Capítulo 06

2.2K 102 16
                                    

Nos dias que se seguiram, depois da noite do show, nossa relação se tornou muito mais profissional e nada pessoal. Discutíamos o mínimo necessário no escritório e nos shows que eu acompanhava. Henrique estava magoado, ressentido pelas palavras que eu usei. "Eu não fiz essa música pensando em você!". Porque eu fui dizer aquilo ? Não era pra sair daquele jeito, mas ele queria o quê ? Eu estava prezando mais pelo seu relacionamento do que ele mesmo !

Eu não ia participar dessa infantilidade. Me sentia a mais madura ali, apesar de ser bem mais nova, e resolvi deixar o orgulho de lado. Liguei para ele em um dia que sabia que estaria em casa, de folga. Apesar de ressentido, ele sempre me atendia prontamente. Não foi diferente dessa vez, após o segundo toque já ouvi um "Alô" ríspido do outro lado.

- Oi, tudo bem ? Tô com umas composições novas e queria sua opinião antes de mostrar lá no escritório. Vamos tomar umas hoje ? Sei que você não tem show ! - eu já fui emendando tudo de uma vez, antes que ele respondesse.

- Oi Marília. - ele tentava não demostrar emoção alguma, mas percebi que estava surpreso com meu convite. - Eu não sei, estou um pouco cansado...

- Henrique, eu não vou ficar correndo atrás de você não. Estou te pedindo como amiga, porque senti sua falta esses dias, mas se você não tá afim tudo bem, só não fica fazendo doce. Fala logo, que eu tenho mais o que fazer. - eu disse, sem paciência.

Ele riu. Eu fiquei sem entender, era a última reação que esperava dele.

- Até nisso a gente é parecido. Sem paciência pra adular os outros. Você é uma pentelha mesmo, não dá pra ficar sério contigo. Vem logo pra cá que eu estou com saudade. - ele disse, finalmente se desarmando.

Eu respirei aliviada, senti meu peito relaxar e toda aquela tensão em falar com ele ir finalmente embora.

- O Tchula vai comigo, ele também quer saber o que você acha das letras. Chama o Ju e vamos fazer uma reuniãozinha, como nos velhos tempos.

- Tá bom, vou comprar as cervejas então e mais algumas bebidas que a gente gosta.

Aquilo não era bom sinal. Eu, Henrique e bebida era uma combinação que sempre saía do controle. Mas eu adorava, mesmo assim.

- Tudo bem, a gente se vê mais tarde então. Beijo !

- Um beijo, meu amor. - ele respondeu do outro lado, desligando em seguida.

Aquele afeto todo de volta, depois de dias com o coração apertado. Eu abri um sorriso involuntário, ainda com o telefone na orelha.

- Tá boba é minha filha ? - Tchula chegou sorrateiramente, me surpreendendo.

- Ãn ?! - eu olhei pra ele, assustada. - Ah, não. Só estava falando com o Henrique.

- Ah então tá boba mesmo, e boba apaixonada é o pior tipo viu. - ele disse, rindo e se sentando ao meu lado.

- Eu não estou apaixonada, vocês adoram implicar com isso. Você e o Juliano quando se juntam, nunca vi igual, ficam impossíveis. - eu disse, sem olhar para ele.

- Marília, você pode até querer mentir pra si mesma, mas pra mim não vai não. Esqueceu que eu te conheço melhor que ninguém ? - ele disse, me entregando alguns papéis. - Tá vendo isso aqui ? São as músicas que escrevemos nesses últimos dias de trabalho. E em todos eles você não parou de falar no Henrique um segundo sequer. Ainda deu um jeito de encaixar sua briguinha em todas as letras. Para de achar que todo mundo é cego igual ele, que é o único que não vê o que tá acontecendo.

ImpasseOnde histórias criam vida. Descubra agora