MAITÊ
Nada mais fazia sentindo para mim, a não ser nossa pequena Valentina, que crescia cada dia que passava.
Nesse tempo, conhecemos um colega novo que começou a estudar com João, o nome dele era Lucca, conhecemos sua história de vida e entendo perfeitamente como é doloroso passar por esse processo de luto, como ele estava passando por ter perdido sua mãe há alguns dias.
– Oi? Posso me sentar com você?Desviei meu olhar e o encontrei parado em frente a cadeira vazia.
– Ah claro!
Apontei para a cadeira, o mesmo puxou e se sentou.
– O que faz aqui numa hora dessas?
– Eu estou estudando, andei perdendo um mês de aula, e sou bolsista, preciso recuperar.
– Ah!
Ele assentiu com a cabeça, apoiou seus cotovelos na mesa e entrelaçou seus dedos, os mexendo, olhando para os lados, parecendo perdido.
– Está tudo bem?
Seu olhar voltou para o meu e rapidamente abaixou sua cabeça, negando com a mesma.
– Meu pai... ele me ligou ontem a noite, dizendo que estava na delegacia e passaria a noite lá. - Franzi a testa.
– Por que seu pai passaria uma noite na delegacia? - Ele deu de ombros.
– Eu não sei. Ele não me disse muita coisa, apenas pediu para mim ser forte, nunca esquecer que ele me amava muito independente do que acontecesse e me pediu perdão, depois desligou.
– E você não foi até lá?
– Fui, mas disseram que ele não poderia receber visita até que o caso fosse resolvido e ninguém me disse nada do que estava acontecendo.
Arqueei a sobrancelha, percebi ele apertando suas próprias mãos nervosamente. Levei a minha para cima da dele e Lucca ergueu seu olhar, pude perceber as lágrimas presentes.
– Ei, vai ficar tudo bem.
– Como? Como você conseguiu superar essa dor da perda Maitê? E agora tem mais isso, meu pai passando uma noite na delegacia e nem sei o que está acontecendo com ele, ultimamente nada está fazendo sentindo.
Ouvimos alguém gritar "silêncio", olhei ao redor da biblioteca, a moça responsável nós olhava de cara feia. Voltei a encara-lo e soltei um suspiro, fechando alguns livros que estava estudando.
– Vamos lá pra fora.
Me levantei e segui até o balcão, pedindo para levar os livros, assinando um termo de responsabilidade pelos mesmos. Lucca me seguiu para fora da universidade, se sentamos no gramado em frente do mesmo e o encarei.
– Lucca eu não superei. - Fechei os olhos e respirei fundo, pensando em o que dizer. – Na verdade, eu acho que nunca vou superar.
Abri meus olhos, encontrando com os seus. Meu celular vibrou com uma mensagem mas não dei bola.
– Ninguém entende a dor da perca, até passar por ela. Sabemos que isso é normal de acontecer mas nunca estamos preparados quando chega. Talvez, a gente só aprenda a viver com a ausência deles, é um vazio que ninguém será capaz de substituir, é uma coisa estranha não poder mais ver a pessoa ou sentir. Uma parte minha foi embora junto a ele. - Levei minha mão para minha barriga, Lucca desviou alguns segundos e logo tornou a me olhar. – Eu só estou de pé, por causa dela, porque ela precisa de mim. Era tudo que ele queria, uma menina! Fizemos tantos planos...
Desviei o olhar para cima, o céu estava azul sem nenhuma nuvem hoje, o sol estava confortável, deveria fazer uns vinte e dois graus hoje.
– Mas eu sei que tudo nessa vida tem algum propósito, nada acontece por acaso.
Pisquei e deixei uma lágrima teimosa escorrer pelo meu rosto, a limpei rapidamente, meu celular começou a tocar, o procurei pelo mesmo dentro da minha bolsa e quando encontrei, observei quem estava me ligando, era minha mãe.
– Alô? Mãe?
– Filha preciso que você venha para delegacia, agora!
– Delegacia?
– Sim. Liguei para Douglas, ele já está indo te buscar. Te espero aqui. Ah! E me perdoa filha, não queria que fosse desse jeito.
Franzi a testa, sem entender absolutamente nada, mamãe desligou a ligação quando viu que eu não a respondi, até porque fiquei sem o que dizer, minha cabeça fazia um nó, sem conseguir chegar em alguma resposta que me levaria até a delegacia.
– Maitê? Aconteceu alguma coisa? Ei?
Senti Lucca me sacudindo, pisquei algumas vezes saindo do meu transe.
– É, eu preciso ir para a delegacia.
– Delegacia? O que aconteceu?
– Eu não sei...
– Maitê!
Ouvi a voz do Dodô me chamando. Olhei em direção aonde veio o som da sua voz e o encontrei vindo correndo. Me levantei e Lucca se levantou logo atrás, assim que ele chegou perto, me abraçou apertado.
– Ah meu Deus! Como você está?
– Eu... confusa. - Ele se afastou, segurando meus braços.
– Ah! Você ainda não sabe?
– Não... - Disse com receio. – O que aconteceu?
– É... vamos para a delegacia.
Dodô disse receoso, coçando sua nuca. Antes de sairmos, Lucca questiona.
– Posso ir com vocês? Assim, eu tento ver o meu pai. - Disse ele com a voz baixa e envergonhado.
– Claro, vamos.
Seguimos nós três para a delegacia. Durante o trajeto, foi um silêncio absoluto, meu coração estava acelerado, o que poderia ter acontecido? Será que descobriram o motivo da minha casa ser tomada pelo fogo? Mas já se passou meses!
Deixei um suspiro escapar e senti uma mão sobre a minha, desviei o olhar encontrando com a mão do Dodô, acariciando a mesma, me mostrando que estava comigo. Ergui meu olhar e na mesma hora, seus olhos encontraram o meu, me oferecendo um sorriso sem mostrar os dentes, sorte a minha, de ter ele na minha vida.
Assim que chegamos, descemos e seguimos para adentrar o local, fomos recebidos por uma moça de cabelo ruivo, olhos verdes, que nos levou até uma sala.
– Ah chegaram!
Ouvi minha mãe dizer assim que entramos na sala, Lucca acabou nos acompanhando. Minha mãe me abraçou e quando se afastou, seus olhos fixaram no meu, pude perceber a preocupação através deles.
– Que merda é essa?
Desviei meu olhar ao ouvir Lucca, franzi as sobrancelhas, na sala havia uma janela enorme nos dando a visão de um outro local fechado, onde havia um homem e...
– Esse é o seu pai?
Aproximei de Lucca, podendo ver o tal médico, Mauro acho que é o nome dele, o que está acontecendo aqui?
– É. É o meu pai.
Logo o homem que estava sentado se levantou e caminhou até uma porta ao lado da janela, adentrando na sala onde estávamos. Ele nos olhou e acenou com a cabeça, se aproximou do delegado e falou algo em seu ouvido, que apenas assentiu com sua cabeça.
– Dona Lurdes? Posso?
Olhei para minha mãe, que na mesma hora me olhou e em silêncio, movimentou seus lábios, pedindo perdão, sem sair sua voz. O delegado se aproximou de mim.
– Poderia me acompanhar senhorita Maitê?
Receosa, concordei. Ele esticou seu braço, me dando espaço para passar e me conduziu até a tal sala fechada. Assim que entrei, olhei para a janela e aí que percebi, ele não nos via do outro lado, ah meu Deus! Parece aquelas cenas de filme, porque aquele médico estava numa sala onde interrogam pessoas?
– Senhor delegado, poderia nos deixar a sós?
Desviei o olhar para Mauro, seus olhos estavam fixados em mim, parecia exausto, as olheiras e seus olhos fundo entregavam isso, senti um arrepio atravessar minha espinha.
– Eu vou deixar vocês sozinhos, se estiver tudo bem para ela.
Olhei para o delegado que agora me olhava.
– Ah sim... tudo bem.
Ele assentiu, ofereceu a cadeira para eu sentar e assim fiz. Quando o delegado saiu, nos deixando a sós, encarei o homem a minha frente, ele abaixou a cabeça e soltou um suspiro pesado, com a voz baixa, soltou:
– Ele está vivo Maitê. O pai da sua filha, não morreu.
Pisquei algumas vezes, eu escutei direito? Guilherme está vivo? Ele está...? Ai meu Deus!
– Me perdoa por ter feito você sofrer com a ausência dele e... com a ausência de um pai.
Abri a boca e fechei novamente, pai? Como ele sabe que eu cresci sem um pai? Espera aí, não pode ser! Ele ergueu sua cabeça e me encarou, seu olhar era indecifrável, havia um brilho nele por conta das lágrimas que se formavam. Movimentei minha boca mas não consegui pronunciar uma palavra se quer, estava em choque.
– Eu era novo, não tinha maturidade, me envolvi com sua mãe na época porém estava noivo, esperando por um filho. - desviei o olhar para a tal janela, Lucca é meu irmão? – Maitê não me arrependo de ter tido um caso com sua mãe, eu... eu...
Ele fez uma pausa, voltei a encara-lo, sua cabeça se abaixou novamente, sua mão veio para seu rosto, esfregando em seus olhos, ele estava chorando? Confirmei isso com um soluço que sobressaiu dele.
– Eu passei malditos dezoitos anos me culpando por ter deixado para trás, uma filha.
Seus olhos novamente se ergueram e pude perceber as lágrimas tomando conta do seu rosto, ele parecia estar sendo sincero mas não apaga que me deixou crescer e sofrer por não ter tido um pai, até segundos atrás, eu não sabia se ele estava vivo ou quem era ele.
– Eu não poderia errar com você de novo. Não era dessa forma que eu esperava conhecer você filha mas estou aqui, para pagar mais uma consequência das minhas escolhas erradas. Não espero que me perdoe.
Socos nos fizeram dar um pulo da cadeira, desviei meu olhar, parecia estar vindo daquela janela enorme que havia, onde do outro lado, conseguíamos enxergar perfeitamente onde estávamos.
– E não posso deixar a minha neta, crescer sem um pai, sabendo que ele está vivo.
A porta se abriu bruscamente, Lucca veio como foguete para cima do seu pai, agarrando sua camiseta, alguns homens policiais entraram junto.
– Que porra é essa que você está dizendo?
Lucca o sacudiu mas foi tirado a forças por dois polícias. Meu coração estava acelerado, a ponto de pular para fora, eu não conseguia pensar ou raciocinar direito.
– Você está bem meu amor?
Senti o toque de suas mãos em meus braços, desviei o olhar e encontrei minha mãe com uma expressão de preocupada. Uma lágrima escorreu em meu rosto, ela enxugou a mesma.
– Me perdoa, eu... queria ter te contado antes. Fui pega de surpresa naquele dia no hospital.
Apenas assenti com a cabeça, não vou culpá-la por não ter me contado que meu pai estava perto de nós, eu só preciso saber agora...
– Aonde está o Gui?
– Senhorita nós ainda não sabemos aonde ele está mas vamos descobrir.
– Eles vão trazer o Gui de volta meu amor.
Desviei o olhar novamente para o tal homem, cujo meu pai, dois polícias o seguravam, um em cada lado, sua cabeça se ergueu e seus olhos encontraram os meus, as lágrimas dominavam seu rosto. Fui conduzida para fora da sala enquanto os polícias o levavam por uma outra porta, assim que sai, passei meus olhos pela sala procurando por Lucca.
– Onde está Lucca?
– Ele saiu transtornado daqui, ninguém conseguiu impedi-lo. - Respondeu Dodô.
– Olha senhorita Maitê, eu sinto muito pela situação mas iremos trazer seu noivo de volta. Iremos encontrá-lo.
– Como isso é possível?
– Mauro se entregou, disse que aceitou o dinheiro do senhor Carlos Grades para falsificar a morte de Guilherme Appolinario. Disse que precisava do tal dinheiro para o tratamento da ex esposa que estava doente, que fez isso para ajudá-la por causa do filho mas ao ver que era você. - ele apontou para mim. – Se arrependeu, dizendo que não poderia errar de novo.
Minha cabeça latejava com tamanha informação, não consegui prestar atenção em mais nada em que o delegado explicava, só queria saber aonde esta o meu amor, se está bem, aquela Bianca, nunca pensei que fosse capaz de tamanha maldade, senti uma dor forte na barriga.
– Ai! - Gemi, levando minha mão sobre a mesma e acariciando.
– Tudo bem? - Dodô e mamãe questionaram juntos.
– Sim.
– Senta aqui um pouco, quer uma água?
Douglas me conduziu até uma cadeira, onde me sentei, fechei meus olhos e tentei me controlar nas minhas emoções. Antes mesmo de responder que sim, uma moça apareceu entregando um copo de água a ele.
– Obrigada!
Douglas me entregou e bebi a água. Minha cabeça fervilhava, acabei de descobrir que o amor da minha vida está vivo, que meu pai está mais perto do que imaginava e que ainda por cima, tenho um irmão, é muito informação em um momento só, agora tudo que eu mais desejo, é o meu amor de volta, eu sabia, sentia que ele ainda voltaria para nós.
– Estou bem. Preciso saber de Lucca agora.
– Filha de um tempo a ele.
– Você precisa descansar princesa, foi muita informação.
– Os pais do Gui? Já foram avisados?
– Foram meu amor, eles não ficaram porque disseram que iriam atrás do senhor Carlos e daquela menina safada, os policiais disseram já ter ido atrás mas não encontraram ninguém na casa, porém disseram que saberia onde poderiam encontrá-los, foram com reforços. Sempre soube que aquela garota não era boa coisa.
Suspirei profundo, alisando minha barriga, ah minha menina, seu pai está vivo! Vivo! Logo estaremos nós três juntos. Eu tinha a esperança de que ele voltaria, sempre tive.
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Uma parte de mim
Lãng mạnMaitê Dias, uma garota humilde que cresceu sem a presença de um pai, sua única família é sua mãe que dá a sua vida por ela, e seu melhor amigo que a protege de tudo e de todos como um irmão, até entrar na universidade e conhecer um cara que irá vira...