31 de dezembro de 2007.
Faltavam apenas quatro horas para o ano acabar e eu ainda não tinha tomado banho, feito a barba nem passado a roupa branca para usar na hora da virada.
Não fosse um ou outro parente que viesse me chamar, por mim eu ficava ali, deitado na grama, à beira da piscina, olhando preguiçosamente o céu do último dia do ano.
Estávamos todos numa casa de praia no litoral norte que havíamos alugado. Quase todo ano era a mesma coisa, a gente se juntava, arranjava um lugar, partilhávamos os custos e os problemas. Então, lá estávamos o pessoal da minha casa (a Mônica nunca ficava conosco, sempre junto com a família do marido), a Mirelle com o Maurício, Dani com o namorado, minha tia Malu, Clara e os dois filhos, meu tio também aparecia... Neste ano em especial a Rose também colou com a mãe e o psicopata do namorado – ela ainda não tinha conseguido terminar, receosa de virar um caso do Linha Direta.
Tínhamos chegado lá desde o dia 28, uma sexta. A ideia era espairecer um pouco, pois o Natal tinha sido meio down; a minha mãe de cama, a Drica ainda perturbada, a minha tia brigando com o meu tio, enfim. Eu tava querendo mesmo era que aquilo acabasse logo e a gente voltasse à rotina, às vezes nada melhor que isso.
Conferi o celular pra ver se tinha mais alguma mensagem de Feliz Ano Novo. Alguns colegas de faculdade, parentes distantes, etc. Não tinha nenhuma... por exemplo... do Murilo.
Nesses onze dias que se passaram desde a Noite Fatídica, a gente não teve qualquer contato. Eu, por resolução; ele, por ter coisa melhor pra fazer, decerto. Nos primeiros dias até nutri secretamente uma esperança de que ele se desse conta que eu estava estranho, algo distante, e viesse, aflito, perguntar o que eu tinha. Ha. Ha. Ha. O que consegui foi saber através do Edu que as vistorias com a estagiária vira-lata estavam mais frequentes do que nunca, e que ele estava muito bem, obrigado. Então, continuei a me afastar mesmo pra ver se me curava.
- Vem, gato, tira essa sunga, se arruma!
A Mirelle tinha se aproximado. De pé, ela me observava largado na grama com uma latinha na mão.
- Tô indo, Mi, só mais um pouquinho. Vou só observar as estrelas.
Ela olhou pro céu, desinteressada.
- Hum. Tá. São as mesmas de sempre. Elas não vão sair daí. Bora.
- Elas nem são as de hoje, né? Dizem que a gente olha o céu de quatro anos atrás, por causa da velocidade da luz, alguma coisa assim. Então, aquela estrela ali já pode até estar morta, e a gente aqui, olhando, sem saber, a luz que ela emitiu lá atrás.
- Tu ainda tá cheirado, é? A minha onda já passou há muito tempo.
O Maurício tinha levado um negócio que era tipo o genérico do lança perfume, um spray "anti-respingo" usado pelos serralheiros na soldagem de portões, que, segundo ele, dava onda. Nessa tarde a gente tava sem fazer nada e cheiramos o tal do produto, morrendo de medo de sair daquela experiência com os pulmões colados. Eu viajei legal, saí do corpo, a Mirelle deu crise de riso e o Maurício morgou. Clara ficou com cara de chapada, e a gente jogou o corpo dela na piscina, pra disfarçar, porque se nossas mães sequer desconfiassem, era caso de morte.
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Sobre o Amor
RomanceA história real que começou a ser contada no Orkut, vem para ser concluída aqui no Wattpad. Há alguns anos, cheguei numa cidade desconhecida para começar a minha carreira de engenheiro. O que eu encontraria ali, nunca poderia prever. Um hétero convi...