XL

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Assim que acordei novamente, a luz do dia ainda atravessava o quarto com a mesma intensidade sufocante de antes. Eu queria fechá-los de novo, afundar na inconsciência e esquecer de tudo, mas a realidade me atingiu como um soco no estômago.

As lágrimas começaram a descer, uma após a outra, sem que eu pudesse controlar. A dor era mais leve em meu corpo, como se tivesse sido curada dos ferimentos por debaixo da enfaixada em meus braços e pernas. Que ridículo... Pensei. O interno, pelo contrário, não foi curado. Meus ombros estremeceram e logo meu peito inteiro parecia estar se comprimindo em um nó doloroso. As lembranças invadiram minha mente, vívidas e imparáveis. Não era só um sonho ou um pesadelo distorcido. Era real, era como se estivesse lá ainda, acontecendo de novo, naquele momento, sentindo tudo mais uma vez.

Oliva... A dor da perda veio com uma intensidade brutal. Ela era minha irmã, minha amiga. E agora... Ela não estava mais aqui. Era estranho, não conseguia entender como tudo ainda poderia existir sem ela. Como eu podia estar deitada aqui, enquanto ela... Não. Era insuportável.

Meu corpo começou a tremer com a intensidade do choro, e antes que eu percebesse, estava sentada na cama, o peito arfando. Meus olhos, cheios de lágrimas, se voltaram para as minhas mãos, e o pânico me tomou.

Elas tremiam tanto, como se refletissem o caos que vivia dentro de mim.

Eu me lembrava de tudo agora. De cada detalhe. De como perdi o controle. Como meu poder havia me transformado. Eu era... um monstro. Todos me disseram isso, e, naquele momento, sabia que tinham razão. Uma maldição. Ninguém deveria ficar perto de mim.

As cinzas, eu as vi. As cinzas dos guardas que eu matei sem hesitar e sem saber como. Eles tentaram me segurar, e em segundos... em segundos, estavam mortos. Havia me libertado da magia de Kyler ferozmente como se fosse uma simples linha ao redor de meus pulsos, e em seguida meu corpo começou a agir por conta própria, como se estivesse faminta por violência. E o mais terrível de tudo... Eu queria mais. Queria matar todos que estavam ali. Sentir suas vidas escaparem de seus corpos. Era isso que me tornará?

As lágrimas caíam incessantes. Minha respiração vinha em soluços irregulares, e eu me sentia perdida, afogada nesse mar de culpa e dor. Não tem como voltar atrás... Disse, olhando para minhas mãos ainda trêmulas, na ilusão de que estavam sujas de sangue. Já não sabia quem eu era.

Uma batida suave na porta me fez voltar a realidade de onde estava. Eu não consegui reagir a princípio. Mas, então a porta se abriu devagar, e Jaeson entrou, seus passos hesitantes ao olhar para mim ali.

Ele se aproximou lentamente, seus olhos cheios de compreensão. Eu não disse nada, e ainda assim ele me abraçou, apenas me envolvendo em seus braços. E foi como se aquele simples gesto quebrasse uma última barreira dentro de mim, e eu desabei de vez, me afundando em seu abraço, as mangas de sua camisa e o couro.

- Eu sei - ele disse, a voz baixa e cheia de dor. - Sei o que aconteceu. Sei que Oliva... - Ele parou, como se dizer as palavras em voz alta fossem torná-las ainda mais dolorosas. - Ela se foi.

Ele também sentia a perda, tanto quanto eu. Não era só minha dor, era nossa.

- Todos estamos aqui, lá embaixo - ele continuou enquanto me segurava. - Vai ficar tudo bem.

Eu queria acreditar nas palavras dele. Queria desesperadamente acreditar que, de algum jeito, isso passaria, que eu conseguiria superar. Mas como poderia? Sabendo o que fiz...

Ainda chorosa em seu abraço, senti uma onda de emoção nova crescer dentro de mim. Jaeson fora o único que havia me visto crescer, antes de Oliva, o único que esteve ao meu lado desde que era pequena. Ele sempre esteve lá, como uma presença constante e protetora, ele fazia o que podia por mim. E agora, com Oliva... Ele era tudo o que me restava, minha família mais preciosa. Não era algo que eu tivesse pensado antes, mas ali, entendi. Ele era como um pai. Sempre foi, e sentia falta de Oliva. Sabia que sim.

Ele também estava de luto, e, de alguma forma, aquele abraço nos conectava de uma maneira que eu nunca tinha percebido antes.

- Não sei como continuar, Jaeson - Sussurrei entre soluços, minha voz falhando. - Eu sou... um monstro. Eu matei e depois quis matar mais. Como eu posso ser quem eu era antes, depois disso?

Ele pousou suas mãos em meus ombros firmemente e me olhou nos olhos. E suas palavras soaram como um escudo em mim.

- Você não é um monstro Healyn. Eu te conheço. Sei que você está lutando com isso, e sei o que está sentindo. Mas você não é o que eles dizem. É mais forte e mais digna do que pensa.

Eu o escutei, mas o peso de minhas ações ainda me esmagava. Eu não sabia se Jaeson estava certo. Não sabia se agora conseguiria me ver de outra forma, além do que eu tinha me tornado naquele momento.

Ficamos ali, em silêncio, por um tempo que pareceu eterno até que eu me acalmasse e ele saísse do quarto me permitindo ficar sozinha um pouco mais.

Reino de sonhos e sombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora