Silêncio Ensurdecedor

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POV VALENTINA:

Já fazem dois meses que o Igor e a Duda nos deixaram, eu bem que tentei completar a lista de lugares para espalhar as cinzas sozinha, mas acho que entendi porque o Igor disse que ia precisar da minha companhia, é uma sensação horrorosa fazer esse processo sem ninguém com a gente. Não sei nem explicar direito, mas parece que estou querendo me livrar deles e não acatando seus desejos. Ainda faltam dois lugares para espalhar as cinzas, mas decidi pausar a missão.

Desde o dia do helicóptero a Luiza tem me evitado, parece que está com medo de chegar muito perto de mim e pegar sarna, sei lá. Tentei relevar e fingir que não percebi seu afastamento, para que talvez as coisas pudessem voltar ao normal, mas ela continua falando comigo somente o necessário.

- Não sei se volto pra casa hoje. -- Ela passa por mim e Benjamin na sala.

- Hum... Tá bom. -- Tenho medo de dizer a coisa errada e tomar mais uma patada. -- Quer que eu cuide do Ben amanhã também?

- Eu fico com ele em algum domingo que for seu pra pagar. -- Nem nos olha.

- Certo. -- Pondero se devo dizer a próxima coisa que tenho em mente e concluo que não deve ter nada demais. -- Se precisar de alguma coisa é só ligar.

- Não vou precisar. -- Parece que ela discorda da minha conclusão.

Não me dou ao trabalho de dar continuidade ao diálogo, não vai a lugar nenhum mesmo.

Nas últimas duas semanas a Luiza tem chegado mais tarde em casa, passa mais tempo no celular, usa mais perfume do que normalmente quando está saindo... todos os sinais gritam que ela está indo para encontros, não encontro, no singular, encontros, no plural mesmo. Não que isso seja da minha conta, mas se ela trouxer gente pra cá o caldo vai entornar, não quero meu sobrinho tendo que aprender o nome de uma nova a cada dia.

Ela acabou de atravessar a porta da entrada e Benjamin já está me olhando com a mesma cara que vem fazendo sempre que a Luiza sai sem nem se despedir dele, acho que ele tem medo dela sumir igual aos pais, só digo que se ela traumatizar meu sobrinho a coisa vai ficar mais feia que os restaurantes mixurucas que ela posta nos storys quando sai.

- Tá tudo bem, cara. -- Brinco com o nariz dele. -- Ela vai voltar.

- A Dinda vai morar no céu também? -- Já consigo até ver que o choro está a caminho.

- Não Benzinho, ela só tá indo beijar na boca, coisa de mulher carente. -- Faço uma careta.

- Pra quê ela vai beijar na boca? -- Me olha confuso.

- Olha amigo, eu posso estar viajando aqui. Mas acho que desconfigurei ela com todo o meu charme e talento pilotando helicópteros e agora ela está dando o melhor de si pra me provar que não morre de tesão por mim.

Meu sobrinho me olha confuso e só então eu me dou conta da baboseira que acabou de sair da minha boca, porque eu falei isso? Na verdade a pergunta certa é, porque eu tô falando sobre isso com meu sobrinho de dois anos?

Acho que preciso fazer amigos, ou talvez arranjar umas bocas pra beijar também, quem sabe assim eu paro de falar sobre mulheres com tesão em mim para meu sobrinho.

- Não dá ouvidos pra mim, cara, sua tia fala besteira demais as vezes. -- Beijo sua testa. -- Ela não vai pro céu, só está saindo pra se divertir, o que você quer jantar?

- Não quero jantar. -- Se enfia em meu colo e se ajeita soltando barulhinhos manhosos.

- Não quer nem mamar? -- Aperto os braços em volta do corpo dele.

- Na mamadeira?

- Ah, amigão, você já é um menino grande, meninos grandes usam copinho com tampa, lembra?

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