Capítulo 6

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Christopher Alexander

— Nem fodendo! Nem.Fo.den.do!

É a primeira vez que me intrometo na conversa. Scott e Dulce fixam seus olhos em mim ao me ouvirem gritar, nem um pouco surpresos. Porra, não sei como ela não está gritando.

— É, é. Essa é uma ideia genial — meu empresário continua falando consigo mesmo, perambulando de um lado para o outro no quarto de hotel. — É uma ideia incrível!

— Não, não é não — é a vez de Dul intervir, igualmente chocada como eu, mas mais contida. Talvez seja pelo fato de ele ser seu chefe. Ou de ela o respeitar mais do que eu respeito. — Scott, isso é um absurdo!

— Não, não é não — ele repete suas palavras, cada vez mais formulando a história na sua mente fértil. Não sei como ele nunca escreveu um livro. — É bem simples. Você, Dulce, é uma mulher mais reservada — Scott vai até sua direção, olhando fixamente para ela — e não gosta de aparecer na mídia. Enquanto seu namorado, Christopher Alexander, está sempre atrás de um holofote. Até mesmo nos locais públicos vocês preferem se manter distantes para não causar alvoroço na mídia. Porém, em uma festa específica, a festa do final da turnê, uma fã descontrolada acaba te atacando ao te ver discutindo com o Alex. Coisas de casal, vamos assim dizer. Ele continua formulando o enredo com empolgação, se sentindo o homem mais inteligente do mundo. — Vocês namoram há um bom tempo em silêncio. E o encerramento da turnê foi justamente
pelo fato de que ele batia com a data do casamento. Soltamos a data em entrevista e pronto! Meu astro do rock fica com a imagem limpa.

— Tá, mas você já parou para pensar na quantidade de mulheres que dormiram com esse canalha nos últimos meses? — ela pergunta, olhando para mim com nojo. — Eu vou ser uma mulher publicamente corna?

— Isso não importa, Dulce.

— É claro que importa! O meu futuro e minha reputação estarão em jogo. Minha vida não é um brinquedo que vocês podem controlar.

— Acredite, a última coisa que eu quero é me meter na sua vida — murmuro descontente. — Ela tem razão, Scott. Eu fui visto com várias mulheres, essa história não vai colar.

— Pagaremos alguns paparazzis e revistas para dizerem que não passavam de mentiras. Fotos? Montagem. Vamos disparar um milhão de edições de vocês juntos, andando pelas ruas. Ninguém se lembrará desses detalhes. E outra, os astros do rock traem o tempo todo.

— É claro que traem. — Revira os olhos, impaciente com a conversa. — E como esse
“relacionamento” começou? Nunca fomos vistos em público antes!

— Vamos dizer que foi um amor súbito, repentino. Inimigos para amantes, o público adora essas coisas. Vocês irão alegar toda essa história de ódio e blá-blá-blá, mas no fim, dirão que acabaram percebendo que foram feitos um para o outro.

— Não vejo como isso me traz algum benefício — interfiro na conversa, cruzando meus braços. — Isso tudo é baboseira, Scott. Ninguém vai acreditar nessa merda.

— Ah, não? Então me dê uma ideia melhor! — Ele me encara, desafiando-me com suas
palavras. — Me diga, Alexander, o que seria mais original? Mais bem pensado?

— Qualquer coisa que não envolvesse um casamento! — retruco, subindo meu tom de voz. — Porra, isso é uma coisa séria. Eu quero me casar um dia, sabia? Mas não com ela!

— E muito menos eu quero me casar com ele!

— Viram só? Vocês já até concordam em alguma coisa. — Sorri, me deixando ainda mais irritado. — É óbvio que não será um casamento verdadeiro. Quer dizer, vocês terão de assinar no cartório e todo aquele blábláblá, mas são apenas detalhes jurídicos. Faremos um contrato de seis meses, apenas para não causar tanto alvoroço. Vocês estarão casados até o dia em que a banda retornar das férias, esticar mais três meses fará bem a todos vocês. Depois disso, boom, lançamos o divórcio na mídia com a nova discografia. Caramba, será um sucesso! Músicas sofridas para lá e para cá, os jovens adoram essas coisas. Deus, é a jogada de marketing do século!

— Você não está pensando direito, Scott. — Dulce tenta abrir os olhos dele como se estivesse falando com uma criança: calma e com a voz baixa. — Isso... isso é uma loucura. Não posso me casar com ele, não quero me casar com ele.

— E sabe o que eu não queria, Dulce? Ter de fazer o seu trabalho por nós dois! — Pela
primeira vez na vida, vejo meu empresário sendo um escroto com ela. A garota logo se encolhe, engolindo em seco. — Vocês dois me devem isso. Christopher pode dever muito mais, mas você estava lá. Você que me prometeu ficar de olho em cada passo que esse moleque dava, e falhou miseravelmente.

Todos nós ficamos em silêncio. Scott intercala seu olhar entre mim e ela, buscando por reações.

Olho para Dulce, mas ela não me olha de volta. Parece estar pensando. Buscando
soluções, ideias, qualquer coisa que não envolva nós dois em uma igreja, declarando votos falsos e mentirosos.

— É só um contrato, Dul. — Ele se abaixa para falar com ela, agora menos eufórico. — Você assina, e quando vocês se divorciarem, Christopher te paga uma indenização por ter de aturá-lo por seis meses.

— Não vou pagar porcaria nenhuma.

— E eu não quero um centavo vindo dele.

— Argh, que seja! — Bufa exaurido. — Tanto faz, eu não ligo para esses detalhes jurídicos. Só preciso que vocês colaborem. A banda está bombando mais do que nunca, um casamento seria perfeito para limpar a imagem de Christopher e trazer um pouco mais de paz e romance para os fãs. Vocês são como meus filhos. E já tenho duas crianças em casa me esperando. Preciso de uma
garantia que você, Alexander, não se meterá em confusões por um longo tempo. E eu sei que você, Dulce, dá conta do recado.

Odeio admitir, mas parte de mim sabe que ele tem razão.

Meu nome nunca esteve tão mal falado na mídia – e não por conta de mulheres “atuais”. Por conta de rumores antigos, envolvimento com bebidas, drogas... porra, eu não costumo ser assim.

Desde quando começamos a cantar, prometemos a nós mesmos que seríamos diferentes. Que viveríamos apenas para passar a nossa mensagem ao público, sem nos deixarmos levar pela luxúria e malícias deste mundo. Mas, de todos os integrantes da Furia Azteca, fui o que mais me deixei levar. E agora, estou sem saída.

As pessoas associam o casamento a compromisso, igual relacionamentos – mas um compromisso mil vezes mais sério. Seria bom para mim. Ficar um tempo fora da mídia, dos rumores, dos sites com fotos do meu pau e de garotas jurando por Deus que dormiram comigo quando nunca nem sequer as vi.

Olho para Dulce. Ela está igualmente pensativa, com os dedos apoiados no queixo, olhando fixamente para o chão.

— Por favor, Dulce. É uma ótima solução para limparmos a imagem da banda.

— Por que você não contrata alguma artista famosa? Ou supermodelo? Qualquer mulher no mundo que seja o tipo desse... desse homem, menos eu.

— Porque você é quem está envolvida no escândalo. O fato de ele estar te protegendo nos dá mais credibilidade, sabe disso.

Ela solta um longo suspiro, sabendo que Scott está certo. Posso estar longe de entender sobre mídias sociais e essas coisas, mas o pouco que entendo basta para me localizar diante da situação. Por mais que eu não concorde com essa porcaria, por mais que queira evitar a todo custo estar perto dela, da sua voz irritante e do seu jeito insuportável de se achar dona da razão, admito que ele está certo – o que também me dói como uma facada no peito.

Seguimos ambos em silêncio, sem trocarmos olhares. Scott olha para mim como se me
perguntasse o que eu acho, o que estou pensando de tudo isso. Dou de ombros.

Não quero me casar. Não agora, no auge da minha carreira. Não com ela, uma mulher que nem sequer sei o nome do meio.

Mas se for necessário, se for pela banda, pelo futuro e pela bem do grupo, eu farei.

Não por Scott, não por Dulce, mas sim, por Poncho, Christian e por tudo o que conquistamos ao longo desses anos.

Por eles. Por nós. E não por mais ninguém.

E ele sabe disso.

— Eu não vou participar dessa merda, Scott. Não dá. Simplesmente... não dá.

Antes que meu empresário tenha chance de persuadi-la, Dulce sai bufante do quarto de
hotel, nos deixando a sós. Scott murmura palavras desconexas, xingando consigo mesmo e ajeitando seu terno antes de ir atrás dela, me deixando sozinho novamente.

Isso vai ser muito mais difícil do que eu imaginava.

O SOM DO IMPROVÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora