Adentramos a cidade como dois forasteiros no faroeste. Não aparentava ser um grande município, sendo o ambiente bem diferente de Solitude. Não haviam prédios grandiosos – o maior deveria possuir quatro andares –, nem grande movimentação pelas ruas.
Poucos carros circulavam, sendo a maioria deles, modelos esportes antigos. As casas apresentavam cores sóbrias em seus muros, cercadas por pequenos gramados e uma portinhola na entrada. Os pedestres andavam tranquilamente pelas ruas, como se estivessem em uma paz tão amena, que nada temiam.
Pessoas que passavam pelas ruas e cumprimentavam-se, sabendo que todos ali se conheciam. E nós, os estranhos que apareciam na cidade sem aviso prévio.
- Que lugar tranquilo! – Pierre anunciou ao meu lado, aliviado.
- Até demais. – complementei, tendo uma sensação não muito aprazível. Um lugar tão ameno só pode carregar alguns mistérios consigo.
- O que pretende fazer agora, senhorita? – ele procurava algo que pudesse nos oferecer uma pista, ainda buscando com o olhar. Procurei novamente o jornal, e constatei que não havia endereço algum, apenas o nome da cidade onde ele havia sido produzido.
- Bom – coloquei o jornal dentro do porta-luvas –, eu estou morrendo de fome. – e não precisei dizer mais nada. Ele parou na primeira Cafeteria que apareceu em nossa direção, estacionando o carro rente à calçada.
- Aqui está bom para você? – ele indagou, na frente de um local que se chamava La Cafeteiur.
- Desde que eu possa comer algo, qualquer lugar serve. – dei de ombros, pegando apenas a minha bolsa antes de sair do carro.
Não estava tão movimentado ali dentro. A decoração era tão harmoniosa, que tive vontade de permanecer ali para sempre. Várias mesas redondas e pretas estavam dispostas por todo o ambiente, combinadas com cadeiras brancas. As paredes apresentavam papéis de parede vintage, e por todo o local, vários objetos que remetiam épocas antigas estavam dispostos. O caixa ficava praticamente ao fundo, e bem no canto direito da La Cafeteiur, os balcões com as mais variadas opções de salgados, e dois atendentes, só esperando nossos pedidos para fazerem o café que fosse de nossa preferência.
- Quero um expresso comum, e um misto quente. – Pierre tomou a dianteira em pedir, como se imaginasse que eu fosse demorar uma eternidade para realizar meu pedido.
Um dos atendentes – cujo crachá informava Roberto como seu nome – anotou o pedido de Pierre, e logo se direcionou à mim.
- Quero dois pães de queijo, e um chocolate quente. – anunciei para ele, que logo sorriu ao ouvir meu pedido.
- Não é muito comum pedirem o chocolate quente nesta época do ano. – anunciou, e eu sorri de volta para ele.
- Gosto de coisas quentes! – e lancei uma piscadela em sua direção, divertida.
Nossos pedidos ficaram prontos, e nos direcionamos para uma mesa que ficava na outra extremidade da cafeteria.
- Você e sua mania de flertar com estranhos. – Ele soltou uma breve gargalhada assim que nos assentamos.
- Eu não estava flertando. – anunciei, minha voz sendo abafada pelo longo gole que dei em meu chocolate. Realmente, eu compreendia o motivo pelo qual ninguém fazia aquele pedido naquela época. Estava extremamente quente. Quase queimei minha língua.
- Se você está dizendo. – ele fez um sinal de deboche, se concentrando no misto quente em seu prato.
- Aliás, eu posso usar a minha simpatia iminente, para descobrir as informações necessárias. Precisamos achar essa gráfica responsável pelo jornal. – dei a primeira mordida no pão de queijo, e me questionei do porque de ter ficado tanto tempo sem comer uma gostosura daquelas.
- Já parou para pensar que o jornal pode ter simplesmente aparecido? Isso não precisa ter nenhuma ligação com mais nada. – Pierre falava entre uma mordida e outra, e as vezes, mastigando.
- E você já parou para pensar que esse é o único indício que temos no momento? – debochei da maneira como ele havia falado comigo, tentando arrumar argumentos sensatos. – Sei que pode parecer bobagem, mas minha intuição feminina me diz que o local onde o jornal foi produzido, tem uma forte relação com ele. – e dando uma pausa para fazer uma careta sarcástica, completei – Nossa, por que será que eu acho que o lugar onde o jornal foi produzido tem alguma ligação com o fato dele existir?
Pierre não estava a fim de discutir – mais uma vez –, dando apenas uma longa gargalhada.
- Eu não tinha olhado por esse lado. – e ainda com a voz divertida, disse – Mas tudo bem, senhorita Eu Tenho a Razão. Procurar por aqui pode ser nosso bom começo.
Terminei de comer os dois (fartos) pães de queijo que havia comprado, deixando o chocolate quente pela metade.
- Vou pegar um refrigerante bem gelado para compensar isso. – disse eu, já indo em direção ao frigorífero.
Fomos para o caixa pagarmos tudo o que havíamos consumido, e eu não pude deixar escapar a oportunidade de jogar um pouco de charme para o moço que contava nosso dinheiro para nos devolver o troco.
- Todo mundo aqui nessa cidade é tão interessante assim? – e lançando uma profunda olhada nele, mordisquei suavemente o lábio.
Ele corou completamente. Peguei o dinheiro que me devolveu, e já aproveitei para fazer a pergunta que eu realmente tinha a intenção de fazer.
- Eu sou jornalista, e me interesso bastante pelas coisas interessantes que o mundo tem a oferecer. – e fazendo uma pequena pausa para concluir meus pensamentos, disse – Tenho um grande interesse em conhecer o jornal local da cidade.
A expressão do moço suavizou, e agora ele já estava pronto para uma conversa casual.
- Ah, sim. O Liberativo não fica tão longe daqui, você pode seguir re...
- Não, não! – o impedi de continuar falando, já emendando. – Não é o Liberativo que eu procuro. – e fazendo mais uma pausa para atrair sua atenção, prossegui, mantendo minha postura firme. – O jornal se chama Gazetino. Sabe onde podemos encontrar?
O moço franziu o cenho, denotando todas as linhas de expressão em sua testa.
- Desculpe-me, moça. Mas o Gazetino foi desativado há anos atrás. – e com uma expressão de espanto no olhar, ele nada mais disse.
- Foi desativado? Mas por quê? – minha curiosidade era tanta que eu nem reparei nas pessoas furiosas que estavam na fila. Elas que esperassem.
- Logo após o que aconteceu com o dono do jornal. – sua resposta foi tão vaga, e ele parecia tão perturbado, que só comentou aquilo.
- E o que aconteceu? Desculpe-me, sou novata na cidade. Eu e meu amigo estamos aqui para um trabalho de pesquisa para nosso TCC. – e dizendo isso, apontei em direção ao Pierre.
- Bem... o dono do jornal se suicidou. – ele engoliu em seco, olhando para a pequena fila que já se formava. – Mas isso foi há exatos 10 anos.
Assenti para ele, agradecendo pela informação. Dei uma olhada de esguelha para Pierre, que ouvia tudo aquilo atentamente, achando cada parte daquilo, bizarra.
- Um suicídio! – ele exclamou assim que me aproximei de si.
- Pois é. Parece que o jornal possui uma relação bem mais íntima com o caso do que havíamos imaginado.
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Não foi suicídio!
Mistério / SuspenseBelina vê sua vida virar do avesso ao presenciar um suicídio. Frio, rápido e sem explicação. Uma jovem se joga do topo de um prédio, tendo seu corpo perfurado pelos cacos de vidro da calçada. Ninguém entende como uma jovem no auge de sua vida era c...