MELINDA OLIVEIRA
Anthony mantém a calma e olha para o lado. Sigo seu olhar e vejo que é Dona Rosa. Ela insiste em bater no vidro do carro. Sei que ela sabe que estou aqui. Olho para o relógio e já são 07:00 da manhã. Olho para Anthony e peço que ele se acalme.
— Tenho que falar com ela, Anthony. Ela não vai falar nada para o Ricardo.
— Como pode saber, Melinda? Eu não confiaria.
— Ela sempre me apoiou quando Ricardo estava me batendo ou quando ele fazia alguma maldade para mim. Acho que podemos confiar nela.
— Não acho que isso seja possível, Melinda, e é muito arriscado confiar em alguém que trabalha para o Ricardo. — Ele fala, mas Dona Rosa não vai embora. Continua batendo no vidro do carro e parece estar desesperada.
— Tenho que ver o que é, Anthony. Pode ser algo sobre o Ricardo.
— Tudo bem. Mas me prometa que, se você vir que ela vai falar alguma coisa, me chama, que eu vou buscar você e te levar embora comigo, ok?
— Tudo bem, eu prometo. — Com muito custo, ele me deixa sair do carro. Abro a porta do passageiro e deixo-a aberta para que Anthony possa ouvir o que será falado.
Quando Rosa me vê, ela corre até mim e me abraça. Vejo lágrimas em seus olhos.
— O que houve, Dona Rosa? Por que está chorando? — Ela continua chorando e não consegue falar, e isso está me deixando em pânico.
A chuva e o vento de ontem derrubaram algumas árvores. Tem muito barro por toda a estrada, e o tempo ainda está meio fechado.
— A energia voltou. — Ela diz, e meu mundo parece que vai desabar. Quase caio no chão, mas não sei como Anthony me pega em seus braços, me aparando. Um soluço escapa dos meus lábios. Um soluço de pânico.
— Ah, Dona Rosa... — Lamento, e então Anthony me traz para seu peito, me acolhendo em seu abraço. Mas, diferente das outras vezes, dessa vez não sinto paz. O pânico já se instalou dentro de mim.
— Acalme-se, Melinda. Respire, puxe o ar e depois solte lentamente. Se você tiver uma crise de pânico agora, só vai piorar a situação. — Faço o que ele pede, não estou aguentando ficar de pé. Ele me ampara em seus braços e beija meus cabelos. Dona Rosa olha estranho para nós dois, mas não fala nada. Fico com medo, mas Anthony não me deixa afastar dele. Quando estou um pouco melhor, ele olha em meu rosto.
— Está melhor? — Eu confirmo com a cabeça.
— Ricardo ligou, Dona Rosa? — Pergunto à senhorinha que ainda está com uma expressão de reprovação. — Eu não sei. Eu não entrei dentro da sua casa ainda. — Ela fala em um tom um pouco enraivecido. Um alerta soa no olhar de Anthony, e eu também fico em alerta. Ele me solta e sai com o celular em mãos.
— Como vamos fazer, Dona Rosa? — Pergunto a ela, que olha para minhas roupas. Estou com roupas comuns, não tomei banho para dormir por causa da chuva.
— Você está dormindo com esse homem, Melinda? — Ela indaga em tom acusador.
— Não, Dona Rosa. Eu não estou dormindo com ele. — Ela olha para mim com desconfiança.
— E o que ele faz aqui então? — Sua pergunta me deixa atordoada. Ela vai dificultar minha vida.
— Quando acabou a energia, entrei em pânico, e ele veio ao meu socorro.
— Hum. — Sua resposta é virar o rosto.
— Vou entrar na sua casa e ver se as câmeras estão ligadas. Talvez, por sorte, a internet não tenha voltado. — Ela sai. Já era para eu ter voado para dentro de casa, mas o medo de Ricardo ter dado falta de mim e já estar tramando minha morte me paralisa. Eu sei que Anthony me defenderia e que estaria segura com ele. Meu celular toca. São meus pais. Eu atendo.
— Oi, mamãe.
— Mamãe? Você faz suas merdas e coloca todos em problemas. Como pode, Melinda? — Olho para Anthony, e ele está constrangido.
— Não entendo, mãe.
— Um helicóptero está vindo aqui nos buscar. Acho que isso diz tudo, não é mesmo? — Olho para Anthony, buscando explicações.
— Se você estiver traindo seu marido, eu mesmo vou te espancar, maldita. — Antes que eu possa responder, Anthony pega o celular da minha mão.
— Senhora Cássia, se eu fosse a senhora, não ameaçaria Melinda. Creio que não estão no melhor momento de vocês. — Ouço minha mãe esbravejar alguma coisa.
— Bem melhor assim. O helicóptero já está à espera. Eu aconselho que vocês andem rápido, ou eu levarei Melinda comigo. — Ele não espera eles falarem nada e desliga.
— Como conseguiu o telefone dos meus pais?
— Tenho meus contatos, Melinda. E como suspeitava, não se pode confiar em Rosa. Ela agiu muito estranho com você. Teremos que correr contra o tempo agora, Melinda.
— Como assim? Não estou entendendo.
— Eu vou tirar você das garras de Ricardo antes do previsto. Com esse nosso deslize, ele pode já estar sabendo que você esteve comigo. E infelizmente, ele não vai acreditar que eu não toquei em você. E para mim, pode não resultar em nada, já que o poder que possuo é bem maior do que ele imagina. Mas com você vivendo sob o mesmo teto que ele, pode acabar comigo. — Ele diz me olhando docemente.
— Mas e quanto aos meus pais?
— Estou resolvendo isso. Por você, Linda, vou fazer tudo por você. — Eu o abraço.
— Obrigada, Anthony. Muito obrigada mesmo. — Ele beija meus cabelos.
— Eu pedi a um conhecido para hackear as câmeras de segurança da sua casa. Vai demorar algumas horas, mas creio que ele consiga. Você só terá que segurar a boca da tal Rosa. — Ele aponta para a casa com a cabeça, e vejo que ela está voltando.
— Certo.
— Tome muito cuidado, Melinda. Eu estarei monitorando as câmeras também quando conseguirmos acesso, apenas por proteção, ok?
— Sim. Obrigada, Anthony. Não sei o que seria de mim se você não estivesse do meu lado.
— Nada vai acontecer a você. Eu estarei sempre um passo à frente dele, Linda. E os seus dias vivendo nessa casa estão contados. E é isso que você quer, certo?
— Tudo que mais desejo na vida. — Paramos de falar quando Rosa está bem próxima. Ela está com uma expressão um pouco melhor, mas não me engana. Ela pode fazer minha vida um inferno.
— Eu conferi as câmeras, e parecem estar funcionando. Não sei ao certo, mas a internet ainda não voltou. — Eu olho para Anthony, que confirma com a cabeça.
— Dona Rosa, eu só vim cuidar de Melinda. Por causa da chuva e, já que a senhora chegou, vou deixá-la em suas mãos. — Ele vira para mim, mas está distante, agindo como um desconhecido. — Fique bem, Melinda.
— Obrigada, Anthony. — Ele então olha mais uma vez para mim, e sai com seu carro.
Um pedaço do meu coração vai com ele, e o outro fica em frangalhos.
— Vamos, menina, vamos para dentro. — Não tendo escolhas, eu sigo Rosa de volta para casa. Eu errei ao adormecer nos braços de Anthony, e isso pode causar minha morte. Faço uma oração silenciosa, pedindo a misericórdia e compaixão de Deus.
Vou direto para a escada e subo para o meu quarto. Tomo um banho e me visto com um vestido preto, refletindo meu humor do dia. Negro, assim como o tempo escuro e minha alma agitada.
Passo o resto da manhã trancada dentro do quarto. Não consigo dormir e nem tenho apetite para comer. Às vezes, sento perto da janela e olho para fora; em outros momentos, deito na cama ou na poltrona. Quando sinto fome e não posso mais evitar, desço as escadas e vou em direção à cozinha. Procuro por algo para comer, mas Rosa não fez nada. Essa constatação só reforça o que Anthony temia: ela será um problema.
Pego um pão da sacola, passo margarina e tomo com o suco que encontrei na geladeira. Já passava do meio-dia e percebo que ela não fará o almoço. Sendo assim, resolvo fazer o almoço sozinha. Eu sei cozinhar e não dependo dela para preparar minha comida. Ela sumiu e não sei para onde foi.
Depois de terminar o almoço, sento-me na ilha da cozinha e almoço sozinha. Agora que está feito, não adianta chorar. Tenho que enfrentar as consequências. Mas não me arrependo e nem culpo Anthony. Eu quis estar com ele, e faria novamente.
À medida que as horas passam e não tenho notícias de Ricardo, e meus pais não aparecem, começo a ficar agoniada. Ando de um lado para o outro, e como está tudo muito calmo e silencioso, decido arriscar e saio para o jardim. Preciso me acalmar. Se Ricardo não viu nada pelas câmeras, pode perceber minhas ações estranhas.
Cada vez que ouvia o som de um carro passando na estrada, eu me assustava. Quando um carro se aproximou, comecei a hiperventilar. Mas saiu de lá um funcionário da companhia de Internet e entrou na casa, aparentemente conversando com alguém. Imagino que seja Ricardo. Continuei onde estava e não vi quando ele saiu da casa.
Meus pais chegaram há pouco. Minha mãe estava com uma expressão tão severa que faria qualquer um correr dela, e meu pai estava impassível. Mas não se engane, ele está furioso. Nenhum deles dirigiu uma palavra sequer a mim. Foram entrando e subindo as escadas. Eu me sentei no sofá e esperei que descessem.
Quando minha mãe se aproximou, eu me levantei.
— Ben... — minha mãe desferiu um tapa tão forte em meu rosto que cheguei a cambalear para trás. Sentei-me novamente no sofá, mas não permiti que lágrimas surgissem nos meus olhos. Para não faltar com o respeito, continuei com o rosto voltado para baixo.
— Você é uma vergonha para nós, Melinda. Eu julgava que tinha criado uma mulher de caráter, conservadora, que iria me trazer orgulho. Mas vejo que você se transformou em uma prostituta. — ela esbravejou essas palavras em quase um sussurro.
— Se Ricardo sequer sonha que você se tornou uma vagabunda, ele vai arrancar sangue de você. E não pense que terei pena. Você merecerá cada golpe que ele der. — ela saiu da sala acompanhada do meu pai. Tive vontade de correr, mas para onde iria? Não posso me esconder dos olhos de Ricardo. Fiquei ali sentada, segurando o choro, repetindo para mim mesma que não vou chorar.
O resto do dia passou lentamente. Não desci para jantar. Tranquei-me no meu quarto e lá fiquei.
Anthony não me enviou nenhuma mensagem, e isso só piora meu estado de aflição. Sinto-me exposta e temo sofrer um ataque a qualquer momento, sem ter ideia de onde virá.
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Um Anjo Na Escuridão
RomanceMelinda Oliveira, de 20 anos, é uma jovem doce presa em um casamento fadado ao fracasso com um homem 20 anos mais velho, que tem prazer em humilhá-la e fazê-la chorar. Melinda faz de tudo para ser uma boa esposa, sonhando em encontrar a aprovação do...