Capítulo 24: sonhos de cólera - Parte 2 de 3

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Genésio saía de um mercado, de mãos dadas com o seu pai. Não olhava para os lados; não encarava as pessoas. "Esse povo brasileiro quer apenas passar por cima de nós, filho. Nunca se envolva com eles. Nunca! Se não...", lembrava-se de seu papai acertando-lhe o rosto após ele ter dito "oi" para um garoto de sua idade. "Desculpa, papai", mas o homem desceu-lhe mais um golpe. "As marcas te farão lembrar. Me agradeça, pois o mundo nunca te aceitará, aberração!"; "obrigado, papai", sua bochecha ardia e sangrava, mas o pai tinha razão.

Andando pela calçada, Genésio carregava as sacolas com alguma comida enlatada e muita bebida para seu pai, que ao seu lado, cambaleante, bebia um corote de pinga barata.

Em dado instante, um pouco atrapalhado com o peso que carregava, o menino tropeçou e caiu. Mas em um reflexo rápido, conseguiu manter os sacos livres do chão, cortando apenas o queixo.

– Olha o que você fez, moleque! – Antônio, que já estava há muito enlouquecido, chutou-lhe as costelas. Ele merecia. Sabia que merecia. Era o culpado pela desgraça na vida do pai, afinal. Sua mãe

(que você matou)

morrera por culpa dele. Sua completa e eterna culpa; seu pai, a única pessoa que possuía no mundo, fazia questão de lembrá-lo disso sempre que descarregava sua tristeza no corpo de seu filho.

(Moloque nos olha, filho, ele olha você; você é uma aberração especial para ele.)

As pessoas olhavam para o pai e o filho, assustadas.

– O QUE VOCÊS ESTÃO OLHANDO? Querem apanhar também? Brasileiros desgraçados! – cuspiu. – Vão cuidar de suas malditas vidas! – E foram mesmo... não era problema deles. – Levanta, garoto! Levanta! – ele gritou, puxando o braço do menino. – Você quase quebrou as garrafas, infeliz! Tome cuidado!

– Tá bom, papai.

– Vai buscar a carroça, vai. – Mesmo com apenas dez anos, Genésio se encarregava da direção do burro de carga, muito em razão de que seu pai não gostava de ficar sóbrio na cidade. Mas Genésio entendia esse gênio de seu velho. Querem apenas passar por cima de nós, lembrava-se das palavras do papai. Genésio aprendera os comandos de voz para o animal (anda!, para!) fazia alguns anos e era o responsável por colocar o cabresto no burro, acariciando-o, colocava o item sobre sua cabeça e juntava-lhe uma corda-trela à goela do queixo do animal, depois colocava a faixa peitoral e as correias do arreio, ajeitando as rédeas no cabresto.

Anda! Anda! 

Um Perverso Tom de VinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora