SERVOS DO SILÊNCIO
Nathaniel
Eu não assimilava as ideias, não conseguia pensar com clareza. Não enquanto Liza não estivesse sob minha proteção. Passei a duvidar do próprio Penhasco.
Eu era o único capaz de impedir. O único capaz de salvá-la. Meu pensamento podia ser egoísta, mas eu não contaria essa mentira a mim mesmo. Se a profecia se cumprisse, cada alma de anjo e cada alma humana se tornaria escrava e somente a de Liza me preocupava, A Dourada. Eu sabia que, em meu íntimo, buscar por outra seria inútil, era ela que ele buscava.
Errei ao imaginar que nosso destino seria o mesmo de meus pais. Seria ainda pior. Muito pior.
Não deixarei que nada aconteça a ela. Se o contato não foi feito, ainda há uma saída. Algo que ambos desejamos. Apenas sinto que tenha que ser dessa forma, apressada. Espero que eu consiga tirar o que a mantém intocada, pois se um único lampejo de dúvida ou temor passar por seus olhos, eu não o farei. .
Mas algo me afligia ainda mais: Ter de lhe esconder a verdade. Liza não merecia esse sofrimento. Se ela soubesse, se sacrificaria para o bem de todos, hesitaria apenas pelo meu pesar.
A Alma Dourada é aquela que suporta a escolha que ninguém mais pode fazer. Quanto a mim, se tratando dela, não havia mais nada, só seria feliz se ela o fosse. A escolha estava feita.
Cheguei ao Penhasco e a vi de longe. Esperando-me.
O ar preencheu meus pulmões por saber que ela estava bem. Fora de perigo.
Segurei o colar de minha mãe e o observei pela primeira vez.
Sorri quando notei o formato. É claro que fazia todo sentido.
Um formigamento me percorreu de súbito. Senti-me tonto, minha visão embaçou. O Penhasco girou aos meus olhos. Talvez seja isso o que um humano sente ao desmaiar.
***
Liza
Aguardava por Nate no Penhasco. Depois do episódio do anel, em que, segundo ele, Ethan tentou me hipnotizar, tudo se tornou ainda mais pesado.
Recostei na árvore e um vento gelado pareceu soprar em meu ouvido. Como o toque de dedos frios. Infelizmente eu já havia sentido isso antes. Desde muito nova, eu sentia essas presenças. Eram opostas. Uma me amedrontava, serpenteava por meu corpo e me largava com um desconforto nas costas. Aquela certeza de que há alguma coisa atrás de você, mesmo que não se possa ver. Era fria, como o toque da morte. A outra presença me envolvia de paz. Acolhia-me quente, como o abraço de um anjo. Eu sabia, agora. Uma delas era Nate.
E quanto à outra?
Seria esse o mal à minha espreita? Estaria isso relacionado aos meus pais?
Pensar nisso me fez tremer.
Abri o livro Cem Anos de Solidão e lutei para me distrair. Ao chegar na metade do livro, percebi que não absorvia nada do que lia. Os nomes dos personagens se embolavam na minha cabeça. Coronel Aureliano Buendia, Aureliano José, Aureliano Segundo. Surpreendi-me ao virar a página para conferir o nome do próximo capítulo. Quando ergui o livro porque meus braços doíam, um pedaço de papel rasgado caiu em meu colo. As letras pareciam escritas às pressas, mas as reconheci mesmo no garrancho. Eram de minha mãe.
Meu coração acelerou, abrupta e dolorosamente.
"Liza, perdoe-me por nunca ter tido a coragem para lhe contar isso antes. Perdoe-me mais uma vez por lhe contar dessa maneira. Apenas leia as páginas. Espero que encontre a verdade."
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O Penhasco - Livro 1 - Completo
FantasySinopse: "Teria sido uma noite como qualquer outra, se ele não tivesse aparecido. E se eu não estivesse completamente sozinha. Com um estranho em um Penhasco e sem lembrar de como fui parar ali. Me assustei quando ele se materializou à minha frente...