Capítulo 23 - Pela última vez

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Na sala de controle, todos aguardavam aflitos por notícias de Nick e Kitty. Uma lanterna, deitada sobre a mesa central, iluminava parcialmente a pequena sala. Do lado de fora, zumbis tateavam a porta com o propósito de entrar e devorar os únicos humanos sobreviventes do hospital.

Zoe, que repousava em uma cadeira branca, segurava o walkie-talkie na esperança de reconectar com sua filha. Ao seu lado, Bin e Hank mantinham-se imóveis e de olhos bem abertos refletindo as ocorrências da noite. Do lado oposto à porta, Junior e Alice estavam sentados no chão expressando preocupação em seus rostos. Lance era o único que se movia pela sala de controle, caminhando de um lado para o outro, demonstrando impaciência e estresse.

- O senhor está bem, doutor Lance? – perguntou o enfermeiro Mark, que estava sentado ao lado de Lunna.

- Me deixe em paz – retrucou Lance impaciente.

- Como um grande médico, deveria saber que a impaciência pode causar transtornos mentais – informou Mark.

- Poupe-me de seus avisos, Mark.

Percebendo que também irritava o médico, Mark manteve-se calado. Fazia cinco anos que trabalhava naquele hospital, e nunca conhecera este lado problemático de Lance. Como um bom profissional, decidiu se comportar e evitar novas confusões na sala.

Isolados no canto esquerdo da sala de controle, próximo à porta, Abbie e Oliver mantinham-se calados, assim como todos os outros que ali estavam. Oliver estava com sua cabeça encostada no ombro de sua mãe, sendo envolvido pelo braço dela. Abbie tinha um olhar profundo e imóvel, como se contemplasse a morte que lhe perturbava, mas seus pesadelos eram outros. Pensava em John, Madison e Mary. Não sabia como estavam e nem eles também sabiam.

"Acreditar no impossível é ignorância", ressoavam as palavras em sua cabeça. E era isto que Abbie temia, que estivesse errada, que suas esperanças de sair daquele lugar e reunir sua família fossem vazias e improváveis. Tudo aquilo que vivia nesta noite era uma realidade que nenhuma mãe sonharia, tudo terrorizava seu coração e seus pensamentos. Sentia um forte aperto no coração, e isto lhe causava pavor e medo. "Intuição de mãe não falha", se sua mãe estivesse certa, Abbie pressentia que sua família estava em perigo.


***


Era a noite mais longa da vida de Mary.

Sentada em um sofá, a idosa mulher acalentava sua neta, que dormia com a cabeça apoiada em seu colo, afagando seus sedosos cabelos castanhos claros. O tic-tac do relógio nunca foram tão altos como parecia naquela noite. Já eram quase quatro e meia da manhã, faltava pouco mais de uma hora para o dia amanhecer. Mary nem se lembrava mais da última vez que ficou acordada até de madrugada, talvez fosse há catorze anos, na noite em que seu marido faleceu, ou há dezoito, quando comemoraram quarenta anos de casamento. Ficar ali sentada, em uma casa que era iluminada apenas por duas velas, e aguardando ansiosamente pela chegada de sua família, tornavam a noite cruelmente longa.

Quando tinha quinze anos, Mary passou por uma situação parecida como esta. Seria um dia festivo para Mary, afinal era o aniversário de seu primeiro namorado, mas acabou se tornando um dia tedioso e triste para sua vida. Como sabia que seu pai não permitiria que ela não fosse para a festa, havia combinado com suas amigas de irem escondidas. Mas para a sua infelicidade, sua mãe – uma bela mulher que trabalhava em uma indústria têxtil – ficou presa em uma manifestação política e perdeu o ônibus. Quando sua mãe avisou seu pai do ocorrido, Mary foi encarregada de ficar em casa cuidando de sua irmã, uma garota de cinco anos, enquanto seu pai buscava sua mãe no trabalho. Não havendo outra alternativa para fugir para a festa de seu namorado, Mary teve que aceitar a tarefa de cuidar de sua irmã. O que deveria ser menos de uma hora para o retorno de seus pais, se tornaram infinitas horas que se arrastaram pela noite. Mary poderia ter ido dormir, assim como sua irmã fez, mas estranhava o tempo passado desde que seu pai havia saído de casa, tempo suficiente para o retorno deles. Havia algo que preocupava Mary, e o clarear do nascer do sol trazia suas respostas. Mary, que não havia descansado nem um minuto, atendeu ao chamado na porta. Era um policial, com o rosto pálido e tenso, que lhe informava de um acidente de carro envolvendo seus pais, e que não tinham sobrevividos. Mary nunca conseguiu superar os acontecimentos daquela triste noite, e podia sentir, outra vez, que esta seria ainda mais longa e tensa.

Zombie World - A Origem (Livro 1)Onde histórias criam vida. Descubra agora