Enquanto os dois homens proferiam obscenidades pelas suas bocas ao passo que bebiam vinho, Elliot e Aurora foram capazes de cumprimentar quase toda a gente que estava presente. Depois de falarem com Henry e a sua esposa, que foram os primeiros a quem se dirigiram já que eram os únicos conhecidos de Aurora, dirigiram-se ao dono da casa e á sua mulher para agradecerem o convite. A Senhora Kenward pouco falava, e sinceramente pouco lhe importava se Aurora era ou não de famílias ricas, desde que se soubesse comportar. E uma vez que todas as suas filhas estavam casadas, esta não era de modo nenhum uma ameaça, e por isso era lhe totalmente indiferente. Já o senhor Kenward não poupou elogios á jovem. Falava muito, e muito alto, muito teatralmente. Ao início Aurora ficou um pouco apreensiva, mas depois achou uma certa graça ao seu jeito bem-humorado.
- Compreendo que se sinta um pouco deslocada menina, não me leve a mal por dizê-lo, mas é mais do que natural. Mas nada precisa de temer, divirta-se! Está certamente acompanhada de um dos melhores homens de toda a Inglaterra! – Antes que pudesse dizer alguma coisa, ou até mesmo Elliot pudesse responder aquele elogio tão descabido, Kenward abandonou-os para cumprimentar os Blair que finalmente haviam chegado.
- Bem, é como lhe disse. É uma excelente pessoa, tem só um comportamento um pouco excêntrico.
- Sem dúvida Elliot. – Apesar de ainda estar tensa e nervosa, aquele á vontade por parte de Kenward deixou-a um pouco mais liberta.
Cumprimentaram de seguida os Kidd, e os seus dois filhos, ainda pequenos. Eram uma família de burgueses, não tão rica quando os Kenward mas de um comportamento integro. Eram muito reservados, mas foram perfeitamente educados para com Aurora. De seguida esta foi apresentada ao casal Urwin. O Senhor Urwin era alto, muitíssimo magro, ao seu lado, Elliot parecia sem dúvida uma pessoa dotada de força e capacidade física. Enquanto que a mulher era bem gordinha e mais baixa que Aurora um bom pedaço. Eram um casal extremamente cómico, já nos seus quarentas. Lembravam um pouco o senhor Kenward, mas apenas aparentemente. Os Urwin faziam piadas sobre qualquer coisa, o que normalmente aborrecia os outros, não por não saberem rir de si próprios, mas por tentarem ter piada incessantemente sem terem sucesso. Apesar de serem ótimos comerciantes e pessoas de bem, não era muito agradável passar um serão inteiro na companhia de ambos, os próprios filhos, por vezes, tinham um pouco de reserva e vergonha do comportamento dos pais, e em algumas ocasiões, como desta vez, declinavam convites. Aurora fora apresentada a mais duas ou três famílias, era olhada de cima a baixo de quase todas as vezes. No entanto a maioria das pessoas fazia-o apenas por curiosidade e não por intenções maliciosas. O que não fazia com que a pobre menina deixasse de se sentir observada.
No fim de todas as cordialidades tratadas Aurora e Elliot puderam finalmente se juntar a Henry, que já se encontrava sozinho. A sua mulher e ele tinham meramente uma relação cordial, sabiam mesmo de traições da parte um do outro. Casaram apenas por interesse e influências dos pais. Por isso não estimavam propriamente a companhia um do outro. Mal Dilia, a sua mulher, se pudesse ver livre dele, assim o fazia. Tinha ido coscuvilhar e mexericar e partilhar fofocas com as duas irmãs Kenward, as duas mais velhas. Aurora fora apresentada a elas, mas não se pode dizer que houve grande empatia de parte a parte, e Aurora podia perfeitamente ver o porquê agora que analisava o comportamento de ambas.
Quanto a Elliot, estava de facto desiludido por não ver Isabel e o seu marido naquele serão. Tivera dito a Aurora que iria gostar muitíssimo de a conhecer. A filha mais nova de Kenward, e a preferida por ele, era casada com um oficial honrado, colega, e grande amigo e confidente de Robert. Era portanto dai, que Elliot o conhecia. E na altura, quando este desposou Isabel, ficou realmente feliz por ver juntas duas pessoas que tinha em tão grande estima. Das suas relações com os Kenward apenas prezava a companhia do pai e da sua filha mais nova. Isabel era maravilhosa. Para além de bonita era dotada de uns modos irrepreensíveis. Por vezes era um pouco maltratada e esquecida pelas irmãs e pela mãe, demasiado preocupadas em discutir a vida dos outros e em dar mau uso ao dinheiro do pai. Isabel era muito mais interessada em literatura e em arte, e acompanhava o pai em vários serões de negócios, mesmo que recebesse vários olhares reprovadores por parte dos restantes homens. Foi numa dessas reuniões que Elliot, ainda com seus dezassete anos, conheceu Isabel, ainda com quinze. Tornaram-se amigos, e a certa altura talvez Elliot houvera sentido algum tipo de afeição maior que essa. Á parte de Aurora, Isabel fora provavelmente a única mulher que realmente despertara em nele um tipo de interesse diferente. Mas não logrou a continuar tais inclinações, ou se quer a começá-las. Tinha perfeita noção que apesar de Isabel ser bastante emancipada para a sua idade e de ideias revolucionários, pretendia casar, construir família, e educar os seus filhos com os ideias que o seu pai lhe havia educado, mas que falhara a educar ás suas irmãs, e falhara redondamente, completamente, em educar o seu irmão. Por isso, dois anos mais tarde, quando esta desposou o oficial William Vinge, por quem também tinha uma grande admiração, sentiu-se genuinamente feliz. Tinha a certeza que Isabel lograria em fazer aquilo com que se havia comprometido.
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Um campo de Lírios Brancos
Historical FictionO tempo é a era vitoriana, mais precisamente 1857, em Inglaterra. Elliot é um jovem herdeiro de uma família fidalga, recomendado pelos seus bons modos, pelas suas virtudes, pelas suas crenças humanitárias, e sua indulgência. No entanto, padece de...