CAPÍTULO 49

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O queijo especial estava pronto a dias já, mas não tinham vindo buscar. Boon ligou para Tree, ele disse que buscariam, mas até agora nada.
Boon pegou um dos queijos, colocou na mesa, partiu e comeu um pedaço, o sabor explodiu em sua língua. Ela gostaria. Ela era uma grande comilona, mas ainda assim era exigente, ela iria gemer e apertar os pequenos lábios delicados um no outro e...
"Pare com isso, idiota, pare com isso!"
"Parar com o quê" a voz do pai de Boom soou atrás dele, Boon se assustou e deixou a faca cair de sua mão. Seu pai e ele se abaixaram ao mesmo tempo para pegar a faca e bateram as cabeças, Lash trovejou uma risada.
"Ah, filhote! Então sua mãe está certa!"
"Não!" Boon disse alto, seu pai levou as mãos aos ouvidos.
"Como pode gritar que não, machucando meus ouvidos, se eu nem disse em que sua mãe está certa?"
Boon se sentou no tamborete olhando para baixo, seu pai se sentou do outro lado da pequena mesa em que provavam os queijos.
"Sabe, eu sempre me orgulhei do fato de vocês me respeitarem dessa forma. Todos vocês são leões, bravos e selvagens leões como eu, mas quando eu falo, vocês baixam as cabeças e esperam. Acho que foi a primeira vez que você falou mais alto comigo, não foi?"
"Me desculpe, pai. Eu me assustei."
"Claro, claro. A questão não é essa. Eu, às vezes, me pergunto se foi bom criá-los aqui. Sua mãe também sofre por isso, acho que ela sofre mais que eu."
"Eu posso falar por mim e por meus irmãos, pai, nós amamos esse pedaço de chão. Nunca iríamos querer que a mamãe vivesse em pânico apenas para estarmos no meio de filhotes da nossa idade. E nem é tão longe! Blade foi para a fábrica, eu sempre passo em algumas casas quando faço as entregas. Dagger adora conversar com Michele, adora ajudar no zoológico. Stylet... Tá, Stylet é meio inútil, mas ele é doce, é o mais doce de nós." Boon disse, seu pai riu.
"E ele namorou Violet." Seu pai disse entre as risadas.
"Em quê você acha que mamãe estava certa?" Boon perguntou.
"Que você está apaixonado por Jewel." Seu pai soltou a bomba na cara de Boon, ele acabou gritando:
"Não! Não, eu não estou!"
"Filhote! Mas que coisa! Quer me deixar surdo?" O pai de Boon reclamou.
"Desculpa." Boon falou e ia baixar a cabeça quando a estrutura de prateleiras de madeira desmoronou. Ele e seu pai saltaram, ouviram um chiado que só podia ser de Tulip e correram para tirá-la de debaixo das tábuas, foi um desespero tão grande que eles pisotearam os queijos e doces. Tulip estava desmaiada, eles correram até a casa de Gabriel.
Gabriel os recebeu na porta, tomou o corpinho gordo de Tulip das mãos de Lash, a deitou numa maca, aplicou uma injeção no pescoço dela, logo, Tulip abria os olhinhos. Ela disse Bo Bo, que era como chamava Boon, Boon a pegou no colo.
"Estou aqui, maninha! Sua levadinha!" Ele disse, Tulip passou os bracinhos curtos e grossos em seu pescoço, ele a abraçou.
"E o papai, Tulip? Não merece um abraço também?" O pai de Boon perguntou, Tulip disse 'não' e mordeu a orelha direita de Boon. Gabriel e Pollyana riram.
"Qual foi o susto dessa vez, meu amigo?" Gabriel perguntou.
"Ela destruiu a estante da área de prova. Acabou com tudo, meu amigo, não sobrou nada!" Lash disse, ele e Gabriel gargalharam.
"Pollyana também fez isso com a minha estante de substâncias. Foi tudo para o chão." É claro que Gabriel não ia deixar de falar de sua filhotinha.
"Ai, pai! Eu não faço essas coisas mais." Pollyana disse.
"Sim, querida, infelizmente. Eu preferia perder todo o meu trabalho a ter de ver você se maquiando a frente do espelho, eu juro." Gabriel disse com um suspiro.
Tulip amoleceu o corpo, Boon olhou para Gabriel, mas foi Pollyana quem respondeu:
"Ela vai dormir, Boon, é a reação esperada. Papai a examinou, ela machucou a cabeça, o sono vai ajudar a que seu cérebro se reorganize e se recomponha." Gabriel olhou para Lash o orgulho brilhava em seus olhos.
"Obrigado, meu amigo. Sabe que sou seu servo por toda a minha vida, não é?"
"E eu sou seu." Gabriel disse, os dois colaram as testas, depois disso, Lash e Boon voltaram para a casa deles.
Em casa, Boon depositou Tulip adormecida nas mãos trementes de sua mãe, ela estava desesperada dizendo que se distraiu por poucos segundos e Tulip tinha sumido. Dagger explicou que tinha tranquilizado a mãe deles dizendo que tinha sentido o cheiro de Tulip na sala de exposição e que Lash e Boon também estavam lá.
"Como as prateleiras caíram, Boon?" A mãe de Boon perguntou, Boon não quis revelar tinha notado que Tulip estava mordendo a madeira da base das prateleiras pouco a pouco, então deu de ombros.
"Eu acho que a base das prateleiras deve ter sido infestada por cupins." O pai de Boon disse, Boon assentiu.
A verdade era que ele estava tão ocupado fazendo os queijos que não quis perder tempo reparando as prateleiras. E como Tulip o seguia onde ele fosse, Boon sempre a deixava ficar brincando com as madeiras e cestas da sala de exposição.
"Eu vou me deitar, vocês..." A mãe de Boon disse saindo da sala, o pai dele a seguiu.
"Cupins, é? Pra mim foi a própria Tulip. Você e papai não a perceberam lá?" Dagger perguntou olhando com desconfiança para Boon.
"Acho que tudo desabou no exato momento em que ela chegou."
"Ela é feroz, mas é só uma bebezinha, Boon. Você devia ter mais cuidado com ela já que ela vive atrás de você." Dagger disse usando sua autoridade de mais velho, Boon olhou para baixo. É claro que os quatro competiam pelo amor de Tulip e os outros três tinham muito ciúme do fato de que Tulip muitas vezes preferia o colo de Boon ao dos pais deles.
Boon voltou a sala de exposição e começou a limpar a bagunça, ele perdeu a noção do tempo enquanto recolheu tudo, jogou fora os queijos e doces pisoteados e começou a separar as tábuas que poderiam ser reaproveitadas para um novo expositório.
Ele olhou em volta, feliz com seu trabalho, seu coração disparou antes que o cheiro dela lhe viesse ao nariz. Ele teria tempo de tomar um banho?
Jewel vinha dirigindo sozinha, Boon se resolveu a recepcioná-la sujo e descabelado mesmo, afinal não era como se esperasse a ela ou a qualquer outra pessoa.
Mas ele acabou por tirar a camiseta suja e estava enrolando os cabelos na nuca quando ela chegou por trás e amarrou os cabelos de Boon com um elástico.
"Obrigado."
Ela sorriu de leve, andou pela sala de exposição, foi até a base das prateleiras e tocou onde os dentinhos de Tulip tinham roído.
"Redecorando?" Ela perguntou, Boon colocou os tamboretes e a mesa no meio da salinha, fez sinal, ela se sentou.
"Acho que houve uma infestação de cupins nas madeiras e tudo veio a baixo. Tulip foi atingida e...
"Meu Deus! Onde ela está?" Jewel perguntou já saindo da sala correndo, Boon a alcançou e a segurou pelo braço.
"A levamos no Gabriel, ele a medicou, Tulip está dormindo." Jewel acenou e voltou para o curral sem tirar a mão de Boon de seu braço, Boon também não recolheu a mão.
Parecia tão certo andar por aquela trilha a segurando pelo braço! Seria melhor se estivessem de mãos dadas, mas o braço macio dela estava quente, seu corpo cheirava deliciosamente.
Quando voltaram para a sala de exposição, ela se sentou e o encarou, Boon se perdeu no azul dos olhos dela. Era como estar em frente ao lago num dia de verão, bem ao meio dia. Calor, força e um quê de mistério, afinal o lago tinha águas profundas logo após a ilhazinha que ficava bem no meio em direção a margem que dava para a Zona Selvagem.
"Os seus queijos já estavam embalados, mas vocês não vieram, então teremos de embalar de novo." Boon disse, ela fez um gesto de pouco caso com as mãos.
"Isso é o de menos. Tree se rebelou e diz que quer trabalhar na fábrica definitivamente. Preciso de um gerente, Boon." Ela disse, Boon apertou os olhos.
Ela estaria sugerindo que ele fosse o gerente? Não! É claro que não!
"Você tem o gerente humano."
"Eu quero você." Ela disse de uma vez, o coração de Boon disparou de tal forma que ele fechou a boca com medo de que o dito coração idiota saísse pelos seus lábios.
"Não." Ele disse desviando os olhos dos dela.
"Você não precisa sair da Reserva se não quiser. Eu tenho toda uma logística informatizada e você pode fazer relatorios manuais se não souber operar o sistema. Não é muito diferente do que você já faz."
Boon olhou para ela e dessa vez foi Jewel que desviou os olhos.
"Não me diga que você está querendo jogar sua loja em cima de mim, Jeje. Por favor não me..."
Ela apertou os lábios cor de rosa, fazendo um biquinho, Boon rosnou e se levantou.
"Você me pediu uma grande quantidade de queijos! Eu trabalhei dia e noite para conseguir fazer tudo e agora você franze essa sua boquinha achando que basta fazer isso para que eu..."
"Por favor..." Ela disse, seus lábios tremeram e seus olhos ficaram vermelhos. Boon balançou a cabeça de um lado a outro desanimado. Ele não seria capaz de permitir que ela chorasse. Só olhar o rostinho triste já lhe doía o peito.
"O que eu preciso fazer mesmo?" Ele disse, ela sorriu e limpou o rosto, Boon se sentiu um idiota quando os olhos dela o encararam sem nem um pingo da tristeza de segundos atrás.
"Como eu disse, é só abastecer a loja, fazer os relatórios, assinar os gastos e o lucro, ficar de olho no estoque e se comunicar periodicamente com o gerente humano. O nome dele é Frazer."
Boon ia assentir quando uma ideia lhe passou pela cabeça, Jewel o encarava, seus lábios estavam entreabertos, seus olhos brilhavam, ele se perguntou se teria coragem de sugerir o que sua mente atormentada cogitou.
"E então, Boon? Pode me ajudar?"
"Por... Por um..."
"Você será pago, é claro. Muito bem pago."
"Eu não preciso de dinheiro, já te disse." Boon disse mais para ganhar tempo. Sua mente e seu coração degladiavam dentro dele, sua mente gritava que ele era um idiota e que poderia sair muito machucado por se meter com ela, seu coração dizia que ele nunca teria outra chance.
"Não será por muito tempo. Eu estou negociando vender a loja, mas todos os empresários que entraram em contato ou não são de confiança, ou estão usando o fato de eu ser Nova Espécie para baixar o preço."
Boon rosnou. Ela fechou a boca e se levantou.
"Você vai me fazer ter de abastecer a loja de um humano? Mesmo eu tendo dito que..." Ela o cortou.
"Não. Simple produziu umas receitas para mim, similares às suas e será isso que vou vender a eles. Eles mesmos terão de produzir os queijos. Você pode vender leite para eles, mas só se quiser."
Boon se sentou, ela também e ficaram cara a cara com a mesa entre eles. Ela estava tão perto! Isso não ajudava Boon a pensar claramente.
"Quando Simple fez essa receita? Porque ele a fez?"
Jewel suspirou, piscou e sorriu de forma sem graça, Boon ficou alerta.
"Depois que o Tio Al brigou com você. Ele quis comprar tudo, eu me neguei, ele comprou o prédio onde a loja está e só não me despejou quando eu apresentei a ele uma forma de não precisar dos seus queijos."
Boon olhou para seus pés descalços, ainda sujos de queijo e de doce. Aquele dia tinha sido o pior dia da vida dele. Ele tinha se arrumando todo, feito a barba, vestido sua melhor roupa e tinha ido entregar os queijos. Chegando na loja, ele entrou pelos fundos e organizou tudo no grande depósito refrigerado. Os doces, ele e Jewel colocaram nas estantes de exposição, Boon tinha até trazido um conjunto de vidro delicado para a área de prova, ele arrumou tudo no aparador, as taças e talheres ficaram lindas e sofisticadas. Quando tudo estava pronto, ele se voltou para Jewel e nunca a viu tão linda.
Seus olhos brilhavam e o sorriso em seu rosto era o mais lindo sorriso que Boon jamais viu. Ela se aproximou dele, ele se esticou, não dava para não se esticar, já que seu corpo todo tremia.
"E agora acho que te devo seu pagamento." Ela mudou o sorriso de enlevado para malicioso, o coração de Boon martelou seu peito.
Boon baixou o rosto até o dela, ela fechou os olhos, Boon hesitou, a vontade de morder os lábios dela apareceu de repente, ele sabia que não era bem isso que ela pensava que ele fosse fazer.
E esse instante de hesitação permitiu que Albert Turner entrasse na loja e gritasse um 'Que porra é essa?', que fez Boon se assustar e rugir, Jewel arregalou os olhos, o velho humano pegou uma cadeira e a jogou no peito de Boon.
"Tio!" Jewel tinha dito, o humano parecia que ia morrer de pé, seus olhos estavam abertos ao máximo de tanta ira.
"Você tinha de ser como Cassie! Tinha de ir atrás desse... De um brutamontes desses! Por que vocês duas não me dão um tiro no peito de uma vez por todas?" Ele esbravejou, mas Boon não queria ouvir nada mais, então saiu em silêncio. Ele dirigiu como um louco pelas estradas até a Reserva, o Tio Leaf ficou olhando assustado para ele quando Boon praticamente não diminuiu a velocidade da caminhonete para passar pelo portão escondido.
Jewel correu para ele pedindo desculpas, mas como o tal Tio Al estava lá na loja? A única explicação era que ela tinha marcado com ele ali bem na hora em que Boon traria os queijos, assim, não haveria beijo. Ele tinha percebido que ela olhava para a porta algumas vezes quando estavam arrumando tudo.
"Você tinha combinado com ele, não tinha? Com o seu Tio."
Ela baixou os olhos. Boon sentiu uma pontada no peito.
"Sim, mas não era para ele chegar naquele momento." Boon se levantou e rosnou, ela segurou uma mão dele.
"Me escuta, Boon, por favor!" Jewel pediu, Boon voltou a se sentar e olhar para os pés.
"Eu fiquei com medo de... De acontecer, Boon. Eu não tenho muito controle de mim mesma quando estou perto de você. Mas eu confiei nos seus instintos e acho que demoramos muito arrumando tudo."
"Como assim? Meus instintos? O que quer dizer?"
"Eu pensei que você sentiria ele chegando. Meu plano era só te beijar, não ir além disso. Tio Al chegaria, mas você o sentiria antes de entrar e me largaria."
"Como você pode ser tão boba?" Boon disse com a cara fechada, Jewel se encolheu, ele rosnou de frustração.
"Você é parente de Simple! Você deveria ter instintos melhores." Ela o acusou.
Boon inspirou com força abrindo as ventas do nariz, olhou para ela e sorriu.
"Quer que eu te diga quantas vezes você se tocou nos últimos dias?" Ele perguntou baixinho, ela estremeceu e cruzou as pernas com força.
"Se... Se você é tão bom assim, como não percebeu o Tio Al?" Ela começou a falar de forma hesitante, mas terminou com o queixo erguido.
"Por que tudo em mim estava focado em você. Tudo, Bebê do Pôr do Sol." Ele disse.
Ela se levantou e deu alguns passos para trás, Boon também se levantou e se esticou.
"Eu faço. Administrarei a droga da loja, mas por um preço justo."
"Diga seu preço." Ela também se esticou.
"Você."

Oi!
Desculpa ter demorado tanto e pelo tamanho do capítulo, mas essa semana terei mais tempo, ok?❤️


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