Senventy-nine

1K 115 389
                                    


_________________________________________

Ela tinha doze anos.

Era tão nova. Tinha tanto a conhecer do mundo. Eu tinha tanto a mostrar para ela, como, por exemplo, as lanternas flutuantes. Agora com o dinheiro que iria ganhar, poderia dar tudo o que minha irmã quisesse, até porque um dos motivos — um dos maiores — pelo qual entrei nessa missão foi por ela. Para que ela tenha uma boa vida. Para bancar ela.

Minha mente vem a uma paralisia, como um choque total. Meus pensamentos são uma mistura de memórias com dúvidas, e tudo parece um pesadelo do qual parece impossível de acordar. Eu não quero acreditar que algo assim aconteceu. Não era para acontecer. Não pode ter acontecido.

Pelo o que consegui entender — pelo o que Mikey me contou —, Emma passou o dia fora com Draken, eles iriam ao médico. Shin foi para a casa de um dos amigos dele, o único que ficou em casa foi Manjiro. Segundo o loiro, minha irmã passou o dia todo no quarto. Ele a chamou para fora algumas vezes — para comer, ou apenas assistirem algo juntos — mas ela não quis. Disse que Soso foi super ignorante com ele, até o xingou, por isso o loiro não insistiu tanto.

"Quando foi umas sete e meia da noite, Emma chegou e preparou a janta. Umas oito horas ela pediu para eu chamar a Soso, então eu neguei porque ainda estava com raiva. Mas o Kenzinho' foi em meu lugar. Ele chamou e ela não atendeu. Depois a Emma tentou, mas aconteceu a mesma coisa. Quando eu disse que a Soso passou o dia todo trancada no quarto, Emma se desesperou. Eu não entendi logo no início, mas agora sei que ela estava sentindo que algo ruim tinha acontecido. Arrombamos a porta e a encontramos no chão do quarto, com..."

Foi essa a última coisa que Manjiro disse, antes de eu expulsá-lo do quarto. Não queria ouvir o que estava para sair da boca dele, eu não iria aguentar. Queria saber o que aconteceu, mas queria saber da boca dela. Queria que ela me falasse sobre o que estava passando. Há um motivo para isso, ninguém tentaria suicídio por nada. E é esse motivo que eu queria saber.

Tenho para mim que eu poderia ter feito algo. Penso que, se eu não estivesse fora, teria evitado. Se eu não aceitasse aquela missão... se eu ficasse perto dela, com certeza seria diferente.

Pelo menos se eu tivesse visualizado e respondido aquelas mensagens enviadas por ela, acho que seria alguma ajuda. Creio que salvaria ela.

Mas... o que eu estava fazendo?

Àquela hora eu estava ocupando minha mente com as roupas que eu iria usar em uma festa que nem estava perto do horário. Se eu estivesse com o maldito celular na mão... se eu não fosse tão ansiosa naquela hora. Merda! Eu teria evitado.

Olho para o lado de fora do quarto, através da janela. Está chovendo. Começou a chover do nada, eu poderia jurar que hoje o dia seria de sol. Assisto os pingos, ouço o som... seria reconfortante se eu não estivesse enfrentando uma guerra dentro de mim. Boa parte de meus pensamentos estão voltados a culpa, a como eu pude deixar mais uma pessoa que eu amo morrer, a como eu poderia ter feito algo para evitar que acontecesse. As outras partes estão divididas entre a negação, confusão, memórias e tristeza profunda. Todos disputando quem consegue me matar primeiro.

Tudo dói. Respirar dói, chorar dói, piscar os olhos dói, mexer o corpo dói, pensar dói, existir dói.

Uns minutos atrás um homem usando roupas de médico me disse que eu poderia ver minha irmã — não perguntei como ele sabia que eu estava ali por ela, pois um dos Sano devem ter falado. Eu disse que iria depois e perguntei se eu podia ficar mais uns minutos no quarto. Sendo bem sincera, não quero vê-la. Não tenho coragem.

𝙊𝘽𝙎𝙀𝙎𝙎𝙀𝘿 𝘽𝙊𝙔; Izana Kurokawa  Onde histórias criam vida. Descubra agora