Capítulo 34

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- Obrigada - falou Sheila, flexionando os dedos e pulsos dormentes. Havia círculos vermelhos em carne viva onde a corda apertada ferira os pulsos, mas a fome era grande demais para que sentisse qualquer desconforto, no momento. - Apenas cumpro ordens. Deu de ombros com indiferença, e apanhou o seu prato. Com mãos trêmulas, Sheila fez o mesmo. Durante os minutos seguintes, concentrou-se em encher a barrigavazia, servindo-se do feijão com o pedaço de pão e rasgando nacos da carne dura com os dentes. Não sobrara uma migalha no prato ao terminar a refeição com um bom gole do café. Satisfeita, segurou acaneca com as duas mãos e fitou o fogo que se apagava. Laredo fazia o mesmo, e atraiu o olhar dela. Na luz suave que diminuía, ele parecia mais jovem, um toque de solidão nos olhos azuis atormentados. A curiosidade de Sheila veio à tona de novo. - Você não é como eles - disse-lhe suavemente. O olhar de esguelha dele foi cínico e zombeteiro. - Não! - É diferente. - Por quê! - Retorceu a boca. - Porque falo inglês!- Não, claro que não. - Inclinando a cabeça para o lado, Sheila fitou-o. - Por que está com eles? Não posso acreditar que seja por opção. - Não quer acreditar - corrigiu ele. - Está com eles por opção! Estava resolvida a obter uma resposta direta à sua pergunta. - Estou. - Não havia nenhuma nota de arrependimento na voz dele. - São meus amigos. - Embora tenham morto um homem, e feito você tomar parte na coisa! Sheila não podia aceitar que ele estivesse falando a verdade. - Está se referindo ao seu marido! Foi morto pela própria estupidez. Se não tivesse tentado pegar a arma, não teria sido ferido, apenas perderia um pouco de dinheiro... só isso. Seus olhos azuis brilharam especulativamente. - Estou vendo que você não está muito abalada com a morte dele. Sheila ignorou deliberadamente o último comentário.- Porque defendeu a sua propriedade, provocou a própria morte! - disse, modificando as palavras dele, sarcasticamente. - É assim que você racionaliza o assassinato dele! - O olhar feroz dirigiu-se para o líder renegado que estava a alguns passos de distância. - Ou está verbalizando as palavras dele? - O seu patrão, que tão piedosamente poupou a minha vida para me entregar ao mesmo porco grosseiro queassassinou o meu marido! Sheila não havia falado baixo, nem tentado disfarçar o seu desprezo absoluto. Laredo sorveu o café, e não respondeu. - O que é! Está com medo que me lembre de que você não discutiu nem um pouco quando o seu patrão me entregou ao seu colega bandido! Não posso culpá-lo por isso, posso! - ironizou Sheila. - Afinal, você só cumpre ordens. - É isso aí - concordou ele, calmamente. - Independentemente do fato de achar que eles estejam certos ou não - acrescentou, enojada. - Quem é ele! A reencarnação do Diabo? - Os nomes não são importantes por aqui. Parecia impossível provocar Laredo para zangar-se. Nem defendia seu chefe, nem o condenava. - Já lhe falei isso antes. Beba o café. - O que você faz? Curva-se aos pés dele e o chama de patrão? - Apelar para ele parecia inútil, mas era a sua única esperança. - Você tem que me ajudar, Laredo. É americano, sou americana. Não pode deixar que façam seja lá o que pretendam fazer comigo. Por favor. Oh, meu Deus. - Sheila engoliu um soluço de pânico. - Não dá para ver como eles me observam, nos observam? - O olhar inquieto abrangeu o grupo de homens sentados junto à fogueira. Não era o dinheiro dela que atraía os seus olhares.

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