CAPÍTULO 14

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                  ANTHONY FERRAZ

Eu não sou uma pessoa que costuma falar palavrões, e raramente, ou quase nunca, fui ensinado a não dizer nada que desrespeite o próximo. Segui isso à risca, pois minha mãe é uma pessoa maravilhosa e muito sábia, que sempre me aconselhou. Devo muito a ela por ser quem sou hoje.

Mas pensar em tudo o que aquele verme faz com a Melinda, uma menina tão doce, que vive em um casamento tóxico, é o suficiente para deixar até o mais santo dos homens furioso e com desejo de vingança.

— O Ricardo me ligou para dizer que estava com saudades e que ia ligar a câmera para me ver amanhã, já que meus pais vão sair. Ele também disse que ficaria mais alguns dias onde ele está, mas nem sei onde é. — Eu andei pesquisando e descobri que ele pegou um caso de um político em BH. Parece que levou a ex-esposa junto. Enquanto a esposa dele está em casa, não entendo isso. Às vezes, tenho vontade de mostrar à Melinda como um homem de verdade trata uma mulher, dando a ela todo o amor e carinho que tenho a oferecer, para que ela nunca mais aceite migalhas de pessoas doentes mentais como o marido dela, pois só pode ser isso, não tem capacidade.

— Eu ouvi quando a Susana chamou ele para tomar banho de banheira. E ele ainda teve a coragem de agir como se fosse normal e dizer que estava falando comigo. — Eu a ouço chorar baixinho, e isso me deixa furioso.

— Você ama o Ricardo, Melinda? — Será que mesmo depois de tudo isso, ela ainda tem sentimentos por ele?

— Não... — Ela fica alguns minutos calada, e quando acho que ela não vai dizer mais nada, ela começa a contar.

— Já tem alguns meses que a gente não é mais um casal... A gente... hum... nem dormíamos mais juntos... Eu apenas sou a esposa troféu dele. — Essa confissão dela me deixa atônito. Eu achava que, caramba, a Melinda é muito linda, quem em sã consciência não gostaria daquele corpo ao lado do seu? No dia em que cometi a loucura de passar os dedos perto da sua boca gostosa, fiquei excitado só por sentir a suavidade, e como desejei beijá-la. Mas me recompus, ela é uma mulher casada, nunca, jamais a exporia assim. Mas se eu disser que não a desejo, estaria mentindo. Mesmo sendo uma mulher casada, Linda tem uma inocência no olhar que me enlouquece. Sempre tenho que me lembrar do seu status para não cometer um erro enorme.

— E por que você ainda está com ele, Melinda? — Pergunto, querendo saber por que ela não o deixou, por que aceita as traições. Ela fica em silêncio.

— Me diga, Linda, por que aceita as traições? Por que não o deixa? E por que não pede o divórcio? — Ela começa a chorar e a soluçar baixinho, e isso parte meu coração.
— Não chore, Linda. Assim você me deixa mal, não quero te ver chorando. Todas as emoções que você sente me afetam de uma maneira que nem eu mesmo compreendo. — Sento na cadeira da ilha e passo a mão pelo meu cabelo.
— Respire fundo e conte até 5. — Digo, e acho que ela não vai fazer, mas ela segue o que eu digo, e aos poucos vejo que ela vai se acalmando.
— Eu não posso deixá-lo... Já tentei algumas vezes... Mas nunca deu certo e sempre fica ainda pior. Na última vez, ele me prendeu no celeiro. — Me levanto rápido demais e a cadeira em que estava sentado cai para trás.
— Esse asqueroso sórdido fez o quê? Por que você não me contou isso, Linda?
— Foi antes dele viajar. — Ela para e parece tentar parar de chorar, e quando parece estar melhor, ela continua.
— Ele chegou em casa de manhã, cheirando a bebida e a outra mulher, e eu pedi o divórcio. Então, ele me trancou no celeiro. Fiquei lá metade do dia e a noite toda. Meus pais chegaram lá e eu já não sabia mais de nada. Eu tenho fobia de insetos e aranhas, e estar naquele lugar me deixou traumatizada. — Me sento novamente e respiro fundo para não xingar ou gritar, pois assustar Melinda não é o que ela precisa agora, não precisa de outro homem descontrolado que não a respeite. Quando estou calmo o bastante, começo a falar.
— Ele já fez isso com você outras vezes?
— Sim, mas ele nunca me deixou no escuro. Ele me prendia às correntes, mas a luz ficava acesa, e o celeiro não era tão sujo. Só que dessa vez eu fiquei no escuro, com insetos por toda parte, e ele trancou a porta com correntes. Foi horrível, Anthony.
— Isso é muito grave, Linda. Você precisa denunciar seu marido.
— Eu não posso, Anthony.
— E por que não, Linda? Eu prometo a você que se você denunciar, terá toda a assistência e ajuda que necessita. Posso arrumar um apartamento para você, para tirá-la daí, contratar os melhores advogados, tudo para que esse ser repugnante não chegue perto de você. Basta me dizer uma única palavra, Linda, e irei buscá-la agora mesmo. Você terá toda a proteção necessária. Um homem como Ricardo tem que responder na justiça por seus crimes, porque isso é um crime, é uma barbaridade, é cárcere privado, é uma coisa monstruosa. Deixe-me cuidar de você, Melinda. Eu tenho coragem de mover céu e terra para protegê-la, para que ninguém mais a machuque.
— Não posso, Anthony... — Ela diz, abafando o choro. Seu sofrimento me dilacera, queria tanto estar perto dela e abraçá-la. — Por que não? — Pergunto, já sem paciência. Eu prometi a ela que teria minha proteção. O que temer?
— Meus pais... eles... eles... fizeram algo muito grave, e estão nas mãos do Ricardo. Ele os ameaçou, dizendo que se eu o deixar, ele entregará as provas e meus pais serão presos. — Esse relato dela me deixa enfurecido. Como ela pode se sacrificar assim pelos erros dos pais? Esses problemas não são dela.
— Mas, Linda, esse problema não é seu. Você não precisa pagar por algo que seus pais fizeram. Isso não é justo.
— Estou tão cansada, Anthony. Cansada de ter que carregar todos os problemas nas minhas costas, de ter que suportar as humilhações e agressões de Ricardo por causa dos meus pais. Eu não mereço isso. — Num ato de desespero, pego as chaves do meu carro e saio do meu apartamento.
— Linda, tem como você sair de casa sem que seus pais vejam?
— Não sei, por quê? Eu não posso ir embora, Anthony. Eu não posso fazer isso com meus pais. — Ela diz chorosa.
— Vou até aí te ver, Linda. Não vou conseguir dormir sabendo que você está tão triste assim, especialmente depois de saber o que você passou todo esse tempo. Estou a caminho. Veja se consegue sair de casa, e se puder, me espere na estrada daqui a 30 minutos. — Eu falo e já estou saindo com meu carro, indo em direção à casa dela.

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