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Este capítulo é dedicado à eterna luta entre o Amor e a Imaturidade, que se dá nos campos de batalha que são as mentes e os corações dos habitantes deste planeta primitivo...

...


Os dias que se seguiram ao assalto foram de um clima terrível em casa.

A minha mãe teve uma forte crise de dor de cabeça e depressão, com recorrentes choros e lembranças do incidente. Vez por outra também lembrava que o meu celular estava desligado e eu não aparecia, e por isso elas tiveram que ir ao tal do supermercado à noite, se expondo ao perigo.

Se tem uma característica da minha mãe que eu acho péssima é essa mania que ela tem de imputar a culpa em outra pessoa, não de forma ríspida ou grosseira, mas de forma velada, quase despercebida, de modo que a pessoa fique de fato se sentindo em dívida com ela. Outra coisa é a sua tendência de vitimização sobre qualquer coisa que lhe aconteça. Ora, todos nós de alguma forma estamos expostos ao perigo, e não nos tornamos mártires simplesmente porque entramos na estatística dos assaltos ou de qualquer outra coisa; a experiência é ruim, necessita-se de cuidados, mas temos que olhar pra a frente sempre e buscar o lado bom de tudo. Dona Stela não. A sua dor é sempre maior, para ela foi sempre pior do que para as outras pessoas, e por aí vai. Nesse ponto a tia Malu é igual. Lembro das discussões homéricas que elas tinham simplesmente porque uma achava que a doença da outra era melhor, menos doída, ou que gastava-se menos remédio...

Apesar de verificar que a minha mãe estava péssima, me preocupei mesmo com a Drica. Na segunda e na terça a levei na faculdade, pois ela ainda se mostrava com medo de tudo, principalmente de a ameaça do meliante se concretizar. Depois ela foi relaxando, e tentou seguir sua rotina normal.

Na quinta-feira pela manhã, no entanto, eu estava me arrumando para ir ao escritório e ela me ligou, chorando. Ela havia saído mais cedo para a faculdade. Disse que tinha reparado que havia um carro cinza a seguindo, esperando por ela desde cedo. Corri até o ponto de ônibus onde ela estava, aterrorizada.

- O carro sumiu logo depois que eu te liguei. Mas ele estava ali, ó – apontou para uma esquina – era uma Hilux prata.

- É, ele não está mais ali. Não foi impressão sua, não, Drica? De repente você ainda tá...

- Não, não foi. Ele estava ali.

Olhei em volta. Nem sinal de nada, o movimento estava até reduzido.

- Bom, de qualquer forma, vamos pra casa. Você não está em condições de ir a lugar algum.

- Eu tô com medo... – começou a soluçar e eu cheguei mais perto, para abraçá-la - ...muito medo.

- Relaxa... isso vai passar. E outra: se tem uma Hilux te seguindo, amiga, e já que tá te seguindo mesmo, ponga nela. É melhor do que andar de busu!

- Rsss, vai, idiota!



Quando retornamos para casa, a minha mãe estava nos aguardando com um jornal na mão, ansiosa. O mesmo trazia a notícia de que um bandido havia morrido numa troca de tiros com a polícia no dia anterior, no bairro vizinho ao nosso.

- Olha aqui, Drica – minha mãe estendeu a página pra ela – vê se não foi esse! Vê!

- Ai, meu Deus! – a Drica puxou a foto, mas a minha mãe escondia uma parte da página – acho que é! É esse, sim! Deixa eu ver!

- Não, só precisa ver esta! Na outra foto o cara tá baleado no rosto, não é bom você ver isso!

- Ah... mas é esse mesmo, mãe.

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