2. capítulo onze

7 2 1
                                    

ㅤㅤㅤCom cuidado, destrancou a porta do apartamento evitando ao máximo fazer qualquer barulho para anunciar sua chegada. Não sabia o que ou quem estaria esperando. Ninguém, Alice, ninguém está aqui, garantiu-se pela milésima vez irritada, mas era difícil acreditar em si mesma quando era acompanhada constantemente por vultos em sua visão periférica.

ㅤㅤㅤEntrou de baixo do chuveiro ainda vestida e permitiu a água gelada escorrer por sua cabeça, colando o tecido no corpo à medida que se espalhava. Seu corpo estava dormente e a mente enevoada, as lágrimas se acumulavam antes de escorrerem com a água, tão silenciosas que Alice nem mesmo tinha consciência delas.

ㅤㅤㅤO silêncio era significativo até demais, permitindo que conseguisse visualizar seus pensamentos com clareza, coisa que não conseguiu durante o dia conturbado. Isso não pode ser real, afirmou ao fechar o registro e se sentar no canto do box com os joelhos apertados contra o peito, os olhos fitavam o vazio sem expressar uma única emoção.

ㅤㅤㅤUm calafrio percorreu seu corpo com violência, mas sua expressão continuou serena e os olhos distantes como se ela não estivesse ali, de fato. Diante de si, enxergava as palavras escritas com delicadezas e as ameaças ocultas em meio aos floreios da caneta.

ㅤㅤㅤApós o colégio, Lucas se prontificou a acompanhá-la até a oficina onde o carro supostamente estava, mas ela rapidamente recusou por não saber como explicar que nunca houve problema nenhum.

ㅤㅤㅤEle ficaria feliz por aquela mentira?

ㅤㅤㅤ― Não adianta fugir. ― Os lábios formaram as palavras, mas nenhum som foi emitido.

ㅤㅤㅤIsso não é real, mas parecia demais.

ㅤㅤㅤPrecisava ter certeza.

ㅤㅤㅤRuminava a ideia em sua cabeça em silêncio ao se despir, mas começava a se sentir desconfortável com a sensação constante de estar sendo observada. Sentia os olhos negros espiando por entre as curvas de seu cérebro, acompanhando cada movimento feito ao se despir das roupas encharcadas.

ㅤㅤㅤAlice não conseguia decifrar se eram os olhos reais ou a imagem que seus pesadelos criaram baseados nos olhos do abutre. Distraída, se lembrou do braço forte envolvendo sua cintura, a proximidade entre os corpos e os dedos ao redor do seu cotovelo; um calor subiu por seu pescoço e ela se sentiu envergonhada.

 ㅤㅤㅤO que eu faço agora?, as palavras se repetiam várias e várias vezes quase palpáveis diante de seus olhos, acendeu um cigarro e foi até a janela, observando o chão alguns metros abaixo e a urgência de ir ao seu encontro foi tentadora.

ㅤㅤㅤVestiu suas roupas usuais de trabalho e quando foi pegar seu casaco em cima do sofá, seu estômago revirou quando viu, pela visão periférica, o post-it verde fluorescente grudado na tela da televisão. Com a boca seca, engoliu com dificuldade e se aproximou, pegando o papel entre os dedos.

Não fique com medo.

ㅤㅤㅤ― Isso não tem graça. ― Exclamou irritada, olhando ao redor como se estivesse rodeada por espectadores. Seu coração palpitava ferozmente contra o peito e ela sentia o tremor se alojando nos membros. ― Vai se foder. ― Cuspiu, amassando o papel e batendo a porta ao sair.

ㅤㅤㅤSentia o espreitador nas suas costas e o barulho das chaves tintilando em suas mãos quando procurava a certa fez o sangue ferver, a agonia crescia com a necessidade de sair daquele lugar o mais rápido possível até que ela bateu com as mãos espalmadas contra a porta até sentir suas palmas arderem e um grito escapar de sua garganta.

ㅤㅤㅤ― Tá tudo bem, Quinn?

ㅤㅤㅤSe virou assustada, não ouviu a porta do lado abrindo.

ㅤㅤㅤ― Você viu alguém por aqui quando eu estava fora? ― Alice indagou endireitando a postura e a encarando com os olhos arregalados. ― Alguém diferente?

o diário de alice taylor.Onde histórias criam vida. Descubra agora