Capítulo 21: o sabor de se envolver com a pessoa errada... - Parte 1 de 2

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Os detetives seguiam para o boteco do Danilo sem trocar muitas palavras.

À medida que o Dodge seguia, notaram que as ruas do centro estavam sendo tomadas por várias pessoas – e era uma segunda-feira – que discutiam, clamavam por justiça, faziam ameaças

(eu mesmo vou matar alguns desses filhos da puta selvagens para eles aprenderem o que é bom pra tosse)

e lamentavam perdas. Gritavam ofensas para os ausentes, exigindo que algo

(sangrento)

fosse feito.

Feiticeiros carniceiros!

Monstros!

Índios desgraçados, filhos da puta!

Ah, esses vagabundos de pele vermelha vão ver do que somos feitos. Oh, se vão...

Ninguém mexe com nosso povo assim... não vai restar um desses animais para...

Em uma época na qual os militares desciam o cassetete – para não dizer bala – em qualquer um que ousasse pensar na possibilidade de fazer baderna na rua, podia-se dizer que estas pessoas eram, no mínimo, corajosas. Mas, como se sabe, a multidão dá a coragem e a força, mas tira a inteligência e a racionalidade do indivíduo. A multidão é sempre una.

Contudo, mesmo que a cidade fosse Nessuno, onde a lei era mais ignorada que mendigo em metrópole, aquela cena não acabaria bem para nenhum grupo.

Ah, a ORDEM... não é linda?

– Que diabos tá acontecendo aqui? – perguntou Fontes, ao volante.

– Parece que encontraram os dois infelizes no meio do mato...

Alguns policiais já chegavam, montando em cavalos. Até mesmo aqui tem um limite, pessoal. Até mesmo aqui. E, Deus!, como vocês vão se arrepender por terem me feito sair do puteiro para uma merda dessa... ah, como vão...

– Os que eu abandonei? – Arregalou os olhos.

– Ouvi dizer que estavam fodidos, Zé. Digo, literalmente destruídos. Os caipiras nem os trouxeram pra cidade. Enterraram os dois infelizes lá mesmo.

Fontes levou as mãos até os lábios. Sentia algum remorso por tê-los abandonado à sorte, mas a cabeça também estava ocupada com o assassinato de Roberta. Quanta desgraça, puta que pariu!

– Estão culpando nossos amigos nativos – Silas disse.

– O quê?

– Disseram que foi alguma magia negra ou sei lá. Esses filhos da puta são todos alucinados, Zé, você sabe.

Puta merda...

Fontes refletiu sobre as palavras dos gêmeos na floresta; a forma como temiam os kayapós e como contaram as histórias de seus pais... como acreditavam nelas.

(Tudo é expectativa. Tudo!)

Ele mantinha um passo atrás para com algumas crenças nativas, certamente, mas não acreditava que eram assassinos, muito menos canibais. Acreditava que mentiras contadas pelos pais, para colocarem seus moleques na linha, causaram um estrago grande na cabeça de seus filhos. Ele comprovava isso nas ruas.

– Não há muito que possamos fazer. Depois damos uma olhada, caso queira, Zé. Sei que você é um sujeito muito curioso – pausou. – Aqui. Chegamos.

Um Perverso Tom de VinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora