Capítulo 68

332 6 1
                                    

- Não vou - declarou ela. - Se quiser que sejam limpos, vai ter que mandar Laredo ou outra pessoa fazê-lo, porque eu não vou. - Vai, sim - disse ele, e, debruçando-se sobre ela, agarrou-a com força pelo pulso. O cobertor escorregou para um nível perigosamente baixo. Com uma das mãos segura por ele e apoiada no outro braço, Sheila se deu conta de que estava numa posição indefesa. Havia um brilho malicioso e vivo nos olhos escuros que a fitavam. Sheila sabia que, se continuasse a desobedecer-lhe, ele não iria pensar duas vezes antes de retirá-la de sob a proteção do cobertor, revelando a sua nudez para Laredo. - Está bem - concordou Sheila, de mau humor. - Mas não posso fazer nada enquanto você segurar o meu braço deste jeito. Tem que soltá-lo, a não ser que pretenda quebrá-lo. Ele riu baixinho, com uma satisfação arrogante, e soltou-lhe o braço. Enrolando bem o cobertor à sua volta, Sheila deslizou devagarzinho para o lado da cama onde ele estava. Quando ele lhe ofereceu o pano molhado, ela o arrancou das suas mãos. Ele retorceu a boca ante esse gesto e virou-se para se sentar na beira da cama, oferecendo-lhe os ombros para que ela cuidasse deles. De joelhos, com a coberta mantida sobre os seios, Sheila fitou a espessura dos cabelos cor de ébano e a pele ouro-bronzeada que cobria os ombros e as costas musculosos. Se tivesse uma faca nas mãos, ao invés de um pedaço de pano, tê-la-ia enfiado na espinha dele. - Os arranhões, señora. A sua voz arrastada, com sotaque, lembrou a Sheila o que devia fazer, deixando-a com a impressão de que ele estava lendo seus pensamentos. O toque dela foi deliberadamente bruto quando começou a limpar o sangue seco da carne rija. Sentiu os músculos dele se contraírem ante a brutalidade, mas Ráfaga não se retraiu nem emitiu o mais leve som, nem mesmo uma respiração mais forte, para demonstrar que ela lhe estava causando dor. O seu controle não diminuiu a crueldade do toque dela. Quando os arranhões ficaram expostos, Sheila descobriu que eram piores do que pensava. Ela não ferira apenas a pele. As unhas tinham ido mais fundo, abrindo sulcos na carne. Estavam vermelhos e irritados,extremamente doloridos. O olhar se dirigiu para Laredo, que estivera observando o trabalho. A expressão no rosto dele corroborava o julgamento dela. - Tem álcool aí para desinfetá-los? - perguntou Sheila, sem permitir que a emoção lhe transparecesse na voz. Disse a si mesma que pouco lhe importava ter ferido Ráfaga. Ele merecia. Mas sentiu uma onda de compaixão, e consolou-se dizendo com seus botões que pelo menos aquilo provava que não era tão bárbara quanto seus raptores. Laredo fez que sim com a cabeça. - Vou buscar. Demorou apenas alguns segundos, e voltou com uma garrafa de bebida, com dois terços cheios do liquido.Desarrolhando-a, entregou-a a Sheila, pegando o pano molhado e sujo que ela segurava. Ela hesitou, lançando um olhar para a linha austera do maxilar de Ráfaga, a arrogância friamente aristocrática do seu perfil. - Vai doer - disse desnecessariamente. - Quem sabe prefere aplicá-lo em gotas, para prolongar a tortura - replicou ele, com voz macia e irônica. A compaixão sumiu numa explosão de mau gênio. Sem avisar, Sheila virou a garrafa, lavando os arranhõescom o álcool, mas não sentiu nenhuma satisfação quando ele se crispou ao receber o liquido ardente nas lesões. Imediatamente, Ráfaga se levantou e foi até a cômoda pegar uma camisa. Sheila ficou pensando se não seria melhor ele colocar uma atadura nas feridas, mas não seria ela quem iria sugeri-lo. Calada, devolveu a garrafa para Laredo. - Aprendeu a cozinhar, señora? - Ráfaga vestiu a camisa, tomando cuidado com os ombros. Lançou um olhar indiferente para ela. - Não. - Não a comida deles, com os utensílios toscos deles... Sheila qualificou a negativa mentalmente - Acho que vão ter que preparar vocês mesmos o desjejum, ou ficar com fome até a hora do almoço. A essa altura Elena provavelmente já se terá acalmado, e voltará para prepará-lo - comentou serenamente. - Elena não voltará - Ráfaga informou, depois virou-se para Laredo. - Providencie para que a mulher de Juan venha diariamente preparar as nossas refeições. Diga-lhe que venha depois de ter feito a comida da sua própria família, e que pode trazer consigo o filhinho, se quiser. - Um leve sorriso apareceu nos seus lábios enquanto olhava para Laredo. - Juan sempre nos contou que ela é a melhor cozinheira de Chihuahua. Vamos confirmar, não é!

A Caricia Do VentoOnde histórias criam vida. Descubra agora