Quatro

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Naquele dia, Jisung estava longe. Fisicamente, ele estava sentado à sua mesa, o computador aberto à sua frente, mas sua mente vagava por pensamentos que ele não conseguia afastar. Ele trabalhava como produtor em uma agência de música em Nova Iorque, uma oportunidade que ele agarrara com seus melhores amigos de longa data, Chan e Changbin. Os três eram inseparáveis desde os tempos da Coreia do Sul, e agora dividiam o sonho de produzir música nos Estados Unidos. No entanto, nem mesmo o ambiente criativo e o apoio de seus amigos conseguiam afastar os pensamentos que o atormentavam.

Chan, que estava sentado a poucos metros de distância, percebeu a inquietação de Jisung. Ele o conhecia bem o suficiente para saber quando algo estava errado. Levantou-se e foi até Jisung, apoiando-se na mesa ao lado dele.

— Jisung, você tá aí? — Chan perguntou, em um tom brincalhão, mas com uma preocupação evidente.

Jisung piscou algumas vezes, como se estivesse voltando à realidade, e olhou para Chan com um sorriso fraco.

— Ah... desculpa, Chan. Tô meio avoado hoje.

Chan cruzou os braços, estreitando os olhos.

— Não me diga. Eu já te conheço, cara. O que tá acontecendo?

Jisung hesitou, não querendo expor demais o que estava sentindo. Mas Chan sempre tinha uma maneira de fazer com que ele se abrisse.

— É o Felix, não é? — Chan perguntou diretamente.

Antes que Jisung pudesse responder, Changbin, que estava do outro lado da sala, se aproximou com sua caneca de café.

— Eu sabia que tinha alguma coisa a ver com ele. Você tá com essa cara de quem tá pensando demais desde o começo do dia.

Jisung suspirou, balançando a cabeça. Era impossível esconder qualquer coisa daqueles dois.

— É só que... — Jisung começou, procurando as palavras certas. — Às vezes, eu não sei se ele realmente me ama, sabe?

Changbin arqueou as sobrancelhas, surpreso.

— O que você quer dizer com isso? Vocês estão juntos faz tempo, né?

— Sim, faz quase 1 ano. Mas ele nunca disse que me ama. — Jisung desviou o olhar para a janela, onde o céu cinzento refletia seu humor. — Ele só diz "eu gosto de você". Nunca "eu te amo". E isso me deixa pensando se algum dia ele vai me amar de verdade ou se... se ele ainda está preso no passado.

Chan e Changbin trocaram olhares. Eles sabiam sobre a história de Felix com Hyunjin, o marido falecido, e como isso ainda afetava Jisung, mesmo que ele tentasse não demonstrar.

— Cara... — Chan começou, sua voz suave e ponderada. — Isso é complicado. Felix passou por muita coisa, e todo mundo lida com a perda de um jeito diferente. Mas eu entendo por que isso te incomoda. Você quer ouvir que ele te ama. É normal.

Changbin assentiu, concordando.

— Eu também acho que não dizer "eu te amo" pode ser frustrante. Você merece isso, Jisung. Merece alguém que te ame de verdade.

Jisung passou as mãos pelo cabelo, um gesto que fazia sempre que estava ansioso.

— Eu sei que ele gosta de mim. Mas, às vezes, parece que... eu tô competindo com um fantasma. — A voz de Jisung falhou levemente, mas ele disfarçou. — Eu sei que Hyunjin foi importante pra ele. É difícil pra ele. Mas e eu? Eu sou importante o suficiente?

Chan colocou uma mão no ombro de Jisung.

— Olha, você é importante. Muito importante. Mas talvez Felix ainda esteja lidando com isso. A questão é, você quer continuar esperando que ele te diga "eu te amo"? Ou você precisa de uma resposta agora?

Jisung olhou para Chan, pensativo. Ele não queria forçar Felix a dizer algo que ele ainda não estivesse pronto para dizer, mas também não podia ignorar o vazio que essa ausência de palavras deixava.

— Não é que eu precise ouvir isso agora... — Jisung começou. — Mas eu preciso sentir que ele está comigo, que ele me vê. Que eu não sou só alguém pra preencher o espaço que Hyunjin deixou.

Changbin, que até então estava em silêncio, deu um longo suspiro antes de falar.

— Às vezes, as pessoas ficam presas no passado porque têm medo de deixar ir, sabe? E isso pode estar acontecendo com Felix. Ele pode não estar pronto para abrir espaço completamente para outra pessoa, mas isso não quer dizer que ele não goste de você. Talvez ele só... ainda não tenha aprendido a amar de novo.

Jisung ficou em silêncio por alguns instantes, absorvendo as palavras dos amigos. Ele sabia que Felix tinha um coração enorme, mas também sabia que esse coração ainda estava machucado.

— O que eu faço, então? — Jisung perguntou, com a voz baixa.

Chan deu um sorriso encorajador.

— Conversa com ele. Senta e fala de verdade o que você sente. Deixa ele saber que isso te afeta. Vocês têm uma relação sólida, Jisung. Não deixa o medo de falar o que sente estragar isso.

Changbin completou.

— E, se ele não estiver pronto pra dizer "eu te amo" agora, pelo menos você vai saber onde está pisando. Às vezes, as coisas precisam de tempo.

Jisung assentiu, sentindo o peso da situação em seus ombros. Ele sabia que teria que ter aquela conversa com Felix, mesmo que fosse difícil. Sabia que não podia mais ignorar a constante dúvida em seu coração.

— Valeu, galera. — Jisung sorriu, mesmo que fosse um sorriso pequeno e incerto. — Acho que vou tentar falar com ele hoje à noite.

Chan bateu de leve nas costas de Jisung.

— Isso aí, irmão. Vai dar certo. E lembre-se, a gente sempre tá aqui se você precisar desabafar de novo.

Changbin acenou com a cabeça.

— A qualquer hora. Sabe disso.

Jisung deu um último gole no café que já estava morno, respirando fundo. Hoje à noite ele iria abrir seu coração, mas, até lá, precisava se concentrar no trabalho.

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