartos de hóspedes e faço algo impensável: ligo para Anthony. No primeiro toque, ele atende.

— Está com algum problema, Linda?
— Não, apenas me sentindo sozinha.
— Seus pais ainda não chegaram?
— Desconfio que Ricardo os tenha mandado embora.
— Por que ele faria isso?
— Para me ver sofrendo e me deixar sozinha. É muito ruim ficar sozinha nessa casa enorme, Anthony. Às vezes, tenho medo e começo a sentir que o ar está escasso. Sinto fadiga e é angustiante.
— Onde você está?
— Em um dos quartos de hóspedes.
— Certo, deite um pouco. Relaxe, imagine que estou aí com você.
— Aqui?
— Sim, feche os olhos e concentre-se apenas no som da minha voz. Imagine que estou deitado ao seu lado... — Ele fica em silêncio por alguns minutos.
— Imaginou?
— Sim.
— Funcionou? Você está se sentindo melhor?
— Um pouco. Você estava dormindo?
— Sim, depois que você me mandou aquela mensagem, eu me deitei.
— Desculpe por te acordar.
— Saiba que estou à sua disposição, tudo bem? Eu prometi que não a deixaria sozinha. — Ele fala, e eu fico em silêncio.
— Dormiu, Melinda?
— Não. — Sussurro.
— Então, o que houve?
— Nada, não. — Digo, soltando um suspiro. — Acho que vou voltar para o quarto, Anthony. Obrigada por tudo.

Eu desligo na cara dele e então começo a chorar. Não quero a piedade de Anthony, não quero que ninguém me ajude por obrigação. Sei que minha vida é uma merda, mas essa merda é só minha.
Acabo dormindo aqui no quarto, e as consequências desse ato impensado foram terríveis.

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