Capítulo 65

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Liam Rodrigues

O Afonso estava furioso; sua expressão era um misto de indignação e constrangimento. Ele puxou Maria Clara pela mão, saindo quase correndo, como se quisesse deixar para trás não só a situação, mas também a humilhação.

Quando olhei para Priscila, algo em mim se partiu. Ela estava parada, como se o chão tivesse desaparecido sob seus pés. Seus olhos, sempre tão firmes, agora estavam perdidos, confusos. Mas, em segundos, a vulnerabilidade deu lugar a algo mais duro: mágoa e raiva.

— Quem foi o cérebro desta brincadeira de mau gosto? — sua voz saiu alta, cortante, como um chicote que estalava no ar. Ela estava vermelha de raiva, e as crianças, que ainda riam há pouco, se calaram instantaneamente. — Quero saber agora! Se ninguém falar, vou punir todos da pior maneira possível.

O silêncio que se seguiu era pesado. Ninguém tinha coragem de encará-la. Eu também não. Afinal, eu era tão culpado quanto eles, talvez até mais.

Priscila respirou fundo, tentando manter o controle, mas era evidente que estava à beira de um colapso. Sua voz, quando voltou, estava mais baixa, mas carregada de dor.

— Vocês pensaram em mim? Alguma vez passou pela cabeça de vocês o que isso significaria para mim? — Sua voz tremeu, e seus olhos brilharam com lágrimas contidas. — Este é o meu trabalho. Eu me esforço todos os dias para manter a minha posição, para garantir o melhor para vocês, e vocês simplesmente jogam tudo isso no lixo?

Ela fez uma pausa, olhando para cada um de nós, mas nenhum de nós teve coragem de responder.

— Será que a idiota da tia de vocês merece perder um cliente? Será que ela merece ser humilhada? Vocês sabem o quanto eu lutei por esta promoção, por este contrato! — Sua voz começou a falhar, e uma lágrima escorreu por seu rosto. Ela a enxugou rapidamente, tentando não demonstrar o quanto aquilo a estava destruindo. — Aquele homem não é o primeiro a me convidar para um encontro, nem será o último, mas eu nunca permiti nada. Nunca!

Suas palavras eram como facas cravando meu peito. Eu sabia que ela tinha razão. E sabia que eu tinha cruzado uma linha.

— E você, Liam... — Sua voz falhou ao dizer meu nome. Ela desviou os olhos por um momento, mas voltou a me encarar com uma expressão que misturava dor e decepção. — Você...

Ela não conseguiu continuar. Suas mãos tremiam enquanto passava pelos cabelos, num gesto que só denunciava o quanto estava afetada.

— Muito bem. Já que ninguém vai admitir nada, a punição está decidida. Paulo, Gabriel e Katiuscia, vocês estão proibidos de vir aqui. Íris, sem celular, computador ou sair do quarto além do essencial. Ítalo, sem videogame, sem amigos e sem televisão. E você, Belinha, está fora da peça da escola.

Belinha começou a chorar, e aquilo foi como uma lâmina em meu coração.

— Papai! — ela correu até mim, agarrando-se ao meu peito.

Eu não podia deixar aquilo continuar. Era injusto. As crianças erraram, mas a culpa era minha. Eu sabia disso.

— Fui eu, Priscila. Eu coloquei pimenta no café do Afonso. O resto foi acidente. As crianças só me seguiram — confessei, tentando segurar o peso na voz.

Priscila me olhou, incrédula. Por um momento, vi algo quebrar dentro dela. Era como se ela não pudesse acreditar no que estava ouvindo.

— Arrume suas coisas, senhor Rodrigues — ela disse, com a voz firme, mas os olhos marejados a traíam. — Amanhã eu te pago o que lhe é de direito. Você está demitido.

As crianças gritaram ao mesmo tempo, correndo para me abraçar.

— Não! — foi o grito desesperado que ecoou pela sala, mas Priscila permaneceu imóvel, como se estivesse segurando os próprios pedaços para não desmoronar.

Quando ela se virou para subir as escadas, percebi o quanto aquilo a estava destruindo. Suas costas estavam tensas, e os passos, hesitantes.

— Priscila... — tentei chamar, mas ela não respondeu.

Antes de sumir de vista, ela parou no primeiro degrau, segurando o corrimão como se precisasse de apoio para continuar.

— Você me decepcionou, Liam — disse, finalmente, sua voz embargada. — Mais do que eu achei que fosse possível.

Ela subiu as escadas, e eu fiquei parado, sem reação. Sabia que ela estava chorando, sabia que estava doendo nela tanto quanto em mim. Mas Priscila era implacável, e essa era sua forma de lidar com a traição.

No fundo, eu sabia que ela só agia assim porque ainda me amava. E talvez esse fosse o maior motivo para a dor que ela sentia.

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Continua...

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