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Lembre-se, Jack. Você não esta mais aqui para ser o garoto popular, mas para concertar seus erros. Foi o que a morte me disse, foi o que eu pensei assim que entrei nos corredores cheios de alunos falsos, mesquinhos, arrogantes e superficiais, era aquilo que eu precisava lembrar. A minha grade de horários indicava que eu teria Biologia como a primeira matéria do dia. Odeio biologia. Caminhei pelo canto do corredor ate entrar na sala com cerâmicas brancas impecáveis de tão brilhantes, as mesas com assentos duplos já havia sido tomadas pela maioria. Havia uma única vazia, não vazia, mas pelo menos com um assento vago, e era ao lado de Avery Miller, que estava com seu cabelo cheio de frizz preso em um rabo de cavalo, ela parecia estar cutucando esmalte velho da unha. Engoli em seco e caminhei envergonhado ate a mesa.

─ Tem alguém nessa cadeira? ─ Perguntou com o livro verde de biologia debaixo do braço.

─ Você vê alguém? ─ Avery perguntou com a voz seca e nem se quer olhando na minha cara. Não acredito que ela disse isso. Eu dei um risinho descrente, mas ela não viu. Sentei-me na cadeira e coloquei o livro de biologia na parte de baixo da mesa, pois a de cima tinha um guardanapo aberto com um sapo enorme e morto de barriga para cima, alem de dois pares de luvas brancas, um bisturi e outra ferramenta que parecia um garfo de ponta única.

─ Bom dia! ─ O professor Carson entrou na sala. Ele tinha o cabelo ruivo cortado bem baixo e usava óculos, parecia bem jovem, talvez um 30 anos. Ele caminhou ate o quadro onde esticou um banner que tinha toda a anatomia do anfíbio. Ele não precisou dizer mais nada. Eu encarei o sapo morto em cima da mesa por alguns segundos. Será que Ela apareceu para o sapo na figura de uma rã e culpou-o por todas as moscas que engoliu. Meu estomago revirou.

─ Todo seu! ─ Falei, empurrando as ferramentas para Avery. Ela colocou as luvas e pegou as ferramentas sem dizer uma única palavra. Eu também coloquei as luvas. Avery espetou a garganta do sapo com o garfo de ponta única e pressionou o bisturi a partir daquele ponto, fazendo um corte em linha reta na pele do anfíbio. Ela observou em silencio, então pegou a folha para anotar alguma coisa com caneta azul. O silencio incomodou-me.

─ Então. ─ Hesitei, mas fui. ─ Você quer fazer medicina? ─ Esperei a resposta, mas Avery ficou me encarando com uma expressão seria. ─ Algo errado? ─ Perguntei.

─ Não. ─ Ela deu um sorriso. ─ Eu só não quero desperdiçar o meu momento de gloria limitada ao seu lado. ─ Entendi. Ela citou o modo como Walter falou com ela e eu não fiz nada para defendê-la.

─ Olha, Walter é um idiota...

─ Não só ele! ─ Avery rebateu voltando a cutucar o sapo. Eu me senti ofendido;

─ Você também é? ─ Retruquei ironicamente, com um sorriso sarcástico no rosto.

─ O que você disse? ─ A voz dela pareceu furiosa quando ela olhou instantaneamente para mim. Eu não tive tempo de responder, fui pego de surpresa por um borrifo de sangue que explodiu no meu rosto. Eca. Foi a primeira coisa que veio a minha mente quando observei o garfo de ponta única espetando uma das artérias do sapo. Precisei pedir permissão para ir ao banheiro.

Eu abri a porta do banheiro masculino quase que com um soco, estava vazio e cheirava a desinfetante de lavanda. Merda. Avery Miller alem de não conhecer o alisamento japonês ainda era cega. Olhei meu reflexo no espelho do meio. Tinha uma linha vermelha que ia de 2 cm abaixo do meu olho ate a parte da minha axila no uniforme. Eu bufei. Peguei uma grande quantidade de papel higiênico e liguei a torneira para molha-lo. Repousei a mão no coração graças ao susto que tive ao olhar para o espelho novamente e ver a pirigotica parada atrás de mim.

─ Para. De. Fazer. Isso! ─ Minha voz saiu falhada no "Isso" e eu tive a impressão de que havia gritado.

─ Você não esta indo bem. ─ Ela caminhou ate ficar do meu lado e me encarou. Eu me virei para ela.

─ Do que você tá falando? ─ Minha voz expressava irritação. ─ Eu tentei ser legal com ela.

─ Não quero que você tente. Quero que você seja! ─ Ela falou sem rodeios.

─ Como? ─ Eu joguei as mãos para cima.

─ Que tal engolir o seu orgulho e pedir desculpas ao invés de colocar a culpa no Walter? ─ Ela sugeriu com um sorriso insensível.

─ Desculpas pelo que? ─ Eu esbravejei. ─ Não foi minha culpa.

─  Jack, faça o que eu digo. ─ Ela reclamou. ─ Ou vai desejar que eu antecipe a sua morte. ─ De repente a pirigotica não estava mais lá. Eu fiquei encarando o nada e o único barulho era o da torneira que eu havia deixado ligada e não havia me dado conta. Eu me remechi e decidi voltar para maldita sala de aula. Empurrei a porta da sala e me apressei para sentar ao lado de Avery Miller, ela teve um susto. Ela continuava a mexer no sapo morto com as ferramentas, eu entrelaçava e soltada os dedos em um tic nervoso, não olhava para ela. Precisava falar alguma coisa mais estava muito constrangido, afrouxei o nó da grava e olhei em volta. A sala estava concentrada no sapo morto em suas mesas.

─ Desculpa! ─ A voz de Avery me fez inclinar o rosto na direção dela instantaneamente. Ela não havia olhada para mim, cutucava o anfíbio.

─ Claro! ─ Eu falei sem pensar. Já que ela fez, farei também. ─ Me desculpe! ─ Eu limpei a garganta. Avery levantou a cabeça lentamente na minha direção, as sobrancelhas juntas.

─ Pelo que? ─ Ela deu um sorriso que mais parecia uma careta.

─ Por... ─ Olhei de lado tentando pensar. ─ Por ter deixado o Walter falar com você daquele jeito. ─ Eu fiz uma careta como se as palavras estivessem me causando dor e realmente estavam. Eu estava engolindo o meu orgulho e aquilo não tinha gosto bom.

─ Seu amigo é um idiota. ─ Ela soltou um risinho e voltou a cutucar o sapo.

─ Ele é sim! ─ Eu assenti sem olhar para ela.

─ Não devia estar defendendo ele? ─ Ela me encarou juntando as sobrancelhas novamente.

─ O que?

─ Ele é seu amigo. ─ Ela continuou. ─ Por que esta falando dele pelas costas?

─ Eu não estou falando dele pelas costas. ─ Falei como se estivesse cuspindo.

─ Não precisa se arrepender de ter falado o que pensa.

─ Eu não me arrependi. ─ Fiz uma pausa. ─ Eu só não quis parecer falso.

─ Claro que não. ─ Ela falou, mas já não estava olhando para mim, voltou a olhar para o anfíbio.

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