Amor e Ódio

Capítulo 44

No interior do carro, a atmosfera pesada da noite pairava como um manto invisível. Após o turbilhão de eventos que os havia envolvido, Erick e Eduarda permaneciam imersos em um silêncio carregado. As luzes das ruas cintilavam de maneira indiferente, jogando sombras trêmulas sobre seus semblantes fatigados.

Eduarda, ainda atordoada pelo dia caótico que havia se desenrolado diante de seus olhos, mantinha o olhar vago e distante. Seus pensamentos eram como um emaranhado de fios desordenados, cada um representando um momento de dor e perda. A imagem do filho Antônio, cujo enterro havia sido o ápice da tristeza compartilhada, permanecia incrustada em sua mente. As lágrimas teimosas, já secas, eram testemunhas silenciosas de sua dor profunda.

Enquanto isso, Maria ocupava um canto dos pensamentos, imersa em uma introspecção sombria. Sua expressão refletia a complexidade de seus sentimentos, mesclando tristeza, confusão e até mesmo raiva. As mãos entrelaçadas no colo denotavam uma luta interna que ela não estava pronta para compartilhar com palavras.

No banco do motorista, Erick permanecia mergulhado em suas próprias reflexões, olhos fixos na estrada iluminada pelos faróis. A revelação que Marion lhe fizera sobre Caio, o verdadeiro arquiteto de todos os horrores que haviam enfrentado, ecoava em sua mente como um sino dissonante. Cada peça do quebra-cabeça parecia se encaixar com uma crueldade sombria, revelando a verdade por trás das máscaras que haviam usado para esconder a realidade.

O motor ronronava de forma constante, como um contraponto ao turbilhão de emoções contidas dentro do carro. O ruído monótono era um lembrete constante da realidade que os envolvia, das escolhas difíceis que haviam sido feitas e das consequências inevitáveis que teriam que enfrentar.

Naquele momento de silêncio compartilhado, cada um estava preso em sua própria jornada interior. As palavras pareciam frágeis demais para abarcar o peso das emoções que os envolviam. Enquanto as luzes da cidade passavam como espectros fugazes, aqueles quatro indivíduos permaneciam unidos pelo fio invisível de suas experiências compartilhadas, mesmo que a dor, o segredo e a incerteza os mantivessem em um isolamento silencioso dentro do carro em movimento.

Quando chegaram em casa após deixar Maria na casa dela, Eduarda colocou sua bolsa em cima da mesa e começou a tirar alguns pertences de Antônio, que a própria clinica de reabilitação tinha lhes entregado, dentro da bolsa um livro, o livro que Antônio tinha terminado de escrever.

Eduarda:

Erick, você se lembra daquele livro que o Antônio estava sempre escrevendo? Aquele que ele nunca deixava ninguém chegar perto?

Erick:

- Sim, lembro. Por quê?

Eduarda:

- Ele está aqui, á clinica nos entregou.

Erick:

- O que será que está escrito nele? Será que pode nos ajudar em algo com questão de Marion?

Eduarda:

- não sei, vamos ler então para saber.

Eles assentiram um para o outro e abriram o livro, na primeira página uma foto dele com Marion e na outra uma foto de Cintya, na terceira página ele escreveu um texto em dedicatória a Marion:

Prezado irmão,

Gostaria de expressar minhas desculpas por todo o incômodo que causei nos últimos dias. Em breve, toda essa situação terá um desfecho. Minha consciência não suporta mais carregar este segredo, e é por isso que, se você estiver lendo estas palavras, é provável que eu já não esteja mais ao seu lado, nem ao lado de nosso pai e mãe.

Peço perdão pelo sofrimento que infligi a vocês. Vocês não estavam preparados para enfrentar isso. No entanto, eu estava sofrendo profundamente. A noite do acidente deveria ter sido meu fim. Eu precisava confessar tudo. A pessoa responsável pela morte de Cintya não pode permanecer impune. Foi por isso que escolhi simular insanidade e fingir ter perdido a memória, uma estratégia para continuar vivo e revelar a verdade.

Meu querido irmão, peço que me perdoe. Nunca mereci a confiança que depositou em mim, e é com pesar que admito ter traído essa confiança. A verdade que revelarei a seguir é dolorosa, mas é crucial que você a conheça. Durante o tempo em que Cintya esteve ausente, alegando estar na casa de sua tia, na realidade ela estava escondendo uma gravidez. Segundo ela, o pai da criança que ela carregava era eu.

Lamento profundamente ter que compartilhar essa revelação contigo, sabendo o quanto isso irá ferir. Porém, é chegado o momento de enfrentar a realidade e seguir adiante. Espero que com o tempo, possamos encontrar alguma forma de compreender e superar esse peso que carregamos.

Peço que não guarde rancor de mim, meu amigo, pois naquela noite após sairmos do casamento de nosso primo, você me pediu para levar Cintya para casa. Naquela ocasião, adicionei a uma bebida dela uma substância que a deixou em um estado de desorientação, como se estivesse sob o efeito de drogas, permitindo-me manipulá-la sem o seu conhecimento. Foi nessa mesma noite que busquei satisfazer meus desejos com ela, e infelizmente isso resultou em uma gravidez não planejada. A criança que veio disso é aquela que os pais de Cintya estão criando como filha própria, a fim de esconder a verdade de você.

Meu irmão, naquele momento eu estava embriagado e cegado pela influência das substâncias que usei. Após o efeito da droga passar, ficamos confrontados com a gravidade de nossas ações. Neguei a responsabilidade pela criança, pois tinha convicção de que ela não era minha filha. Realizei um teste de DNA que confirmou essa crença. No entanto, devo revelar agora, de maneira sincera, que essa criança é, na verdade, sua filha. Ela é uma lembrança preciosa de Cintya, carrega traços que lembram os seus, e muitas pessoas já notaram isso. Peço que a abrace, acolha-a como a herança do amor compartilhado entre vocês dois.

Ao início desta carta, mencionei que lhe contaria toda a verdade sobre aquela noite que culminou na trágica morte de Cintya. Estou comprometido em ser transparente e encarar as consequências de meus atos.