O DIA SEGUINTE
12 de junho de 1999, Los Angeles, Califórnia.
Delegado Machado
O Delegado Machado estava estupefato pela sensação que o invadiu ao olhar aquelas duas meninas à sua frente. A mulher então sabia de alguma coisa. Sabia que não passaria daquela noite.
A menina mais nova aparentava a mesma idade de sua filha, poderia até ser sua filha se o caso não fosse esse, levando em conta o tempo que não a via.
Em seus trinta anos de serviço policial, Machado viu de tudo. Pais matando filhos. Filhos matando mães. Maníacos violentando crianças. Loucos matando por prazer, ou por dinheiro. Por maior que fossem as atrocidades, ainda achava que a pior parte era a hora de contar à família.
Na maioria dos casos, havia algo o que contar. As famílias sempre se resignavam quando tinham mais detalhes do que aconteceu, ou até a certeza da morte, por pior que pudesse parecer.
O fato de não saber criava um clima de especulação, que poderia levar à loucura qualquer mente que se deixasse levar por suas próprias teorias.
A esperança quando alimentada por muito tempo, cria feridas em cima de feridas lentamente, e esse é o tipo de coisa que não cicatriza.
Preferia agora enfrentar um assassino com seu próprio punho, do que criar naquelas meninas a ferida que nunca mais fecharia.
Ele mesmo carregava uma. A ferida do remorso.
Seu casamento fracassado lhe rendeu uma vida dedicada a um trabalho que consistia em entender a mente de psicopatas e o pior, em aumentar a distância, que só crescia, da filha que não criou por falta de escolha. Pelo menos é o que dizia a si mesmo constantemente, para amenizar sua culpa. Sua ex-mulher se recusava a dizer onde estavam, e só o procurava se a pensão estivesse atrasada.
Soube que ela comprou uma casa há poucas semanas em Winterhill para se mudar com sua filha, Ana. Foi tudo o que conseguiu descobrir quando rastreou as movimentações da conta e dos cartões da ex-mulher. Se antes tivessem mudado apenas de bairro, ele não saberia, como não sabia agora, que elas ainda estariam em Los Angeles por mais algumas semanas. Ele aprumou o corpo na cadeira gasta de couro, e as liberou com a promessa de manter contato.
Liza, a garota mais velha, pareceu ter amadurecido trinta anos no instante em que ele lhe relatou o ocorrido. Em nenhum momento o acusou ou perdeu o controle. Sua aparência era calma e estável, enquanto segurava a mão da irmã chorando em seu ombro.
Delegado Machado estava impressionado com a garota. Deveria estar um caco por dentro, ainda assim, poderia ter enganado alguém, até mesmo com sua experiência.
Uma vibração diferente emanava dela. O lado positivo era ressaltado quando ela falava. Não havia como explicar, só vendo. Perto dela, ele desejava ser uma pessoa melhor. Queria de verdade solucionar o caso, ou ter pelo menos algo a dizer, algo para confortá-la, mas isso não seria possível.
Quando um caso chega ao ponto de levantar questionamentos da Física, da Ciência, ou qualquer tipo de lógica, o caminho a seguir são os traços, pistas, testemunhas.
Qual é o caminho, quando não há nada?
Se não fossem pelas duas meninas e aquela mulher que procurou pelo marido e desapareceu logo em seguida, o Delegado Machado suspeitaria que algum crime, de fato, havia sido cometido.
Do crime agora, ele sabia. Mas não havia lógica. Não havia explicação.
***
Quinze anos atrás, uma onda de crimes se alastrou por Los Angeles.
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O Penhasco - Livro 1 - Completo
FantasiSinopse: "Teria sido uma noite como qualquer outra, se ele não tivesse aparecido. E se eu não estivesse completamente sozinha. Com um estranho em um Penhasco e sem lembrar de como fui parar ali. Me assustei quando ele se materializou à minha frente...