Capítulo 13: cogumelo de zebu e algumas poças de sangue - Parte 1 de 4

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"O crepúsculo é a hora que um homem crente deve caçar seu sustento", Antônio, pai de Genésio, sempre afirmava para o filho. A noite chegava e a fome do homem de lábio leporino agia como brasa em seu estômago ulcerado. Genésio empunhou um facão da mesma forma que seu papai empunhava quando estava alucinado e bêbado, olhando-o com um semblante perverso.

(POR QUE VOCÊ SIMPLESMENTE NÃO MORRE? UM DIA ACABO COM ESSA LOUCURA. OU ME MATO ANTES. ME MATO.)

As crianças estavam calmas aquela noite. Quanta honra servirem a Moloque. Trazer meu papai.

Aproximando-se do curral, antes de entrar na floresta, Genésio notou cogumelos nascendo nas fezes secas das vacas magras que ainda conseguiam sobreviver naquele lugar. Seu pai os adorava e alimentava o filho vez ou outra com eles. O que papai dizia mesmo?

(Come, Genésio, come, menino. Moloque te olha. Sua mamãe, que você matou, te olha. Come logo, antes que papai perca a paciência. Olha, papai também come.)

Expiação dos pecados! Os cogumelos do esterco limpavam a alma. Tornavam-no mais próximo de Moloque. Tornava seu papai mais próximo da mamãe, apesar de seu choro. Lágrimas de felicidade, papai? Papai, meu estômago tá ruim, papai. Eu vou... desculpa, papai, eu vomitei, e acho que... papai? Genésio pousou o facão sobre o chão e devorou os cogumelos, tentando se lembrar de alguma prece.

Papai... – lacrimejava.

E, em seguida, ergueu-se e urrou. Os corações das crianças gelaram com o grito.

POR QUÊ?

Por que seu pai havia encravado o mesmo facão que ele agora carregava no próprio pescoço? Genésio acordara para caçar e acender o fogo da noite – o papai gostava cada vez mais do fogo. Gargalhava, falando de Moloque e mandando Genésio acender grandes fogueiras –, mas ao chegar no cômodo principal, se deparou com seu pai, morto, com o facão atravessado no pescoço; a cabeça pendendo para o lado; o peito, o braço e a perna cobertos por sangue que se empoçava no chão. No começo, Genésio não entendeu... mas... ele se foi? Se foi? ELE NÃO O AMAVA? ELE NUNCA... NUNCA...

(Nunca me amou.)

Um Perverso Tom de VinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora