Capítulo 129

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- Não gosto do pessoal com quem está andando, Sra. Townsend. Ela se ajoelhou junto dele, murmurando bem baixinho: - Nem eu. - Num tom de voz mais alto, perguntou. - Está muito ferido? - Dizem que vou viver. Acercando-se dele, Sheila podia ver o tom cinzento por baixo do bronzeado das suas feições. - Não está comendo - falou, notando a comida intocada no prato. - Estou com um probleminha no braço esquerdo. Não consigo mexê-lo - explicou, com sarcasmo. - Portanto, a não ser que joguem esta gororoba pela minha goela abaixo, acho que vou ter que passar fome. Sheila olhou de esguelha para o oficial. - Não dá para soltar as mãos dele só para poder comer? - pediu cortesmente. Houve uma hesitação antes que dessem ordem a um dos soldados para deixar livres as mãos de Laredo. Sheila pôde ver que fazia um esforço tremendo para conseguir comer. Depois de três colheradas, parou. - Não tem o gosto da comida de Consuelo - disse Laredo, com um débil sorriso. - Nem a aparência. Sheila pegou a colher e começou a alimentá-lo. Um dos soldados veio de junto da fogueira para procurar o capitão. Este se afastou um pouco para conversar com o homem. Enquanto Sheila levava a colher à boca de Laredo, ele murmurava baixinho: - Ráfaga ficou ferido? - Não, escapou - sussurrou. - Sem um arranhão. - Para onde irá, Laredo! - Somente ele o sabe. Tentou se levantar um pouco mais, e fez uma careta de dor. - E quanto a você, Sheila? - perguntou no mesmo tom de voz baixo que não podia ser ouvido pelos outros. - Para onde vai! Voltar para o Texas com seus pais? - Não sei... quem sabe, pelo menos até o nenê nascer. Ou quem sabe eu fique aqui. Talvez consiga encontrar Rá... interrompeu abruptamente a frase, dando-se conta de que era Ráfaga quem os soldados esperavam capturar. Se ficasse no México, estariam esperando para ver se ela entrava em contacto com ele, ou vice-versa. Pelo bem dele, tinha que ir embora. Se pensasse com a cabeça, e não com o coração, Sheila sabia que o melhor seria que jamais voltasse ao México. A existência dele não tinha estabilidade. Jamais poderia oferecer um futuro para ela ou para o bebê. O filho deles, ainda por nascer, merecia uma vida decente, a liberdade pela qual Ráfaga ansiava, e que nunca poderia ter. Nos Estados Unidos, Sheila poderia dar tudo isso ao filho, e mais as vantagens do dinheiro. Quem sabe, ao sacrificar a vida dela pelo filho deles, estaria descobrindo o verdadeiro significado do amor? Estaria sendo nobre? Ou estaria simplesmente com medo de fugir e se esconder, se passasse da vida ao lado de Ráfaga? Estava realmente confusa demais para saber.- Se for para os Estados Unidos, será que - a voz de Laredo estava estranhamente emocionada - podia dar um pulinho em Alamogordo? O queixo tremeu ligeiramente, compreendendo. - Para ver seus pais! - O sobrenome deles é Ludlow... Scott Ludlow Não lhes conte a meu respeito, mas... - Verei se estão bem, e darei um jeito de avisá-lo - prometeu Sheila, suavemente. - Nesse meio tempo, farei o que puder por você e pelos outros. Ouvi dizer que o dinheiro ajuda. Houve apenas silêncio, enquanto ela lhe dava mais algumas colheradas de comida. Laredo fitava-a, pensativo. Quando finalmente falou, foi tão baixo que Sheila teve que se debruçar mais para ouvir o que dizia. - Se quer mesmo ajudar - murmurou -, comece alguma coisa para distrair-lhes a atenção. Dois dos guardas que nos vigiam são adolescentes. Há uma chance de podermos dominá-los e pegar-lhes as armas. Quem sabe, na confusão, alguns de nós possamos fugir. - Você pode ser morto - exclamou Sheila, protestando, mas Laredo apenas a fitou em silêncio. - Vou tentar - concordou, com um suspiro relutante. Lançando um olhar por cima do ombro, viu que o oficial concluía a sua conversa com o subordinado. Virou-se rapidamente, perguntando a Laredo: - Onde está Juan? Não o vi junto com os outros. - Está ali - respondeu Laredo, com um gesto lateral de cabeça -, debaixo do cobertor. - Sheila olhou, notando uma forma comprida completamente envolta num cobertor de cores vivas. Sentiu um aperto doloroso na garganta. - O seu ferimento abriu, e ele morreu - declarou Laredo, sem emoção. - Señora. O oficial estava de pé ao lado dela. Engolindo em seco para aliviar o aperto na garganta, Sheila levantou-se. O prato estava vazio. Não tinha mais motivo para ficar com ele, e o oficial estava lembrando-lhe isso. Afastou-se enquanto um soldado voltava a algemar os pulsos de Laredo. Seu rosto estava pálido com o choque da morte de Juan. Manteve-o desviado do olhar atento do oficial, enquanto se dirigiam para junto dos seus pais, ao pé da fogueira. - Obrigado por ter-me deixado falar com ele - disse, precisando romper o silêncio. - Sente afeição por este homem? - indagou. - É um amigo - respondeu Sheila simplesmente. - É americano, alguém com quem eu podia conversar. - Compreendo. - Ele balançou a cabeça, mas ela duvidava que tivesse compreendido. - Desculpe-me, señora, mas não pude deixar de observar que parece um tanto nervosa. Não está feliz de estar com seus pais? - Claro que estou. A resposta foi irritadiça. Ele lhe lançou um olhar breve e esquisito, depois deixou que o silêncio dominasse a caminhada até a fogueira. Sheila parou no limiar do círculo de luz. Os pais estavam sentados a um canto, conversando, ainda sem se dar conta de que ela tinha voltado. O oficial fez sinal a um de seus homens para lhes trazer café, depois virou-se para contemplar Sheila. Esta sabia que devia ir para junto dos pais, mas também sabia que estavam conversando sobre ela.. e sobre Ráfaga e o bebê. Sendo assim, ficou onde estava. - Andamos muito, hoje - o oficial comentou o distraidamente. - É - concordou Sheila. - Tive tempo de pensar, enquanto cavalgava - continuou ele. - Estou convencido de que você é mulher deRáfaga. Embora não possa prová-lo, creio que pertenceu a ele de bom grado. Seus olhos e rosto não têm a expressão de uma mulher que foi forçada a aceitar as atenções de um homem. Às vezes, vejo seus olhos fitando as montanhas, e há um brilho especial neles, como se soubesse que ele está lá, em algum lugar. Talvez esteja pensando que ele virá buscá-la. - Ergueu a sobrancelha, uma luz nascendo-lhe nos olhos. - É - comentoupositivamente, enquanto Sheila se enrijecia -, é, ele virá buscá-la. O oficial se virou, dando ordens bruscas a vários dos soldados que estavam em volta da fogueira. Houve uma agitação imediata. Ele exibia um sorriso complacente no rosto, quando voltou a olhar para Sheila. - Vou colocar sentinelas extras. Estaremos prontos para ele... o seu Ráfaga... quando vier - declarou.- Está enganado - negou Sheila desesperadamente. - Ele não virá. Um tiro foi disparado, depois um segundo e um terceiro. O oficial agarrou o braço de Sheila, fitando para os seus homens. Mais tiros foram disparados antes que os soldados respondessem ao tiroteio. Sheila lutava contra a mão que prendia os seus movimentos. Ruídos de luta vinham do local onde Laredo e os demais estavam presos. No caos, estavam tentando ganhar a liberdade. Uma bala zuniu perto do ouvido dela, atingindo o oficial, que afrouxou a pressão instantaneamente, e ela se libertou. - Sheila, aqui! - a voz dolorosamente familiar de Ráfaga a chamou, e ela se virou na direção do som. Seus olhos perscrutaram a escuridão indistinta das árvores que cercavam o acampamento. Começou a correr, sem ter certeza da direção. - Sheila, não! - gritou a mãe. - Não vá! Mas a sua escolha já estava feita. Não havia nada que o mundo civilizado pudesse lhe oferecer, ou ao bebê, que equivalesse a um momento nos braços de Ráfaga, não importando as circunstâncias. Ráfaga saiu de trás de uma árvore. O rifle que segurava à altura do quadril disparou, dando cobertura a Sheila. Ela correu para ele.

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