Capítulo 53 - money, power, glory

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Me falaram que as coisas voltariam a ser como antes. Que eu poderia voltar a minha vida normal e nunca mais passar por nenhuma situação que fosse colocar a minha vida em risco. Todas as manhãs parecem diferentes, cada segundo da minha vida era tratado como se fosse o último e constantemente me sentia em um observatório.

As pessoas são atraídas pela desgraça alheia, o sofrimento que não são delas passavam a ser uma "experiência de vida" um aprendizado, como se elas mesmas tivessem experimentado tudo aquilo. Romantizaram cada situação que ocorreu, desde o sequestro até mesmo o retorno. Quando falo "romantizar" não é no sentido de criarem uma estória de amor, era como se eu fosse uma heroína que tivesse passado por tudo aquilo e voltasse para os braços do meu amado.

Queriam que falassem em publico, expusesse o quanto Harry Styles tinha sido crucial no meio da investigação. Eles queriam que eu desse detalhes exclusivos toda vez que um programa matinal me convidava para dar meu testemunho de sobrevivente.

Sobrevivente? Eu não sou uma sobrevivente. Porque eu não sobrevivi, eu não renasci como as outras pessoas, eu não sai mentalmente de lá.

Era uma farsante.

Por mais que o governo garantisse aquela segurança, sempre tinha uma pessoa que me empurrava para o mesmo circo em frente as câmeras. A obsessão americana me corroía e acabava com cada pedaço que me sobrou.

Falar aquelas palavras como se não tivesse existo "nós", como se Bieber fosse um monstro, cada maldita vez que me fazem lembrar de que fui espancada até ficar inconsciente, de que tinha sido arrancada todas as minhas unhas, de que quase tive os dedos dos pés e das mãos amputados pelo frio... me dava repulsa.

Era claro que outras coisas forma omitidas, como explicaria meus dentes? o bandido impiedoso e sádico arrancou meus molares e depois sentiu pena?
O monstro da máfia me envolveu em um plano suicida pra dar fuga a dois comparsas?

Se eles soubessem... tudo aquilo se tornaria maior.

E não poderia dizer que tudo seria como antes.

Minha ida ao psiquiatra foi restrita quando vazaram áudios de uma consulta. Eu escondi boa parte, embora soubesse que estava mentindo, o homem me deixava chorar por horas e falar o quanto tudo aquilo doía. Mas, o que estava doendo? O trauma que supostamente havia passado, a situação desumana? Ou a falta de Justin Bieber?

Enquanto eles tinham aquela gravação da mulher estética, chorando inconsolável sobre a sua vida. Escondia dentro de si coisas mais obscuras, como a gravidez...

A gravidez que foi exposta logo depois como um renascimento.

Surgiram as críticas logo em seguida "uma vítima de estupro, que teve a vida interrompida por meses em uma situação de escrava sexual, engravidaria meses depois? Onde está o trauma? Porque ela não está tentando se matar?"
"Eu, sendo ela me mataria"
" porque tentar colocar uma criança no mundo após ser violada de todas as formas".
"Essa vadia deve ter gostado de ser comida por tantos caras"

A empatia com o sofrimento começava a se esvair, agora restavam lacunas que precisavam ser preenchidas. Principalmente como era a vida de Kristen Silver antes do sequestro e como uma agente tinha se tornado uma heroína, exposto um dos foragidos aos crimes hediondos que cometia. Eles queriam aquilo, que cada detalhe daquela personagem fosse exposto. Mesmo que ela não existisse.

E mais uma vez estava ali, com os pensamentos me enclausurando em cima da cama, esperando pra saber qual seria a nova situação a ser enfrentada aquele dia.

Harry estava deitado de bruços ao meu lado, os quadris forneemos com o lençol azul e o dorso desnudo, passavam a imagem de despreocupado mesmo que ainda existisse aquela ruga formada em sua testa. O braço esquerdo por baixo do travesseiro e os cabelos desgrenhados, eu sentia inveja dele. A tranquilidade de uma boa noite de sono, o quão era destemido ao ponto de não se importar com o que aconteceria lá fora. Harry, parece um mar calmo.

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