NICOLE SCHILLER
A luz do dia, a cidade parecia até habitável. Mesmo em meio aquela neblina que escondia o sol, o lugar tinha seu charme com a movimentação matinal.
As lojas abriam as portas, os guinchos das gaivotas se misturavam ao tilintar dos sinos, que tocavam conforme os funcionários entravam. Cavaletes com quadros rangiam ao serem arrastados para a calçada, de onde já tinha alguns comerciantes anunciando os peixes e frutos do mar frescos.Havia vida pulsando nas ruas.
— Veja que belo casal.— Disse uma senhora de cabelos brancos e bochechas salientes.
Nós estávamos passando ao lado de sua barraquinha cheia de chapéus coloridos, quando ela deu a volta e nos alcançou, seus passos rápidos contrastando com sua aparência frágil.
Ela atravessou nosso caminho antes que pudéssemos sequer desviar o olhar, os olhos dela focados em nós enquanto erguia os chapéus como se fossem troféus.
— Por que você não compra um belo chapéu para sua linda esposa, meu jovem? — disse para Bruno, em tom quase conspiratório, já me entregando os modelos com precisão cirúrgica.Antes que eu pudesse responder, um dos chapéus, de um azul marinho delicadamente entremeado com linhas brancas, foi colocado em minhas mãos, seguido rapidamente por outro de cores mais quentes. Ela observava com o olhar treinado de quem sabia que causar indecisão é a melhor arma de uma boa vendedora.
— Esse azul e branco combina muito com o vestido dela — completou, dando um sorriso astuto.
Bruno me olhou atordoado. Mas antes que ele pudesse formular qualquer pensamento ou protesto, ela foi mais rápida.
— Não pense muito, meu jovem — disse ela, com uma voz firme e ao mesmo tempo acolhedora. — As mulheres gostam quando seus homens são decididos, e um presente sempre traz prontos positivos.
Ela deu um leve arqueamento de sobrancelhas, o tipo de gesto que trazia consigo décadas de experiência e um conhecimento quase profético da arte de persuadir. Bruno, ainda desconfortável, parecia estar lutando contra as palavras, mas a senhora não deu trégua.
— E pelo que vejo nos olhos de ambos, há muito amor aqui — continuou, sua voz baixa, como se estivesse revelando um segredo. — Mas... algo me diz que estão brigados.
Ela estreitou os olhos como se pudesse enxergar além das palavras não ditas, e seu sorriso se alargou de maneira quase teatral. Era impossível não sentir um calor subir por minhas bochechas.
— Aproveite a chance de abrir o caminho para a reconciliação. Sabemos que é a melhor parte.
Dessa vez, senti Bruno se enrijecer ao meu lado. Ele, que até então tentava se manter em silêncio, reagiu de maneira imediata, como se aquela frase fosse o ponto de ruptura.
— Nós somos irmãos — ele disse, de forma seca e direta.
E o tom firme da declaração parece estalar como um chicote no ar, cortando a expectativa da senhora. Ela piscou, a expressão que antes transbordava autoconfiança agora se tornava neutra, como se estivesse tentando recalcular suas suposições. Algo não encaixava na cabeça dela, isso era óbvio, mas ela não conseguiu esconder o breve lampejo de surpresa.
— De mães diferentes — Eu me vi obrigada a acrescentar, tentando justificar o que, provavelmente, ela tinha achado estranho em nossa aparência tão distintas.
Houve um momento de silêncio constrangedor, mas não durou muito. A senhora demorou mais um segundo, e então, como uma profissional veterana, recuperou sua compostura, pronta para continuar sua venda com a mesma energia de antes.
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O Abismo dos Desejos Proibidos
RomanceBruno Hughes é gostoso, elegante, engraçado, e tem um olhar que pode derreter aço. E Nicole Schiller tem uma queda pelo melhor amigo de seu irmão desde que se lembra. No aniversário de dezesseis anos dela ele faz uma promessa, e ela espera pacientem...