Capítulo 7

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Dulce María

- Dulce, espere! DULCE!

Scott grita meu nome no meio da rua, como se não se importasse com a atenção de todos - e de fato não se importa.

Depois de ouvir os absurdos que ele nos disse naquele quarto, tudo o que consegui fazer foi fugir.

Não pela porta da frente, é óbvio. Não queria chamar a atenção dos paparazzis que estavam acampados lá feito abutres esperando pela próxima carniça perdida no deserto.

Vim pelos fundos, saindo por um beco, tomando todos os cuidados possíveis para não ser reconhecida.

Pouco adiantou. Ele sabia que eu seria cautelosa ao sair, e seguiu todos os meus passos.

Desgraçado.

Quando estou na metade do caminho, acelerando o passo para ver se consigo fugir do meu chefe, Scott me alcança, pousando sua mão no meu ombro e me forçando a parar no meio do percurso.

- Por favor, Dul. Vamos conversar.

- Não há o que ser conversado! - protesto, falando mais alto do que eu esperava.

Estamos em frente a um café, e vários olhares se dirigem até nós. Por sorte estamos em um bairro mais antigo da cidade, duvido que algum desses velhotes faça ideia de quem somos.

- Não tenho o que falar, Scott. Não vou me casar e pronto.

- Vamos nos sentar. - Ele puxa uma cadeira, sentando-se. Continuo em pé, relutante. - Por favor, Dulce. Já perdi as contas de quantas vezes te direcionei essa palavra. Vamos conversar, somente eu e você. Sem Christopher, sem imprensa, nós dois. Por favor.

Cruzo meus braços na altura dos seios, pensando se devo aceitar ou não. Confesso que esse olhar de cachorro pidão que meu chefe está me fazendo é quase convincente.

Quase.

Odeio gostar tanto de Scott. Odeio que nossa relação não seja apenas chefe-funcionária, e sim de amizade.

Aguentar uma banda de rock com três meninos infernais une as pessoas, ainda que nossa diferença de idade seja grande. Ele poderia ser meu pai - e é quase um.

- Eu realmente não quero fazer isso, Lendger - o chamo pelo seu sobrenome para que ele entenda a seriedade das minhas palavras. - Sou muito nova para me casar.

- Me casei pela primeira vez na sua idade, Espinosa - ele devolve o trocadilho de sobrenomes, convidando-me a sentar. Acabo cedendo, posicionando-me na sua frente. - E foi lindo, mágico e maravilhoso. Um casamento hollywoodiano, se me permite dizer.

- Mas vocês dois se amavam, não é?

Ele para por um instante. Um breve sorriso nostálgico preenche seus lábios, que riem sozinhos.

Não sei muito sobre a vida pessoal de Scott; sei que ele tem uma mulher, duas filhas gêmeas de cinco anos; sei que foi casado antes de conhecer sua atual esposa, como
citado, mas não sei o que aconteceu com a mulher, que provavelmente faleceu; sei que ele se formou com honras em Harvard; sei que conheceu os meninos em um boteco de esquina, enquanto estava de passagem na cidade natal deles; e... é, é isso.

Tudo o que sei sobre o homem que está na minha frente, quase me implorando de joelhos para casar com um homem que odeio.

- Muito. Ela foi o grande amor da minha vida. Sempre será.

- Isso é um bom motivo para casar com alguém: amor. Eu e Christopher nem sequer nos respeitamos. Não quero que meu primeiro casamento seja marcado por isso.

- Não será um casamento de verdade, Dul. Eu prometo. Tudo bem, vocês precisarão assinar documentos pois eles são de domínio público e caso não os mantenhamos registrados podemos levantar suspeitas, mas faremos um acordo com nosso advogado onde a única se beneficiar será você.

- E que tipo de acordo seria? - pergunto por curiosidade.

Ele quase se empolga, mas retoma a postura ao perceber que não aceitei nada.

- Quase que um pré-nupcial, podemos dizer. Você aceitaria passar seis meses casada com Christopher, onde vocês serão fotografados, aparecerão juntos na mídia, essas coisas que fazem as pessoas se apaixonarem. Quando nos reunirmos depois das férias para elaborar o próximo álbum, boom, anunciamos ao mundo o divórcio de Dulce María Espinosa e Christopher Alexander Von Uckermann, o que, consequentemente, resultará em uma discografia toda depressiva e triste da banda. Você ganha parte dos lucros das vendas do álbum. Vinte por cento. Uau. Ele realmente está empenhado em me convencer. Pode não parecer muito, mas se você parar para pensar que a Furia Azteca é uma das bandas que mais vende discos atualmente, sabe que vinte por cento de todos os lucros é muita coisa. Muita coisa mesmo.

Não que eu não seja bem paga, mas isso... isso mudaria a minha vida. Eu poderia fazer muitas coisas além do que já posso fazer hoje em dia.

- Será somente por contrato?

- Sim, apenas um contrato assinado por vocês. Óbvio que ninguém mais saberia além da banda e de nossos advogados.

- E no futuro, como explicarei ao meu futuro marido que sou divorciada? Daquele fodido, ainda por cima?

- Diga que você fez um grande favor a um amigo. - Ele segura minhas duas mãos,
olhando diretamente nos meus olhos. - Sei que isso parece loucura. Sei que você está assustada, pensando no seu futuro, mas pense em como isso seria bom para a banda. E para você. Pense no tanto de empresas que entrarão em contato para te colocar em comerciais, publicidades. Você não queria ser artista?

Nesse momento, me arrependo até meu último fio de cabelo de ter confessado esse segredo a ele. Quando pequena, almejava ser uma grande pintora. Como Frida Kahlo, Gerhard Richter, entre outras. Juntava cada centavo que ganhava para comprar tintas, telas pequenas, tudo escondido. Cheguei mesmo até a pintar a parede do meu quarto, o que, como consequência, me fez tomar a surra mais bem dada que já vi na vida. De onde vim eles não te incentivam a seguir essa carreira. "É impossível", "você não nasceu para isso", "onde já se viu uma garota como você pintar?", entre outros comentários de incentivo. Esse emprego me trouxe muitas oportunidades, mas nenhuma delas perto do que eu realmente queria.

- É um delírio de criança, nem sei se é isso mesmo que eu quero - minto, torcendo para não ser pega no flagra.

Ele parece não acreditar nas minhas palavras mentirosas.

- Tudo bem. Enquanto estava gritando pelo seu nome, pedi para o RH redigir um contrato para você. - Arregalo meus olhos, não conseguindo disfarçar minha surpresa. - É uma breve síntese do que esse casamento seria, está no seu e-mail.

Pego meu celular - que ainda está todo estraçalhado - e olho a caixa postal. Nela, há uma notificação da Carmen, gerente do RH, com os seguintes dizeres:

CONTRATO NUPCIAL - Dulce María e Christopher Alexander.

Sinto meu estômago revirar ao ler o nome de Christopher junto do meu como se fôssemos um casal.

- Antes de recusar, leia e veja tudo o que estamos dispostos a oferecer, com valores e contatos. Esse seria só o começo de mais uma maré de oportunidades que seriam abertas para você.

- Scott, eu...

- Só pense no assunto. E me ligue quando tiver se decidido.

E então, para minha surpresa, ele sai. Scott ajeita seu colarinho antes de me deixar sozinha, caminhando tranquilamente de volta ao hotel, como se não tivesse jogado uma bomba atômica prestes a explodir no meu colo.

Olho para o e-mail. Ler não me fará nenhum mal, afinal. Seria bom matar a curiosidade.

Ver tudo o que está escrito, aceitar que é uma loucura e pronto, dizer que não aceito mais. É, é isso que eu devo fazer.

Peço um café para o garçom e, após respirar fundo, leio o acordo do começo ao fim.

O SOM DO IMPROVÁVELOnde histórias criam vida. Descubra agora