2. capítulo seis

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ㅤㅤㅤDurante as semanas seguintes, Alice amanhecia em um constante mal-estar que parecia durar para sempre.

ㅤㅤㅤSentia-se sufocada nos corredores do colégio por onde andava como uma fugitiva, sempre olhando por cima do ombro, na esperança de nunca mais topar com seu professor substituto; os rostos caricatos pousados em seus ombros observavam os arredores para garantir de que todo perímetro estava sendo assistido e que ela estava salva.

ㅤㅤㅤQuanto mais se prendia a esse pensamento de evitá-lo, mais ela começava a encontrar olhos negros a encarando em meio a multidão de alunos dos quais as vozes se misturavam com as de sua cabeça. Apesar de todo o esforço, não conseguia escapar do primeiro horário toda terça-feira sem que isso prejudicasse seu desempenho escolar mediano de faltas.

ㅤㅤㅤAmélia estava fissurada no Sr. Evans assim como metade das garotas do colégio que se reuniam em grupinhos em frente a porta da sala dos professores na esperança de dar uma breve espiada no homem. Aquilo influenciou sua presença na sala de aula e a garotinha tímida que Alice conheceu começou a se sentar na primeira fileira, tornando comum o braço escondido pelo casaco militar erguido e a vozinha fina fazendo alguma pergunta ou complementação.

ㅤㅤㅤAlice se sentia estranha quando seus olhos cruzavam com os de Amy e o rosto vermelho abaixava tímido para quebrar aquele contato, aquilo causava uma sensação tremendamente incomoda no seu peito que ela não conseguia explicar com palavras, mas sabia de uma coisa: não estava gostando daquilo.

ㅤㅤㅤ― Na verdade, ele é professor na universidade, mas está quebrando um galho aqui. ― Comentava durante os horários de almoço. ― Será que é casado?

ㅤㅤㅤ― Não vi nenhum anel. ― Verona comentou.

ㅤㅤㅤ― Homem mau caráter é assim mesmo. ― Liz disse em meio a fumaça do cigarro. ― Ouvi dizer que ele gosta de se pegar com as alunas da universidade.

ㅤㅤㅤ― Falaram que ele deu carona pra Natasha semana passada.

ㅤㅤㅤNão se passou nem um mês e você já tem essa má fama?, Alice o julgou mentalmente lembrando-se da proposta que foi feita - reforçando ainda mais os boatos que ouvira na mesa. Seu silêncio fez com que as garotas perguntassem sua opinião sobre o homem, Alice respondeu que precisava encontrar Lucas antes que o intervalo acabasse.

ㅤㅤㅤSe retirou porque o tópico a enjoava, entre todos aquelas vozes e pensamentos confusos a respeito dele havia outra coisa que a incomodava, algo tão íntimo, tão vergonhoso que não se atrevia nem a pensar sobre e qualquer menção de seu nome trazia o sentimento à tona.

ㅤㅤㅤPobre criança perversa...

ㅤㅤㅤQuando o olhava não via o professor Klaus Evans que elas admiravam, Alice Taylor via os chifres desenhados em meio aos seus cabelos compridos e os buracos-negros que eram suas orbes se assemelhavam com olhos famintos.

ㅤㅤㅤA voz queria seu mal.

ㅤㅤㅤQuando ouvia sua voz durante a aula, conseguia se lembrar com clareza da primeira vez que o ouviu em meio a uma música do Roxette, da palpitação em seu peito e da constante sensação de que algo estava errado.

ㅤㅤㅤ"Eu também gosto de jogar, Alice"

ㅤㅤㅤQuando ele chamava seu nome, lembrava da mão grande se fechando em torno de seu pulso para que ela não se afastasse, lembrava dos lábios contra sua orelha, da barba rala contra seu rosto e do que sentiu ao encarar os olhos negros.

ㅤㅤㅤ"Você não está com medo?", a voz perguntava em fragmentos de sua memória que se misturavam com seus pesadelos, criando uma realidade alternativa que dificultava a compreensão, a ordem cronológica e a certeza do que aconteceu naquela noite.

o diário de alice taylor.Onde histórias criam vida. Descubra agora