Eu sentia sono, fui levada para uma das salas do hospital, primeiro Killian cuidou do ferimento causado pela bala.
- Não durma.- Ele dizia toda vez que eu cochilava, até que uma hora ele resolveu conversar.- Não dormiu à noite, dormiu?
- Não.
- Percebi, você finge muito mal sabia?
- Eu só queria evitar conversar.
Ficamos em silêncio por um tempo.
- Olha Nancy, me desculpa se eu tenho sido meio rude com você, sei que isso deve te irritar.
Eu respirei fundo.
- Está desculpado.
Ele costurava seu próprio ferimento e fazia parecer fácil demais.
- Por que saiu do exército?- Perguntei.
- Não saí, ele simplesmente deixou de existir depois de um tempo.
- Ah.- Eu disse, ficamos quietos novamente.
- E com o que trabalhava antes dessa epidemia começar?- Ele perguntou.
- Eu era repórter, trabalhava no Diário de Manhattan.
- Morava em Manhattan?
- Morava.
Eu suspirei ao me lembrar daquele tempo.
- Se achar que eu estou sendo intrometido posso parar de fazer perguntas.
- Não, tá tudo bem.- Eu disse, ele terminou de fazer o curativo em si mesmo e se sentou perto de mim. Fez um gesto como se pedisse permissão e eu assenti.
Ele segurou meu braço como se eu pudesse me quebrar em pedaços e começou a tirar os cacos de vidro com uma pinça, a medida que ele tirava eu via o sangue escorrer, ele pegou um algodão molhado com álcool e começou a limpar o sangue, ardia um pouco mas eu sabia que era a parte menos dolorosa, ele colocou band-aids em cada um dos cortes.
Limpou o sangue seco da minha testa.
- É sempre tão cuidadoso assim com tudo?- Perguntei.
- Tentei ao máximo não te machucar porque agora vem a pior parte.
Eu me virei de costas.
- Se ralou feio sabia?
- Eu tive que proteger a Julie.
- Seu instinto é admirável, poucos pensariam rápido como você fez.
- Não é instinto, eu amo ela, quando você ama alguém se dispõe a fazer de tudo pelo bem estar dessa pessoa.
- É, tem razão.
Ele tirou um pedaço rasgado da minha blusa que havia grudado no ferimento e pegou um pano que havia molhado no álcool.
- Vai arder bastante, tá?- Ele avisou, apenas assenti, senti a pressão do pano nas minhas costas e ela começou a arder tanto que parecia estar prestes a pegar fogo, eu fazia esforço para não começar a gritar como uma criança.- Tudo bem se doer, é normal.- Ele disse.
- E como faz para não expressar muita dor?
- Só tento esquecer dela, penso em outras coisas, a maior parte das vezes tira uma parte do sentimento de dor.
- Obrigada pela dica.- Agradeci, não funcionava muito bem comigo, mas ajudou.- É muito errado deixar um estranho cuidar de você?- Perguntei ironicamente.
- Em outro caso seria, mas não sou um estranho, nos conhecemos há quatro dias.
- Mas você não sabe nada sobre mim e eu não sei nada sobre você, então não somos conhecidos, somos estranhos.
- Bom, sei que o seu nome é Nancy Howard que tem o cabelo e os olhos castanhos, já é o suficiente.- Ele se levantou.- Sua blusa está muito suja, não é bom você ficar usando isso, vou procurar outra coisa para você vestir.
- Vai ficar alguma cicatriz?- Perguntei.
- Não exagera, são só arranhões, vão passar.
Ele pegou sua mochila e saiu do quarto, Julie resolveu ficar em um outro quarto enquanto Grath me ajudava.
Minha tontura passou, eu já me sentia melhor embora as pancadas na cabeça tivessem me machucado muito; eu sabia que iria passar rápido, só me preocupava em achar algum lugar onde pudéssemos ficar.
Minha costas ainda latejavam, mil pensamentos sobre o perigo que eu e Julie corríamos passaram pela minha cabeça, eu estava com medo e não sabia como evitar, mal sabia se conseguiria sobreviver, se conseguiria proteger Julie.
Ouvi um grito no andar de baixo, não era de Killian, era como um sinal que os maníacos davam, gostavam de gritar.
Eu abri a porta do meu quarto vagarosamente e olhei bem para ver se não havia ninguém no corredor, as luzes das lâmpadas estavam fracas e oscilavam, dei passos leves até o quarto de Julie, quando abri a porta meu coração afundou, ela não estava lá.
- Julie?!
Procurei atrás da porta e andei pelo quarto inteiro, ela não estava em lugar nenhum.
Eu saí do quarto e fui andando rapidamente pelo corredor, dobrei à minha direita onde havia uma escada, eu tinha receio, mas comecei a descer as escadas. Me assustei ao sentir uma mão tapar minha boca e me segurar, tentei gritar e sabia que se me movesse cairia da escada.
- Ficou louca?!- Ouvi Killian sussurrar, quando percebeu que eu não gritaria ele me soltou.- Por que saiu do quarto?- Ele perguntou mais calmo.
- Julie, eu não encontrei ela, quando ouvi o grito fui ficar perto dela para protegê-la caso algo acontecesse mas ela não estava lá.
Ouvimos passos no corredor, pareciam ser de alguém que usava salto alto, subi a escada novamente com Killian e ficamos encostados na parede.
- Caramba.- Ouvi uma voz feminina que eu não conhecia dizer, os passos pararam.
- Oi moça.- Ouvi Julie dizer, eu olhei discretamente para o corredor e vi ela parada na frente de uma garota, parecia ser uma adolescente, ela tinha o cabelo curto, pele morena e os olhos verdes, mas não era maníaca.
- Você...você fala?
- Claro que eu falo.- Julie disse, a garota pareceu surpresa e deu um sorriso.
- Eu vou lá, não tem perigo nenhum.- Eu disse, Killian hesitou mas concordou comigo; eu saí de trás da parede. A garota se assustou mas levantei as mãos.
- Calma, está tudo bem, somos humanos.- Eu disse, ela nos encarou.
- São humanos? Ela é filha de vocês?
- Não, é minha sobrinha, ele é um...aliado.- Eu disse, Killian assentiu.
- Ela disse a verdade.- Ele confirmou.
- Cuidam dessa menininha?- Ela perguntou.
- Eu cuido dela mesmo ela sendo maníaca, não se preocupe, ela não é perigosa.
Ela olhava para Julie um pouco receosa.
- Precisam se esconder, se meu tio souber disso vai matar todos vocês.- Ela disse.
- Por que?- Perguntei.
- Porque ele não tolera humanos e maníacos juntos, só façam o que eu digo por favor, se quiserem ficar bem.
- E como vamos saber se está falando a verdade?- Killian duvidou.
- Não banca o esperto grandão, não tenho motivos para mentir, apenas salvem a garota e a si mesmos.- Ela disse e então saiu andando.
- Qual o seu nome?- Quis saber, ela se virou e deu um sorrisinho.
- Mallory Brentwood.
- Obrigada Mallory.- Eu sorri, ela acenou.
- De nada e adeus moça, se cuida.- Ela começou a correr como se estivesse com pressa.
- Vamos passar a noite aqui e amanhã procuramos algum lugar.- Killian disse.
- Você não dá as ordens por aqui.
- Tem alguma ideia melhor?- Ele perguntou.
- Vocês só sabem brigar? Deveriam parar com isso, nem alguém da minha idade é assim.- Julie disse e saiu andando, ela me atingiu.
- Vou calar a boca, mas é por causa dela.- Sussurrei, ele cruzou os braços e eu sai de perto.
Só conseguia pensar em um adjetivo para descrevê-lo embora não seja exatamente um adjetivo: Lixo.
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Morbo: O começo_ Livro 4
Fiksi IlmiahEu acredito em destino. Acredito em muitas coisas, para ser sincera; mas não há nada mais relevante do que: "Tudo tem um começo, um meio e um fim". Por três vezes a mesma epidemia mundial da mesma doença castigou a humanidade, a contaminação era ráp...