XXI

21 4 1
                                    

A escuridão ao nosso redor parecia se tornar mais densa a cada segundo. O som que ouvimos era diferente de tudo que já tinha experimentado. Era um ruído gutural, um rosnado baixo que reverberava nas paredes da sala das esferas, como se a própria estrutura estivesse viva e tremesse de medo. Meu corpo todo se arrepiou e uma sensação de pânico começou a apertar meu peito. Eu sabia que o que quer que estivesse produzindo aquele som, não era algo com que se deveria brincar.

Asher estava ao meu lado, os músculos tensos e os olhos fixos na direção do som. Apesar de sua expressão calma, havia algo de sério em seu olhar, como um predador que percebe uma ameaça e já se prepara para atacar. Ele estende o braço, apertando minha mão com a sua, e eu sinto a força e a segurança que emanam dele. Mas, mesmo assim, a incerteza me consumia.

- Isso é... Uma sombra? - Minha voz sai baixa, quase sussurrada, temerosa de que a própria pergunta pudesse atrair o monstro.

Asher nega com a cabeça, sem tirar os olhos do corredor à frente.

- Não. - Sua voz estava baixa, mas havia uma firmeza que me fez gelar ainda mais. - Isso é algo um pouco mais apavorante do que uma Uldra.

Minha mente rapidamente se ocupou em tentar imaginar o que poderia ser mais apavorante do que as sombras. O fedor nauseante que emanava do corredor à nossa frente começou a se intensificar, fazendo meu estômago embrulhar. O cheiro de carne podre e algo metálico, como sangue estagnado.

- O que é? - perguntei, engolindo em seco, tentando manter a voz firme.

- Eles são rapidamente identificados pelo cheiro. - Ele me puxa para mais perto e sinto o calor em sua mão contra a minha já fria. - Apenas mantenha-se perto de mim.

Eu assinto, tentando controlar a náusea que subia pela garganta. Cada passo que dávamos parecia ecoar no ambiente, e o som parecia chamar atenção do mostro que rosnava e se misturava ao som do arrastar de ossos, um barulho que era ao mesmo tempo, seco e lamurioso.

Quando finalmente nos aproximamos de uma das fileiras de esferas, eu vi. Entre as frestas, uma forma distorcida se movia. A princípio parecia humano, mas a ideia rapidamente se dissipava conforme eu o observava, era algo que nenhuma mente sã poderia aceitar como tal. A criatura era composta puramente de ossos negros, como se carbonizados, cobertos por uma pele esticada e ressecada que lembrava couro velho, quebradiço e enegrecido com fissuras e buracos. Está pele parecia ter sido arrancada de um cadáver em decomposição, esticada sobre a estrutura óssea de forma grotesca, deixando entrever as juntas esqueléticas por baixo onde sua sombra parecia rastejar juntamente e pulsar. Além de vermes, se alimentando da carcaça de quase 4 metros de altura.

Seus olhos eram buracos ocos, abismos de escuridão que pareciam sugar a luz ao seu redor, como se a própria existência da criatura devorasse qualquer traço de luminosidade ou esperança. O rosto, uma máscara cadavérica de desespero, as bochechas estavam afundadas, a boca entreaberta em um grito silencioso, com dentes afiados e desiguais. As narinas eram apenas fendas estreitas em uma face com expressão de sofrimento eterno. Era a coisa mais horripilante que já havia visto, mais que as sombras. O simples olhar para aquela figura me fez sentir uma onda de vertigem, como se o chão estivesse girando sob meus pés.

O cheiro ficou ainda mais insuportável. Eu senti a bile subir a garganta e instintivamente levei a mão para cobrir o nariz e boca, tentando bloquear o máximo possível o fedor sufocante.

- Estenda o braço e tape o nariz, o máximo que puder. - Asher ordenou com um tom de voz que não admitia questionamentos.

Ele soltou minha mão, me fazendo sentir a leve ausência de seu toque e começou a caminhar em direção ao monstro. A segurança com que ele se movia era quase desconcertante, como se a criatura à nossa frente não fosse mais perigosa do que uma simples mosca irritante. Mas eu sabia que não era esse o caso. Asher não tinha medo, ou ao menos não demonstrava, e isso só servia para aumentar meu próprio terror.

Reino de sonhos e sombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora