Noite.
As quatro portas do meu carro abertas no meio da rua, a Adriana imóvel no banco do fundo. Cerca de dez pessoas em volta, acudindo, outras comentando baixinho. Algumas passavam lentamente, outras paravam querendo saber.
Eu desabei no passeio. Com as mãos no ouvido, chorava descontroladamente, querendo que a minha mãe parasse de gritar. Ela corria de um lado para o outro do carro, se desvencilhando dos vizinhos que tentavam lhe acalmar.
- Me soltem! Me soltem! Parem de me dizer que a minha filha está morta! Gustavo! Gustavo! Pelo amor de Deus, meu filho, o que você tá fazendo aí? Gustavo!
- Minha senhora, é melhor a senhora se afastar, não é bom...
- Licença! Saai daqui! Me deixe! A minha filha precisa ir no hospital, ela precisa tomar remédio, alguma coisa, gente? Vocês não estão vendo? Gente! Seu Mário! Alguém ajuda aqui! Gustavo, vem aqui!
- Mãe, para! Paara!
Ela alisava os cabelos da Drica, olhava atentamente, tentava colocá-la em seu colo, em vão. Gritou a minha avó:
- Minha mãe! Pelo amor de Deus, fala com o Gustavo aqui para ele me obedecer! A gente tá perdendo tempo!
Me levantei e lentamente me acomodei pelo outro lado do carro no banco de trás. Apertei as pernas da minha irmã, tentei esticá-las, mas estavam muito rígidas. Minha mãe pegou na minha mão e sussurrou, como se ninguém pudesse ouvir:
- Meu filho, eu te peço pelo amor de Deus. Vamos levar a Drica no hospital. Eu sei que ela não tá morta. Pelo amor de Deus. Pelo amor que você tem a mim.
O nosso vizinho de porta estava me cutucando atrás de mim.
- Gustavo, vem aqui. Se levante, meu querido. Dona Estela, dê uma licença do carro, por favor.
- Por que?
- A minha filha, ela é enfermeira. Quer dizer, ela faz enfermagem. Deixem ela olhar a menina. Por favor.
Saí do carro e percebi que estava tremendo demais. Dei a volta e abracei a minha mãe. A moça estava esperando a gente sair, e conversava pelo celular com alguém.
- Isso. Eu sou estudante de enfermagem. Só um momento. Segure aqui o celular, por favor, Gustavo – ela começou a tocar a Drica em vários pontos, e me pediu para encostar o aparelho em seu ouvido para ela continuar falando – olha, ela realmente está sem respiração e sem pulso. Isso. Três minutos. Como isso deve ser impregnação, pode ser que... exato... né?
- O que foi, Gustavo?
- Não sei, mãe.
- Tá ok. Não tem como mesmo, né? Eu entendo. Ok. Tá bom. Tchau, boa noite.
- Camila, minha filha, você estava falando com quem?
- Dona Estela, nós estávamos falando com a SAMU. Eles disseram que tentaram retornar a ligação, mas o telefone não respondia...
- É... ele... caiu.
- Então. Expliquei que ela pode estar tendo uma impregnação, que causa rigidez muscular, não tô vendo sinais vitais – minha mãe gritou – mas ASSIM, DONA ESTELA, isso não quer dizer muita coisa nesse caso, porque os músculos estão rígidos mesmo. Pode ser que internamente, ela ainda esteja lutando. Porque...
Eu não deixei ela terminar de falar. Corri até a varanda, peguei a minha chave que estava no chão e dei a volta como um louco no carro.
- Entra, mãe. Corre!
- Gustavo, deixa eu terminar de...
- Camila, obrigado. Mas eu vou correr. Cada minuto que a gente perde...
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Sobre o Amor
RomanceA história real que começou a ser contada no Orkut, vem para ser concluída aqui no Wattpad. Há alguns anos, cheguei numa cidade desconhecida para começar a minha carreira de engenheiro. O que eu encontraria ali, nunca poderia prever. Um hétero convi...