( Esta é a minha primeira história, por favor deixem nos comentários qualquer sugestão que tenham, muito obrigada e uma boa leitura! :)
p.s - toda a história se encontra escrita em português de Portugal )
Inglaterra, 1857
Já há muito que Elliot se permitira descansar sobre as circunstâncias da sua morte. Ainda que nos recantos mais obsoletos dos seus pensamentos essas ideias o atormentassem. A ideia do vazio e da não existência permanecia como uma nuvem bem por cima da sua cabeça. Sentia a urgência dos vivos mais do que todos os outros, pois consciencializava a morte mais do que qualquer outra criatura. Muitas vezes era inundado por uma inveja embriagada para com os pássaros, ou as raposas, os coelhos e os cavalos, ou qualquer outro animal. Porque eles não consciencializavam que o seu tempo teria uma finitude. Mas por outro lado, recostava-se no seu cadeirão de veludo em tons marron e apreciava o prazer de existir mais do que qualquer outro.
A verdade era que Elliot estava de facto a morrer. Pelo menos o seu corpo morria mais rápido do que os dos serventes que iam passando e limpando a poeira de todas as quinquilharias que o seu mestre acumulava em casa da mesma forma que se acumulam memórias. Devido a isso, a urgência de ação, de alcançar o sucesso, de ver o seu nome correr de boca em boca, tornava-se cada vez mais necessário. A sua vizinhança com a morte não deixava tempo para contemplações demoradas sobre os propósitos ou não propósitos da vida, mas impingia-o com uma vontade imensa de agarrar a vida como se a pudesse manter para sempre dentro de si.
Não sei se pelo facto do seu corpo se encontrar debilitado, ou pelo facto de gostar de se vestir bem, Elliot muitas vezes apresentava um semblante que lembrava não um homem, mas uma mulher. Não sempre, certamente não a maioria das vezes, mas por vezes, quando tirava a camisa branca de linho devagar, fazendo-a cair-lhe pelos ombros, e os cachos de cabelo negro pousavam na pele pálida, o seu corpo era possuído por uma aura plácida e simples, que tornava a sua sensibilidade e fragilidade tão óbvia e ao mesmo tempo tão pura, como a das mulheres virgens que tantas vezes cruzaram aquelas ruas em cochichos umas com as outras, nunca consegui perceber do que falavam. Mas sempre achei que a Elliot lhe cairia bem um dos corpetes de uma dessas senhoras.
Numa casa não muito mais longe, não muito mais pequena, mas bem menos luxuosa, vivia Robert, seu primo. Se Elliot era escravo da sua condição num corpo frágil e decadente, este segundo seria o oposto. Tinha regressado da guerra fazia pouco mais de meio ano, o seu corpo ainda apresentava cicatrizes de batalha, que aos poucos iam curando, porém, nenhum outro homem se parecia mais forte que aquele, as chagas que lhe ficaram na memória demorariam bem mais a ir-se embora e talvez o acompanhassem até que deixasse de existir. Robert era um verdadeiro mandador do povo. Sabia liderar um grande número de empregados e assalariados, ao passo que podia desempenhar exactamente as mesmas funções que estes. Tinha trabalhado na mineração, no cultivo dos campos, ensino de cavalos.... Acreditava que todos os homens são iguais, e que o seu trabalho ao lado do povo não era de todo uma ostentação da sua inferioridade, mas sim uma escolha que o tornava um homem bom, e não um nobre frívolo e sensacionalista que apenas ajudava o miserável quando os olhos se punham sobre ele.
Elliot era sem dúvida um admirador de Robert. No entanto, fazia-o sempre fora do quadro. Era como se Robert pertencesse a uma pintura com muitas outras figuras, mas Elliot apenas podia ficar a observar enquanto as acções decorriam sem lhes poder tocar. Seria um ato de suicídio enveredar pelo mesmo caminho que o seu primo, já estaria morto certamente. Mas invejava a luz e a vida que o corpo deste emanava trazendo tantos outros á sua volta. Não é que Elliot não fosse admirado pelo povo. Pois tinha sido o responsável pela construção de fábricas, minas, e patrocinava efusivamente artistas, alfabetizou muitas famílias e doava grande parte daquilo que já não lhe era necessário. Mas nunca pode tocar o que eles tocavam, pisar a terra que eles pisavam, ainda que o fizesse todos os dias.
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Um campo de Lírios Brancos
Ficción históricaO tempo é a era vitoriana, mais precisamente 1857, em Inglaterra. Elliot é um jovem herdeiro de uma família fidalga, recomendado pelos seus bons modos, pelas suas virtudes, pelas suas crenças humanitárias, e sua indulgência. No entanto, padece de...