capítulo 3

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           MELINDA OLIVEIRA

                DIA SEGUINTE

No dia seguinte, foi a vez do buffet organizar tudo e eu apenas prestei a assistência necessária. Minha tia e irmã estavam comigo, e às vezes Ricardo olhava para mim com reprovação, então eu prontamente desviava o olhar e continuei fazendo isso durante o dia.

À noite, chegou a hora da recepção. Ricardo havia conquistado um caso muito importante de um senhor rico chamado Dimas, e ele estava comemorando. Ele disse que o senhor estaria presente na recepção.

Depois de me arrumar, me dei por satisfeita. Estou usando um vestido azul de renda e me sinto bonita. Meus cabelos estão soltos, e passei um pouco de batom, acho que fiquei linda. Não percebi que meu marido estava me observando da porta do meu quarto, que eu tinha esquecido aberta.

— Você está muito bonita. — ele disse, e eu sorrio porque ele me notou, estou sentindo um pouco de orgulho.

— Obrigada, amor. — digo sorrindo para ele, que se aproxima de mim com passos firmes e aperta meu braço.

— Comporte-se como uma mulher casada e não como a vadia que sei que você quer ser. — ele fala, apertando ainda mais meu braço, fazendo doer.

— Ricardo... Ricardo, você está me machucando... — falo implorando para que ele me solte com o olhar.

— Essa é a intenção. Não poderei dar atenção a você esta noite, então esposa, saiba o seu lugar ou terei que puni-la. — ele fala enquanto retira o meu batom com os dedos de forma grosseira, esfregando os dedos com força em minha boca.

— E limpe essa coisa da sua boca. Você não é uma puta, e minha mulher não usa coisas de vagabunda. — ele fala enquanto solta meu braço com um puxão, me jogando no chão. Fico caída lá, com os olhos nadando em lágrimas, e ele parece gostar disso, pois dá um sorriso cruel. Isso embrulha meu estômago.

— Arrume-se, esposa. Não quero que saia por aí toda amassada e com essa expressão de sofrimento. Recomponha-se rapidamente. — e ele sai sem olhar para trás ou me ajudar a levantar, me deixando ali abatida e triste.

Minha vontade é voltar para a cama e me deitar em posição fetal, e nunca mais sair de lá. Olho para o espelho e aquela pessoa confiante que estava se sentindo feliz e linda não existe mais. Sempre que ele está por perto, ele consegue apagar o meu brilho e me leva de volta ao lugar de onde sempre tento sair, para um buraco, para a bagunça na qual luto tanto para não me afundar. Por que isso acontece? Por que sofro assim? Quando serei feliz sem alguém me colocando para baixo?

Olho para o espelho e vejo meu reflexo, não me reconhecendo. Tenho 20 anos, mas aparento ter mais.
— Oh, meu amor, aí está você. — diz minha tia, me abraçando, e eu choro em seu ombro.
— O que aquele monstro fez com você, Linda? — mostro a ela meu braço e ela vê a marca dos dedos dele, e fica horrorizada.
— Você não pode aceitar isso, Linda. Você tem que denunciá-lo, ele vai acabar fazendo o pior com você.
— Você sabe que não posso, tia. Se eu não ficar com ele, meus pais... — eu falo chorando ainda mais, por ter que me sacrificar por eles.
— Você sabe que você não é obrigada, Linda.
— Eu sei, tia, mas como ficaria minha consciência se algo acontecesse com eles? — falo me sentando de volta junto à penteadeira, para tirar o batom borrado e arrumar meu cabelo novamente.
— E se algo acontecer com você, Linda?
— Ricardo é um covarde, tia. Ele não me bate assim, ele vem com ameaças, algumas vezes com alguns puxões de cabelo, alguns apertos no braço, coisas que não me permitem ir para a polícia. Não sem provas, e a senhora sabe que ele é um advogado renomado, com a reputação de homem de respeito e da lei que ele tem. Quem acreditaria em mim, hum?
— E isso não dá direito a ele de te agredir, Linda. Agressão é agressão, mesmo que seja um puxão de cabelo ou esses hematomas em seu braço. Não é aceitável, Linda. Mulher não nasceu para isso.
— Eu sei, tia, mas até ter provas suficientes, não posso fazer nada. — dou de ombros, já mais calma, e começo a tirar o batom.
— Você pode até tirar, mas vai aplicar novamente.
— Ricardo não gosta de batom. — falo olhando para ela.
— Que se exploda que ele não gosta. Você gosta e vai usar. Não deixe ninguém ditar o que você vai ou não usar, não é assim, Linda. Se você ceder poder a ele uma vez, ele sempre fará pior. Se imponha onde der para se impor. — ela diz procurando um batom em sua bolsa e me entrega um nude. Sorrio para ela e aplico o batom, que mais parece um gloss labial.
— Obrigada, tia.
— Agora sim, Linda. Uma bonequinha, minha bonequinha. Você é uma princesa, Linda, a minha princesa. — minha tia às vezes parece mais minha mãe do que a minha própria.
— Obrigada por sempre estar do meu lado, tia. — Falo a abraçando.
— Sempre, Linda. Pode contar comigo para sempre. — fala ela quase chorando.
— Agora vamos à festa. Você precisa se divertir um pouco. — e então seguimos juntas para as escadas. Quando chegamos ao hall de entrada, várias pessoas já circulavam pela casa. Tia Carla teve que ir à procura do marido, e eu aproveitei para ir à cozinha.
Eu me entretive ajudando a Rosa, colocando água nos copinhos que ficam na ilha da cozinha para quem quiser tomar. Mas fiquei ali mais porque não queria me misturar do que para ajudar, não me sinto bem no meio dos convidados de Ricardo.
— Você está muito bonita hoje, Linda. — diz Rosa.
— Obrigada, Dona Rosa.
— Por essa razão, seu lugar não é aqui na cozinha e sim lá fora, junto com as outras pessoas.
— Não sei se devo, Rosa. E o dia dele hoje.
— Deve sim, Linda. Aproveita que ele não pode te dominar na presença de toda essa gente e vai ser feliz. Vai respirar um pouco de ar puro, conversar com as pessoas ou ficar perto de sua tia e irmã. Só aproveite, menina, para sair dessa prisão. Vai logo, anda. — ela diz fazendo sinal com as mãos para eu sair da cozinha. Eu sorrio para ela, porque ela está certa. Ricardo não vai poder me controlar.
— Obrigada, Rosa. — eu saio da cozinha saltitante quando esbarro com Susana.
— Olha por onde anda, Linda, pode causar um acidente. — ela fala com voz entediada.
— Me desculpe, Susana. — digo entre os dentes.
— Sabe me dizer onde está o Rick? — Ela pergunta com tanta intimidade que me enoja.
— Eu acredito que meu marido esteja na sala de jantar. — falo "marido" para ver se ela enxerga que sou a esposa dele agora.
— Ah, que gracinha! — ela diz e dá uma gargalhada.
— Qual é a graça, Susana? — pergunto confusa.
— Você é tão ingênua, Melinda, que tenho pena. — ela diz fingindo olhar para suas unhas entediada.
— Pelo que?
— Você fica querendo marcar território. Pena que nós duas sabemos quem vai esquentar a cama dele mais tarde. E não será você, querida. — ela tira um pelo invisível da sua roupa e olha para mim com uma falsa simpatia. Eu não me deixo abater perto dela, me obrigo a usar uma expressão neutra, mesmo que por dentro esteja me sentindo destruída.
— E obrigada por me informar o paradeiro do Rick, tenho algumas pendências com ele. — ela fala com aqueles lábios vermelhos maldosos.
Ele ainda fala que não gosta de batom, mas a ex dele gosta. Ela sai rebolando em um vestido curto vermelho agarrado ao corpo dela como uma segunda pele. Não entendo como, mesmo depois de casado comigo, Ricardo tenha amizade com sua ex-mulher, e se o que ela disse for verdade, eles têm mais do que uma amizade. Ricardo não seria capaz de me trair com ela, não é mesmo?
E dizem as más línguas que eles se separaram por causa de uma traição, agora vai saber de qual dos dois lados.
Saio dos meus devaneios e vou para fora, começando a conversar com algumas mulheres que vieram acompanhar seus maridos. A conversa é agradável e, com isso, a noite vai passando.

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