CAPÍTULO 42

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Patrick estava num gato. Um bonito gato gordo de uma família rica que, depois de ter estado na mente do patriarca da família, se mostrou mais confortável que o humano.
A casa da rica família ficava próxima da Clínica em que Flora e o corpo inútil de Brian estavam, como um gato, era fácil ir vê-la.
Ele entrou pela janela, a falta de cheiro no quarto onde Flora estava o incomodou tanto que ele rosnou. Simple!
Ele estava com suas mãos nojentas em Flora e não havia nada que Patrick pudesse fazer. Pelo menos por enquanto.
Se havia algo que seu finado pai lhe ensinou foi ter paciência. Eustace Lennisworth esperou dois longos anos até conseguir comprar Bronze, esperou outros longos anos até poder atacar os Novas Espécies e o plano dele não era ruim, a idiota da Sarah foi quem arruinou tudo.
E aí quando Patrick estava morto, ele voltou à vida e num corpo Nova Espécie! E não num corpo Nova Espécie qualquer,  mas no de um telepata.
Nesse corpo, Patrick conheceu Flora e teve seu felizes para sempre até que ele morreu de novo, para acordar num cérebro totalmente desconhecido e descobrir que tinha saltado para o cérebro de um dos aprimorados que faziam a segurança da casa dele. Esse segurança ficava num ponto distante da casa, Flora o tinha feito dormir, mas a distância o protegeu.
"Olha, mamãe! Ele voltou! Me deixa colocar um nome nele agora?" Umas mãozinhas gentis seguraram o corpo gordo do gato e logo o tal de Glee estava esfregando seu rosto no de Patrick. Olhos  bicolores não eram incomuns entre os Novas Espécies, Patrick sempre se admirou dos olhos de Minerva e de seus dois filhos, Proud e Kevin, mas havia algo diferente nos olhos daquele menino.
O azul não era tão escuro, o verde não era tão claro, ou seja, ele tinha e não tinha puxado aos olhos de seu avô, Dusky, ao mesmo tempo. Tammy tinha olhos azuis e mesmo que Valiant tivesse os famosos olhos dourados, um dos irmãos dele, morto nas instalações, tinha os olhos verdes.
O que fazia Patrick pensar que aquele menino que lhe acariciava os pelos negros, tinha toda uma gama de genes poderosos e ainda poder telepata, já que era filhote, como eles diziam, de Joseph North, o maior inimigo do pai de Brian. Ah, as coincidências da vida!
"Me dá ele aqui." O gato foi retirado das mãos de Glee com brusquidão, Patrick sorriu orgulhoso de seu filho.
"Jacob, assim você o machuca." Elize disse num tom de voz severo.
Quem era aquela reles implantada para falar daquele jeito com o filho dele? Patrick usou o gato para chiar, Jacob lhe alisou as costas o acalmando.
"Desculpa, Elize. Mas Glee também não tem muito jeito com ele." Jacob disse e foi a vez de Glee chiar. Felinos! Chiavam a toa.
"Peça desculpas a Glee, afinal foi a ele que você quase jogou no chão." Elize disse, Patrick refreou sua vontade de voar nela com as unhas esticadas.
"Desculpa." Jacob disse com sinceridade, era o esperado, Jacob era bom.
"Tudo bem."
"Esse gato aqui de novo!" A voz de Joe foi ouvida da porta, Patrick se refugiou no fundo da mente do gato. Ele não sabia o tamanho da capacidade de Joe, mas a telepatia de Brian tinha vindo dele, qualquer deslize e Patrick teria de se esconder em outro bicho ou pessoa.
"Ele é tão fofinho, pai!" Glee disse.
Os dois irmãos dele vieram correndo e tomaram o gato das mãos de Jacob, Patrick se viu sendo esticado entre os dois.
"Parem com isso! Por que não conseguem dividir nada? Quando eu e seu tio..."
"Ah, pai, tenha dó! Todo mundo sabe que você e o tio James nunca foram íntimos. Não como os trigêmeos." Um dos dois disse. Eles eram idênticos e Patrick não tinha o mínimo interesse  em saber os nomes deles.
"Nenhum trio ou dupla é como eles, é impossível." Jacob disse com admiração no olhar, Patrick sentiu o ódio que ele sempre sentiu de Simple esfriar seu coração.
"Exato, Jacob. E é por isso que temos de retirar qualquer indício de que esse gato de aproximou de Flora. Sabe como o tio de vocês se transforma numa filhotinha birrenta quando sente o cheiro dele aqui."
"E eu estou com fome." Elize disse.
"Eu fiz o jantar. Uma torta de hortaliças deliciosa. Você vai adorar!" Joe disse saindo do quarto abraçado com Elize.
"Não, eu não vou e os dias de comer salada estão contados, Joseph. Não me faça fazer você se arrepender de ter cozinhado o jantar." Ela disse e a porta foi fechada.
"Ai, mãe, vocês não podem falar dessas coisas no quarto de vocês?" Patrick ouviu o mais velho, o dos olhos bicolores reclamar.
"Tio Sim disse que você deve sentir a aura dela e que no seu lugar faria o mesmo."
Patrick virou a cabeça e viu que quando o monte de cabeças ruivas passou pela porta Jacob não estava entre elas. Ele empilhava umas toalhas úmidas depois de separar algumas.
Patrick o observou limpar as mãos de Flora com carinho e depois da limpeza, Jacob beijou os dedos dela com uma expressão tão triste no rosto que se o gato fosse capaz de chorar, Patrick choraria.
"Ela vai acordar e a primeira coisa que vai fazer será agradecer a sua companhia. Ela é assim." Jacob disse e uma lágrima desceu pelo rostinho infantil, Patrick se aproximou dele e esfregou o rosto do gato no braço dele. Imediatamente uma sensação de Bem-estar o tomou, Patrick ronronou. Parecia que fazia anos que ele não sentia aquela onda sensorial.
"Ela tem de acordar. Eu a sinto, sabia? Eu tentei muitas vezes acordá-la, mas não consegui. Acho que é por que ela não quer. Lily diz que ela precisa de tempo, que..." Os lábios dele tremeram e ele abraçou o gato, Patrick ajeitou as patas do gato no pescoço dele, foi o que deu pra fazer.
"Ela sempre foi incompreendida. Até por mim, sabia? Meu pai, meu tio, que a ama também, eles nunca a entenderam. Mas eu sim. Eu sou como ela, eu entendo."
Patrick pensou se o que Jacob estava dizendo fazia algum sentido, mas só conseguiu concluir que seu filho estava sofrendo demais ao ver sua mãe daquele jeito."
"Meu pai a tinha como um troféu. Eu o amo, sempre vou amar, mas ele nunca amou de verdade. O amor deixa um rastro, sabia?" Jacob disse, soltou o gato e voltou a passar uma toalha úmida no rosto e pescoço de Flora.
Patrick esperou que ele continuasse falando, mas Jacob estava imerso em seus próprios pensamentos. Ele não estava realmente falando com o gato, Jacob era inteligente demais para fazer uma coisa inútil daquelas. Ele falava consigo mesmo.
Patrick fez o gato miar, Jacob sorriu e acariciou o queixo do gato.
"Está curioso? É uma longa história." Ele disse.
Patrick fez o gato miar mais algumas vezes, Jacob terminou a limpeza do corpo de Flora, ajustou os equipamentos, o ar condicionado, pegou o gato e foi para o outro quarto.
"Esse é o meu pai." Jacob disse para o gato quando o colocou sobre uma cadeira.
Jacob começou a fazer a limpeza assim como tinha feito com Flora, Patrick ficou olhando o corpo com o qual viveu anos. Alto e forte, ruivo e bonito. Os cabelos estavam cortados, Patrick se lembrou de sua luta para deixá-los pelo menos na altura do queixo. Os impressionantes olhos dourados estavam fechados, os lábios grossos estavam meio abertos, moles. Fizeram uma traqueostomia nele, já que ele ficaria ali por muito tempo. Até que Forbes se desse por vencido e cremasse o corpo. Era uma pena.
Não para Patrick, lógico, mas sim para o próprio Brian.
A primeira coisa que Patrick descobriu com a explosão sensorial de Flora foi que Brian não tinha morrido, que ele tinha se escondido de Patrick e os dois passaram todo aquele tempo coexistindo juntos. Ele não descobriu sozinho, lógico, foi o filho da puta do MacKay quem contou a Patrick.
Quando ele entendeu que sua mente tinha migrado para outro chip e que o corpo de Brian estava inútil, Patrick foi atrás de MacKay.
O cientista louco praticamente teve um orgasmo quando viu que Patrick tinha conseguido não só migrar para outro chip inativo, mas também era capaz de habitar mentes sem chip por alguns instantes no começo, por tempo indeterminado depois.
O maior problema dos Chips era o fato de que outra pessoa tinha de fazer a implantação, mas Patrick não precisou e nem a puta da Samantha tinha aquela capacidade. Ela migrava entre os Chips, mas se o corpo em que ela habitava morresse antes que ela saísse, outra pessoa tinha de reativar seu chip. É claro que ela era muito esperta e a qualquer sinal de ameaça, migrava para outro chip que ela já tivesse sido conectada, mas num caso em que o corpo em que estivesse morresse de forma repentina, como aconteceu com Brian, ela só voltaria a vida se fosse reativada. Essa reativação acontecia com uma implantação nova.
Mas Patrick estava adormecido pelo poder de Flora quando o que quer que ela tenha feito foi deflagrado, ainda assim sua mente migrou para o cérebro do aprimorado. MacKay explicou que isso só podia ter acontecido devido ao poder telepata de Brian.
Patrick demorou para entender, mas quando isso aconteceu, ele viu que MacKay não estava totalmente certo. Ele não contou para MacKay, é claro, afinal a razão exata do por quê ele começou a habitar mentes aleatórias não tinha importância nenhuma. O que importava era que dali em diante ele estaria perto de Flora. Ele poderia passar o resto de sua vida ao lado dela e era isso o que ele faria. Para sempre.
Jacob terminou o que fazia, pegou o gato e o levou para a casa nos fundos da clínica. Depois de comerem com a família de Joe, Jacob se deitou na cama abraçado ao gato e Patrick se sentiu feliz por ainda poder fazer algum carinho em seu filho, mesmo que usando um...
"Ah, seu filho da puta! Te achei!"
Patrick saltou rapidamente da cama, pulou a janela e correu na velocidade máxima que o corpo gordo do gato permitiu até que ouviu uma risada odiosa e percebeu que a risada vinha de dentro dos ouvidos dele, então parou. O coração do gato estava disparado, Patrick se sentiu sendo sugado num turbilhão até tudo ficar imóvel e ele se sentir inteiro novamente.
Ele olhou em volta e viu que não estava mais no quarto de Jacob, o chão era sujo, seus pés estavam sujos de fezes e sangue.
Pés? Ele tinha pés agora? Pés brancos e pequenos. Nada dos pés bronzeados e grandes do corpo de Brian, mas sim os pequenos e delicados pés do corpo original dele. O corpo humano e patético com que nasceu.
Um barulho a esquerda lhe chamou a atenção, no instante em que seus olhos viram a cena, ele os fechou. Uma mulher horrenda, careca, gorda com muitas partes do corpo cortadas e de onde jorravam sangue e pus se atracava com um homem jovem. Os braços gordos e flácidos seguravam a cabeça do jovem entre suas pernas enquanto ela arranhava os seios enormes com garras sujas. Sua língua estava para fora, seu rosto era torto, os olhos eram esbugalhados.
"Com medo, Patrick?" Ela perguntou e riu. O jovem tirou a cabeça do meio das pernas da mulher e olhou para Patrick, Patrick viu que o jovem era idêntico a ele.
A mulher rasgou os seios, arrancou um mamilo e entregou ao jovem Patrick, ele riu, colocou o pedaço de carne ensanguentada na boca e mastigou com a boca aberta.
O cheiro do lugar era insuportável, Patrick prendeu a respiração, a mulher fez o outro Patrick se deitar e se sentou sobre seu pênis, eles começaram a se mexer, o outro Patrick ria enquanto a mulher horrível rebolava sobre ele, as fezes, restos de pele humana e sangue sujaram ainda mais os dois.
"Eu vou te deixar um tempo aí, para que você aprenda. E não vai poder fechar os olhos." A voz de Samantha soou de algum lugar, Patrick correu.
Ele correu, escorregando entre os detritos nojentos, sujando seu corpo de sangue e fezes, correu até não ter mais forças. Para apenas perceber que estava no mesmo lugar.
"Me tira daqui! Agora!" Ele gritou de joelhos no meio daquela imundície fedorenta.
"Nem Livie foi capaz de escapar, acha que você vai?" A voz soou ao longe.
"Ele é fraco!" A mulher e o jovem Patrick, que agora estavam em outra posição sexual nojenta e tinham pássaros lhes bicando a pele, disseram rindo. Cada bicada dos pássaros lhes faziam machucados cheios de pus amarelo, era totalmente horrendo.
"Por que estou aqui? Somos negociantes, Samantha. Me tire daqui e negociaremos." Patrick disse se levantando e tentando se acalmar. Nada ali era real e por mais que estivesse aterrorizado, ele não era fraco, não era mesmo, ele tinha vencido Simple! Tinha tirado aquilo que era mais precioso para o macho mais poderoso dos Novas Espécies. Samantha era apenas uma puta patética.
O turbilhão o pegou novamente, enquanto se sentia ser rasgado em todas as direções possíveis, Patrick quis sorrir. Seu ódio por Simple o fazia continuar vivo e lutando. Esse foi seu último pensamento antes da escuridão o tomar.

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